19/01/2009 - 16:06

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Artigo: A indispensabilidade do advogado e honorários na Justiça do Trabalho - Calheiros Bomfim

Obrigatoriedade de Advogado e Honorários na Justiça do Trabalho


Benedito Calheiros Bomfim*

Quando da instalação da Justiça do Trabalho em 1941, deferiu-se às partes o direito de, pessoalmente, reclamar, defender-se e acompanhar a causa até final. Essa prerrogativa justificava-se por se tratar então de uma justiça administrativa, gratuita, regida por um processo oral, concentrado, e a ela serem submetidos, quase exclusivamente, casos triviais, tais como horas extras, anotação de carteira, salário, férias, indenização por despedida injusta.

 

Ocorre que a Justiça do Trabalho, incorporada ao Judiciário em 1946, sob o influxo do desenvolvimento econômico, social e cultural do país, hipertrofiou-se, formalizou-se, solenizou-se, tornou-se técnica e complexa. Por não possuir Código de Direito material nem processual, passou a aplicar, supletivamente, a legislação administrativa, tributária, comercial, naquilo em que a CLT fosse omissa. Adotou institutos  como a ação rescisória, tutela antecipada, pré-executividade, ação de atentado, consignatória, reconvenção, assédio sexual, dano moral, intervenção de terceiro, litispendência, ação monitória, recurso adesivo, habeas corpus. A CLT sofreu cerca de mil alterações, no caput de seus artigos, parágrafos, incisos, alíneas. Paralelamente formou-se uma legislação complementar extravagante, diversificada, mais extensa do que a própria CLT. Tornou-se difícil aos próprios advogados acompanhar as incessantes mudanças, acrescidas de súmulas, orientações jurisprudenciais, procedentes normativos editados pelo TST. A Justiça do Trabalho, assimilou os procedimentos do processo civil e os vícios da Justiça comum. Compõem hoje o Judiciário trabalhista mais de 1.000 Varas  e por ele tramitam anualmente dois milhões de processos.

 

Mesmo depois da CF/88 , do CPC/73, do Código Civil/02 e Estatuto da Advocacia, continuam a vigir o art. 791 da CLT e a Súmula 219/TST, segundo  os quais são indevidos honorários de sucumbência. Há quem pense e diga, por isso, que a Justiça do Trabalho é uma Justiça  de segunda categoria. A negação da verba honorária tem efeito impactante na Justiça do Trabalho, em cujas pendências uma das partes - o trabalhador - é hipossuficente, e os litígios, por  envolverem verbas de natureza salarial, essenciais à sua sobrevivência e de sua família, enquanto na Justiça comum, embora os litígios tenham por objeto direitos patrimoniais, tais honorários são devidos.

 

Diante da pletora de inovações acima exposta, sustentar que o trabalhador possui capacidade técnica para postular e se defender, beira a falta de bom senso, o absurdo. Nesse contexto, o jus postulandi tornou-se, já de algum tempo, inviável, desfavorável ao trabalhador, ao qual, particularmente, visava a favorecer. O jus postulandi constituiu um instituto adequado, justo, útil e necessário para a época,  mas já cumpriu seu papel histórico, não mais se justificando sua manutenção. Depois que a CF/88 estabeleceu ser "o Advogado indispensável à administração da Justiça", sem excluir dessa regra a Justiça do Trabalho,  não há mais como  admitir possa a parte  postular e defender-se pessoalmente. Se a Carta Magna não excetuou a Justiça do Trabalho da regra geral que prescreve ser o advogado indispensável  à atuação da Justiça, não é mais possível restringir nem, muito menos, criar exceção  a esse princípio. Não se pode ler “o advogado é indispensável à administração da Justiça, exceto na Justiça do Trabalho”, onde está escrito na Constituição, simplesmente: "O advogado é indispensável à administração da Justiça". O que é inadmissível também é, em sã consciência, negar a evidência de contradição entre os artigos 791/CLT, que considera facultativa a assistência de advogado, e o art. 133/CF, que dispõe ser o "Advogado indispensável à administração da Justiça". O preceito da Lei Maior  não excetuou dessa regra geral, abrangente, obrigatória, a Justiça do Trabalho. Sem essa expressa exclusão, não pode a CLT dizer, que nesse ramo especializado do Judiciário a intervenção do advogado é dispensável.

 

Ademais, obrigado a desembolsar dinheiro para honorários de seu advogado, retirado do montante reconhecido por sentença judicial, a reparação obtida pelo trabalhador é parcial, incompleta. Esse desfalque dos direitos do pleiteante contraria os arts. 389 e 404 do Código Civil, o primeiro dos quais estatui que, não sendo cumprida a obrigação, o devedor responde por perdas e danos, juros, atualização e "honorários de advogado". Se, para recompensar o prejuízo sofrido o reclamante teve de contratar profissional, é irrecusável o direito de ser integralmente ressarcido por quem o levou a essa  contratação.

 

Sabendo-se desonerado de honorários de sucumbência, o empregador  pouco escrupuloso sente-se estimulado a sonegar direitos trabalhistas, a litigar,  protelar o processo, com o que congestiona e torna mais lento o Judiciário trabalhista. Com o assim proceder, contraria a garantia constitucional da "duração razoável do processo", o que  também implica dificultar  o acesso à  Justiça. Pois a morosidade traz prejuízo ao Judiciário e  ao trabalhador, induzindo-o a desistir de ingressar na Justiça, quando não a firmar acordo lesivo a seus interesses. Reconhecer honorários sucumbenciais ao trabalhador quando pleiteia e vence na Justiça comum, e não fazê-lo na Justiça do Trabalho, na qual o objeto do pedido é de natureza alimentar, além de gritante incongruência e injustiça, contravém o  princípio constitucional da isonomia. O direito  de  contratar advogado é direito fundamental de acesso à Justiça, como assegurado no art. 5º, XXXV, da CF. A recusa à concessão da verba honorária neutraliza o princípio basilar de toda a legislação do trabalho, a qual, para contrabalançar a superioridade econômica do empregador, outorga superioridade jurídica ao assalariado.  Com o transferir tal ônus a este, retira-se o caráter protecionista que informa o Direito do Trabalho.

 

Diante das significativas e relevantes mudanças retro expostas, próprias do dinamismo do direito do trabalho, que acompanha de perto as transformações da sociedade, urge eliminar a anacrônica figura do jus postulandi, hoje prejudicial ao trabalhador. Entre as iniciativas nesse sentido, inclui-se a da OAB/RJ, que criou uma Comissão de Honorários de Sucumbência na Justiça do Trabalho, presidida pelo Conselheiro Nicola Piraino e integrada pelo Ministro Arnaldo Sussekind, pelo autor do presente estudo e renomados advogados, a qual aprovou anteprojeto  instituindo a indispensabilidade do advogado e honorários na Justiça do Trabalho.

 

*Benedito Calheiros Bomfim é ex-presidente da Associação Carioca de Advogados Trabalhistas e do Instituto dos Advogados Brasileiros e Membro Integrante da Academia Nacional de Direito do Trabalho e da Comissão de Honorários de Sucumbência da OAB/RJ.

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