28/05/2008 - 00:00

COMPARTILHE

Repetibilidade de alimentos - Anderson Evangelista

Repetibilidade de alimentos

 

 

Anderson Evangelista*

 

21/05/2008 - Várias monografias tiveram como tema o instituto alimentos, porém, poucas ousaram defender a tese da possibilidade de repetição do indébito da pensão alimentícia.

 

O presente artigo tem como objetivo apresentar algumas possibilidades de repetição do indébito de pensão alimentícia no Brasil.

 

Prima facie, fazemos uma breve explanação acerca da parte geral do Novo Código Civil, posto que para o entendimento do princípio da boa-fé objetiva é preciso compreender os paradigmas elaborados pelo renomado jurista Miguel Reale.

 

Durante a elaboração do NCC (Novo Código Civil) alguns juristas ficaram encarregados de redigir algumas partes do diploma legal. A parte geral recaiu sobre os ombros do professor José Carlos Moreira Alves, ex- Ministro da Suprema Corte Brasileira.

 

Na parte especial a divisão foi feita de maneira que o professor Agostinho de Arruma Alvim ficou incumbido de debruçar seus conhecimentos no Direito das Obrigações; o professor Silvio Marcondes no Direito Empresarial; o professor Erbert Vianna Chamoum no Direito das Coisas; o professor Clóvis do Couto e Silva no Direito de Família; o professor Torquato da Silva Castro Júnior no Direito Sucessório.

 

O professor Miguel Reale deu contribuição ímpar ao NCC quando foi convidado para revisar o trabalho dos renomados juristas. O que fez, então, o professor Reale, diante de tamanho gabarito dos convidados para relatar as diversas partes do novo código?

 

Brilhantemente o professor Miguel Reale optou por unificar o novo codex brasileiro criando paradigmas, os quais fizeram com que toda a lei 10.406/2002 estivesse de acordo, a saber: socialidade, efetividade e eticidade.

 

Em apertada síntese, podemos explicar os paradigmas da seguinte maneira:

 

a) Socialidade: o código tem preocupações com as diversas questões sociais até então omissas no diploma de 1916;

 

b) Efetividade: a Lei 10.406 deve ser entendida com ajuda de conhecimentos intra, inter e extrajurídicos;

 

c) Eticidade: para uma boa aplicabilidade do NCC devemos respeitar a boa-fé objetiva, isto é, uma exortação ética que é exigida em todas as relações amparadas pela lei substantiva civil.

 

Revela-nos interessante a aplicação do princípio da boa-fé objetiva no campo Direito de Família, posto que mesmo se tratando de um Direito especialíssimo, consiste num paradigma com utilização em todos os pontos do Código Civil Brasileiro.

 

No Brasil os alimentos sempre foram objetos de acirradas discussões, as quais culminaram na criação de um ramo, quase que autônomo do Direito Civil, denominado Direito de Família, haja vista a quantidade de demandas cuidando da matéria.

 

A legislação brasileira ainda não tipificou a questão da (ir) repetibilidade dos alimentos, porém, há um princípio consagrado pela jurisprudência e pela doutrina denominado de irrepetibilidade da pensão alimentícia, uma vez que o alimentado tem o direito de manter-se vivo.

 

Registre-se a existência de belos textos defendendo que os alimentos servem para garantir a vida e se destinam à aquisição de bens de consumo para assegurar a sobrevivência, motivos pelos quais não devem ser devolvidos, bem como não houve necessidade de positivação pelo legislador derivado. 

 

O sempre brilhante professor Luiz Paulo Vieira de Carvalho  diz que, em sentido jurídico, alimento é aquilo que satisfaz as necessidades básicas ou vitais do ser humano, tais como: alimentação, vestuário, habitação, medicamentos, assistência médica e odontológica.

 

Em se tratando de alimentos devemos remeter a atenção do leitor ao binômio necessidade/possibilidade, o qual, segundo a moderna doutrina, deve ser encarado sob o enfoque triplo, ou seja, deve-se adicionar o princípio da razoabilidade.

Cumpre registrar a posição majoritária sobre a impossibilidade de repetição de pensões alimentícias. 

 

Todavia, nossa posição é diversa à corrente maior, posto que há hipóteses em que o alimentante poderá ser restituído pelo alimentado. Pensamos que no caso de má-fé do alimentado ou de seu representando legal é possível repetir o indébito da pensão alimentícia com amparo nos artigos 186 e 927, caput, ambos do NCC.

 

A fundamentação é simples, já que o professor Miguel Reale trouxe ao Código Civil Brasileiro o paradigma da eticidade, que por sua vez, tem como vertente a boa-fé objetiva.

 

Ousamos criar situações casuísticas, o que é arriscado em se tratando de Direito de Família, visto que a regra continua a ser a irrepetibilidade de alimentos. Na situação em que, por exemplo, o alimentado (5 dias de vida), por seu representante (ascendente - genitora), move ação de alimentos em face de pessoa em que o representante legal sabe não ser o ascendente genético há evidente má-fé, o que gera danos patrimoniais ao eventual alimentante com o deferimento dos alimentos provisórios.

