Realidade e bom senso Wadih Damous*Os números do sistema carcerário brasileiro nos alertam para uma realidade preocupante e reveladora sobre o tratamento desigual dado a presos ricos - com assistência jurídica plena - e pobres e sem colarinho. Enquanto poderosos conseguem do Supremo Tribunal Federal o benefício da soltura em 48 horas, o Departamento Penitenciário Nacional calcula que haja 133 mil cumprindo prisão preventiva: 30% da massa carcerária. Entre esses, muitos são mantidos presos após o prazo legal para instrução dos processos. E entre os condenados, calcula-se que cerca de nove mil já tenham cumprido a pena, mas, por falta de assistência, continuam em celas superlotadas. Em geral, não obtêm a soltura porque o cumprimento da pena não é comunicado ao juiz. Em geral, são jovens, pretos e pobres. No fim de agosto, o Rio recebeu os serviços do mutirão carcerário coordenado pelo Conselho Nacional de Justiça. No presídio Plácido de Sá Carvalho, onde há 1.300 presos, 105 foram libertados. Mas o mais significativo é que 422 obtiveram algum benefício. O bom resultado da iniciativa deve se multiplicar em outras cadeias e estados brasileiros. Ele nos mostra como o sistema esquece aqueles que encarcera. Aliás, embora seja compreensível que a sociedade tenha a ilusão de que a prisão alivia a nossa insegurança diária, é bom lembrar que, segundo o próprio governo, 80% das pessoas retiradas do convívio social reincidem no crime depois de libertadas. Esse número cai para 5% quando os condenados cumprem penas alternativas. Por isso, as penas alternativas - para os crimes sem violência e com poucos anos de condenação - são uma tendência cada vez mais defendida por juristas e estudiosos. E por leigos de bom senso também. *Wadih Damous é presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de JaneiroArtigo publicado no jornal O Dia, 10 de setembro de 2008.