Pois é, já fui perguntada por que razão escrevo tão pouco sobre Direito Penal e Processo Penal. Respondi que se o interlocutor, advogado criminalista há tantos anos, portanto conhecedor do sistema, ainda não sabia, não adiantaria explicar...

Narro, agora, episódio diametralmente diverso. Recebi, no escritório, telefonema de respeitado Procurador da Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Não nos conhecíamos pessoalmente; ele colheu o número do escritório no impresso da petição. O motivo era dizer que fora prazerosamente surpreendido ao ver que utilizei, como epígrafe, uma frase colhida de um conto de Machado de Assis: “Mudaria o Natal, ou mudei eu?”, em tudo apropriada ao caso.

Lembro-me ainda que, na defesa de uma senhorinha humilde, acusada de furto em processo livre de vícios, que não deixava dúvida quanto à materialidade e autoria, usei a tradução livre de um texto de Shakespeare, que dizia: “... a justiça dos homens se aproxima da justiça divina, quando a misericórdia tempera a justiça”. Pela mesma razão, a pobre senhorinha veio a ser absolvida em segunda instância.

Dizem que a arte – em todas as suas formas – imita a vida. Quando indicada e bem escolhida, uma frase, um poema, a letra de uma canção, um filme, são capazes conter toda uma tese, ou uma filosofia de vida.  

A literatura, a poesia, o cinema, são inesgotáveis fontes de histórias e estórias sobre a tragédia humana. Desta vez, sugiro o filme Por quem os sinos dobram, dirigido por Sam Wood (1943), a partir de livro homônimo de Ernest Hemingway, e cujo título, por sua vez, foi inspirado em poema de um pastor e poeta inglês chamado John Donne:

"Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra;

Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso, não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.

Já disse alguém que é possível conhecer-se uma sociedade pelo modo como trata suas crianças, seus idosos, deficientes físicos e prisioneiros. Quanto a estes últimos, pode ser que alguém argumente: que sinos dobrarão por suas vítimas? Compreensível esse sentimento, mas haveria menos a chorar se a sociedade tivesse se lembrado deles a tempo, em vez de nos isolarmos em nossa confortável ilha.

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