Sem temor Wadih Damous* 13/08/2008 - É direito dos brasileiros conhecer a história do Brasil. Isso inclui os períodos obscuros que, todos queremos, não se repitam jamais, como o da ditadura. Para passar a limpo esse tempo, ultrapassá-lo em definitivo, é necessário que arquivos sejam abertos e documentos venham a público para consulta. Sem rancor e, principalmente, sem temor. Essa questão vem acompanhada de intenso debate sobre a responsabilização dos agentes públicos que praticaram crime de tortura durante o período de exceção. Discute-se se poderão ser processados. O Judiciário decidirá, e terá que fazê-lo com serenidade, infenso a manifestações de qualquer tipo. Estava certo o presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, ao afirmar, quando sustentou tecnicamente a necessidade de libertar os acusados na operação Satiagraha, que o magistrado não deve temer a opinião pública. Mas o ministro usou peso e medida diferentes - e políticos - para afirmar que a discussão dos crimes de tortura traz instabilidade institucional. Não deveria temer a opinião de alguns militares e ex-torturadores. A OAB entende que a discussão é salutar. Vivemos num Estado Democrático de Direito no qual tais temores não devem ter guarida em nossas instituições. A Ordem entende também que os que torturaram praticaram crime comum, imprescritível, e não político. Nem no regime ditatorial a tortura foi permitida aos agentes públicos. Por isso, carece de fundamento jurídico - e moral - a alegação de que todos se beneficiaram da Anistia. Diante da possibilidade de terem que pagar por seus crimes, ex-torturadores fazem barulho e exibem caras feias, mas a sociedade e a democracia não têm mais por que receá-los. Vamos confiar que o Judiciário dê a resposta correta, com a soberania que lhe compete. * Wadih Damous é presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro Artigo publicado no jornal O Dia, 13 de agosto de 2008