 

O dano é eminente, visto que a concessão dos provisórios independe de pedido do alimentado na peça vestibular, haja vista a inteligência do art. 4°, caput, da Lei 5.478/68.

 

Outra situação é a da litigante que apresenta recursos infundados, pois, mesmo após o término da obrigação alimentar (por ausência do binômio possibilidade/necessidade) insiste em manter o recebimento da referida pensão alimentícia. Frise-se que as hipóteses em epígrafe geram dano patrimonial ao alimentante, razão pela qual deve haver a repetição do indébito, com lastro na má-fé .

 

Outra possibilidade de repetição do indébito alimentar ocorre quando há extinção da obrigação alimentar e o alimentado continua a receber a verba do alimentante.

Imaginemos a possibilidade do pai ser condenado ao pagamento de pensão alimentícia a um filho que está cursando a graduação de Direito e é absolutamente capaz.

 

Registre-se que o alimentado foi agraciado com o recebimento de alguns milhões de reais num sorteio de loteria. Neste caso o alimentado não fará mais jus ao recebimento de uma pensão alimentícia por inexistir a junção do binômio necessidade/possibilidade.

 

Assim, recebendo os valores do alimentante estará atuando em verdadeira má-fé, o que é repudiado pelo NCC.Vale consignar que mesmo, repita-se, sendo a regra o princípio da irrepetibilidade  dos alimentos, o Tribunal de Justiça Fluminense fundamenta seus julgados no referido alicerce.

 

Revela-nos importante registrar que o STJ decidiu ser a citação o momento inicial para cálculo da obrigação alimentar . No Tribunal gaúcho o princípio da irrepetibilidade dos alimentos também está presente na fundamentação de julgados.

 

O STJ já se pronunciou pela irrepetibilidade do indébito alimentar quando houver redução da referida pensão, posto que há boa-fé alimentado e pelo respeito à segurança jurídica. Questão interessante está no julgado do STJ que considera o alimento como direito fundamental máximo, logo, irrepetível.

 

Concordamos parcialmente com a posição explicitada pelo Tribunal Superior, posto que o alimento deve ser visto sob o prisma de direito fundamental, já que de suma importância para a vida humana.

 

Todavia, no tocante à repetibilidade temos posição flexível, já que aceitamos o indébito alimentar em algumas situações.

 

Ainda na jurisprudência  do Superior Tribunal de Justiça, podemos colher a impossibilidade do indébito alimentar quando se tratar de alimentos provisionais ou provisórios.

 

Pensamos que, diante do caso, esta regra de ser flexionada, uma vez que o NCC desprestigia a má-fé e mesmo inexistindo positivação no Direito pátrio da irrepetibilidade dos alimentos a consagração pela jurisprudência e doutrina é indiscutível.

 

Assim, defendemos a posição de que, mesmo o princípio da irrepetibilidade dos alimentos sendo a regra, conseguimos apresentar durante este trabalho algumas hipóteses em que a repetibilidade prevalece, as quais sempre têm vínculo com a má-fé do alimentado ou de seu representante legal, pela incidência do art. 186 e 927, caput, ambos da lei subjetiva civil.

 

*Anderson Evangelista é professor de Direito de Família.

 

 

1.Dias, Maria Berenice. Dois pesos e duas medidas para preservar a ética: irrepetibilidade e retroatividade do encargo alimentar. Revista Juristas, João Pessoa, a. III, n. 92, 19/09/2006. Disponível em: http://www.juristas.com.br/mod_revistas.asp?ic=2627. Acesso em: 3/5/2008

2.VIEIRA DE CARVALHO, Luiz Paulo, Direito Civil: Questões Fundamentais e Controvérsias na Parte Geral, no Direito de Família e no Direito das Sucessões, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, 121

3.OLIVEIRA, Adriane Stoll de. Provisórios ou provisionais: eis a questão. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 501, 20 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5938>. Acesso em: 03 Mai 2008

4.OTERO, Marcelo Truzzi. Alimentos no novo código civil – Disponível em http://www.gontijofamilia.adv.br/2008/artigos_pdf/Marcelo_Truzzi_Otero/Alimentos.pdf. Acesso em 03 Mai 2008

5.Apelação Cível n° 2007.001.20488 da 10ª Câmara Cível do TJ/RJ

6.Apelação Cível n° 2007.001.55238 da 6ª Câmara Cível do TJ/RJ

7.Apelação Cível nº 70021333117 da 7ªCâmara Cível do TJ/RS

8.Agravo de Instrumento nº 70020623344, 7ª Câmara Cível, TJ/RS

9.REsp 595209/MG

10.AgRg na MC 12032/DF

11.REsp 763780/RS

Abrir WhatsApp