07/04/2009 - 16:06

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Artigo: Justiça e cidadania - Cesar Asfor Rocha

Justiça e cidadania


Cesar Asfor Rocha*

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) nasceu, em 1989, de um anseio e de uma necessidade. Anseio de uma corrente expressiva de juristas preocupados com as demandas que a nova ordem constitucional do país inevitavelmente reservaria para a Justiça; necessidade, em face da enorme carga que recairia sobre o Supremo Tribunal Federal (STF) se tivesse de continuar absorvendo também matérias infraconstitucionais.

Já se esperava, àquela época, uma Corte aberta às transformações, dinâmica e naturalmente estimulante.

Instalado no dia 7 de abril de 1989, o STJ julgou, no seu primeiro ano, 3.711 processos. Os passos iniciais foram tímidos, porque tímida ainda era a sociedade brasileira no tocante à reivindicação dos seus direitos.

Mas os tempos estavam mudando e os cidadãos, aos poucos, despertaram do estado letárgico provocado por um longo período de medo e desconfiança. Na verdade, "aos poucos" não é o termo apropriado, pois em duas décadas o STJ passou a ser um tribunal superlativo: já estamos bem próximos de 3 milhões de processos julgados, dos quais mais de 1,5 milhão apreciados apenas nos últimos cinco anos.

O leque dos direitos foi alargado com a instituição de um Estado democrático "destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias..." A cidadania iniciou sua marcha a passos largos. E continua.

Isto explica não apenas o fenômeno dos números, que embora expressivos são frios quando apresentados dessa forma. É que cada demanda judicial possui uma história, uma alma, nos sinalizando mudanças e posturas inimagináveis vinte anos atrás. Como a nos dizer que nenhuma legislação pode ser estática e abrindo caminhos por onde irão em breve trilhar jurisprudências harmonizadas com as mutações dos comportamentos sociais.

A capacidade de acompanhar essas mudanças e a postura vanguardista em temas de real interesse social são fatores que destacam o STJ diante de uma realidade contrastante: de um lado, um país que se moderniza; de outro, a pobreza e a insegurança enredadas de cipoais de leis cada vez mais embaraçados que só aumentam a litigiosidade. E que nos levam a refletir sobre as vantagens de ampliarmos o acesso à Justiça com poucos avanços ainda para alargar a sua saída.

Ainda assim, para se fazer merecedor do atributo de Tribunal da Cidadania, o STJ tem dado prontas respostas aos que batem às suas portas, destacando-se pela qualidade das decisões, que passaram a nortear a jurisprudência nacional com reflexos na nossa melhor doutrina. Decidir bem e estabelecer parâmetros, contudo, não é tudo: há que se preocupar com os princípios e os valores fundamentais da ordem jurídica e do desenvolvimento do Brasil.

Tudo isso a exigir um STJ forte, produtivo, inovador, moderno e aparelhado para enfrentar os desafios futuros. Desafios que não nos intimidam, quando serenamente indagamos: seria possível imaginar o Brasil sem a presença do Superior Tribunal de Justiça?


* Cesar Asfor Rocha é presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal.

Artigo publicado no jornal O Globo, 7 de abril de 2009.

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