30/09/2013 - 14:46

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A OAB/RJ e a luta pela ciência - Luiz Pinguelli Rosa e Fernando Peregrino

No inicio desse ano, um fato mobilizou a COPPE/UFRJ, o maior centro de pós-graduação e pesquisa em engenharia da America Latina, com seus 50 anos de serviços prestados ao Pais. Os órgãos de controle, instados pelo Ministério da Educação, promoveram a edição de um documento chamado de Coletânea de Entendimentos, apelidada de cartilha. Em 122 tópicos, seus autores interpretaram leis e normas em direção contrária à flexibilidade da gestão da pesquisa das universidades federais. 
 
A fragilidade da cartilha está presente desde seu início. Por exemplo, embora ela ressuscitasse uma lei de 1964 para obrigar que os recursos dos projetos de pesquisa fossem repassados ao Caixa Único da União, obrigação essa inusitada, em nenhum momento se refere ao artigo 207 da Constituição Federal de 1988, que dá autonomia às universidades, assim como ao artigo 218 que confere prioridade e meios especiais às atividades de ciência e tecnologia.
 
A cartilha desmontava também o modelo de funcionamento da Coppe, pois engessaria seu braço peracional mais importante para projetos com o setor produtivo, a Fundação Coppetec. 
 
Uma iniqüidade está presente em sua página 51. Seus autores excluem do âmbito de suas orientações restritivas as fundações de apoio da "USP e da Unicamp", embora essas recebam grande volume de recursos federais. Ou seja, a burocracia era voltada às universidades federais. 
 
Do ponto da administração pública brasileira, a cartilha rebelava-se também contra o papel das fundações de apoio, entidades descentralizadas de direito privado, que prestam serviços públicos, responsáveis pela gestão de projetos de ensino, pesquisa e extensão e que foram criadas por orientação dos próprios órgãos de controle na década de 90, através de uma lei específica, a Lei 8958/94. 
 
Do ponto de vista da Ciência e Tecnologia, seus autores também demonstraram limitação quanto ao entendimento do que seja a acirrada competição internacional, que o Brasil trava, por novos conhecimentos tecnológicos, burocratizando procedimentos de gestão e de tratamento aos recursos das pesquisas aportados pelas empresas.
 
Ao burocratizarem também a gestão dos cursos de extensão das universidades federais, os autores terminam por fomentar ainda mais a privatização do ensino superior. A ameaça de encerrar esses cursos de extensão de unidades de excelência como a Coppead e a Escola Politécnica, apenas para citar as da UFRJ, poderia levar seus alunos a buscarem os complexos privados de educação, alguns deles adquiridos por grupos econômicos estrangeiros. O enfraquecimento das universidades públicas, responsáveis que são por mais de 80% das pesquisas no Brasil e pelos melhores cursos de graduação e pós-graduação, parecia cumprir o mesmo ritual das privatizações da década de 90, caso da Vale do Rio Doce, contra a qual a Coppe também lutou. 
 
Junto com a COPPE/UFRJ, participou dessa luta a SBPC, além da ANDIFES, e da Confies. Mas foi a OAB/RJ, representada pelo seu presidente, Felipe Santa Cruz, mesmo não sendo uma entidade do setor de ciência e tecnologia, que percebeu sua importância estratégia para a nação brasileira. Essa entidade que reúne advogados, promoveu em março desse ano, em sua sede, um ato público com mais de 400 pessoas para denunciar a situação da pesquisa no Brasil. Os órgãos de controle então, através da OAB/RJ, aconselhavam mudanças na legislação. 
 
Foi assim que, diante desses fatos, através da Medida Provisória 614, o governo realizou modificações importantes no quadro legal, embora tenham conservado, entre outros, tratamento restritivo às pesquisas em parceria com empresas privadas. 
 
A diretoria da Coppe, nesse período, ficou praticamente dez dias em Brasília negociando com o governo e procurando o apoio de deputados federais e senadores para vencer esses últimos obstáculos à nova legislação. Com ajuda de deputados, como os deputados Anthony Garotinho, Sibá Machado, Jorge Bittar, Jandira Fegalli, Chico Alencar, Alfredo Sirkis, Alexandre Molon, e dos senadores Luiz Henrique e José Pimentel, além da Comissão de Educação da Alerj, conseguimos vencer obstáculos remanescentes na MP 614 e promover mudanças substanciais no relatório, contando com a compreensão do deputado Roberto Santiago (SP). No plenário da Câmara Federal, no dia 20 de agosto, através de destaques, conseguimos livrar das amarras os projetos de projetos com empresas privadas, ou sociedade de economia mista, e 
incluímos os cursos de extensão no rol das atividades da fundação de apoio. 
 
Recentemente, no dia 24 de setembro, após aprovação do Senado Federal, a Presidenta da República sancionou essa nova legislação. Claro que resta ainda muito a aperfeiçoar, mas ficou a certeza de que lutar vale à pena, e que cooperação é a melhor forma de governar. Foram beneficiadas todas as universidades federais e suas fundações de apoio, cujo modelo de ensino e pesquisa em grande parte tem sido a Coppe/UFRJ. Nesse processo, a OAB foi reafirmada como entidade defensora das grandes objetivos nacionais, como a pesquisa tecnológica própria, tendo em vista alcançarmos o progresso e a soberania de nosso País.
 
Luiz Pinguelli Rosa é diretor da Coppe.
 
Fernando Peregrino, Coppetec e CBPF.
 
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