10/12/2008 - 16:06

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CCJ do Senado vota hoje aumento do prazo para progressão

CCJ do Senado vota hoje aumento do prazo para progressão

 

 

Do Jornal do Commercio

 

10/12/2008 - A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado deverá votar hoje o projeto de lei que amplia o tempo de permanência na prisão necessário à concessão da progressão do regime da pena nos casos de crimes hediondos. O texto altera o artigo 2º da Lei nº 8.072/1990, que trata desse tipo de crime, para estabelecer que a alteração do regime fechado para o semi-aberto e, posteriormente, aberto dar-se-á após o cumprimento de dois terços da pena, se o apenado for primário, e de quatro quintos, se reincidente.

 

De autoria da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), a proposta visa aumentar o período de manutenção desses presos em regime fechado. Condenados por crimes hediondos não tinham direito a progredir de regime. Somente a partir de 2006 o benefício passou a ser concedido a eles por causa da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de declarar a inconstitucionalidade do dispositivo da Lei de Crimes Hediondos que vedava a progressão.

 

Com a decisão, presos por esse tipo de crime passaram a ter o direito de progredir de regime após cumprirem um terço da pena. A reação contrária a medida foi intensa. No ano passado, o Congresso aprovou a Lei 11.464/07, alterando a Lei de Crimes Hediondos. Pelas regras atuais, para a concessão do benefício exige-se o cumprimento de dois quintos da pena, quando primário, e de três quintos, se reincidente.

 

O projeto de lei recebeu parecer favorável na CCJ do relator, senador Demóstenes Torres (DEM-GO). De acordo com o parlamentar, os parâmetros atuais são muito baixos considerando a gravidade objetiva dos crimes previstos e as novas frações propostas se ajustam melhor à necessidade de prevenção e represssão dos crimes hediondos. Na justificativa, a autora da proposta afirma que apenas pretende retomar a discussão e elevar o período de manutenção, em regime fechado, de presos considerados pela Justiça perigosos para a sociedade.

 

Advogados criminalistas ouvidos têm opiniões diversas sobre o projeto. A diretora do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Kátia Tavares, disse que a posição firmada pelo STF ao analisar o dispositivo que vedava a progressão foi um avanço. Na avaliação dela, o projeto de lei é inconstitucional e vai na contramão dos princípios garantidores do direito penal e processual penal e dos fins da pena, que é a ressocialização do condenado.

 

Penas severas e prisões mais rigorosas não diminuirão a violência. A prova de tal conclusão é que, nos últimos quase vinte anos, tem-se notabilizado pela proliferação, na legislação penal brasileira, de reforma pontual e casuística, visando ao endurecimento da pena privativa de liberdade, como no caso da Lei dos Crimes Hediondos, todavia, sem resolver ou diminuir a questão da criminalidade, afirmou a especialista, acrescentando que a medida, se implementada pelo Congresso, poderá acirrar as polaridades sociais e aumentar a criminalidade.

 

Não é novidade que o perfil básico da população carcerária é constituído por jovens pobres, predominantemente negros e semi-analfabetos, com menos de 30 anos de idade, sem advogado, cumprindo pena que varia entre quatro a 15 anos de prisão. Por isso, esses dados nos remetem a algumas reflexões, antes do exame de qualquer projeto de lei que venha a propor o encarceramento quase absoluto do preso, endurecendo-se as penas de prisão, disse.

 

Na avaliação de Kátia Tavares, o Estado deveria ter como prioridade uma política criminal de segurança pública, salvaguardando os direitos fundamentais. Não será encarcerando totalmente os presos que se reduzirá a proporção de crimes hediondos cometidos. Ao contrário, após a promulgação dessa Lei, verificou-se um aumento assustador da criminalidade e a reincidência dos delitos cometidos, pois a cadeia degenera e estigmatiza o ser humano, não o ressocializando para retornar ao convívio da sociedade, argumentou.

 

Para o advogado Jair Jaloreto - do escritório Portela, Campos, Bicudo e Jaroleto Advogados -, o que inibe a criminalidade não é o tempo da pena, mas a certeza de punição. A considerar a possibilidade de o condenado passar mais tempo preso em regime mais grave, o projeto, se aprovado, pode servir de desestímulo ao cometimento dos crimes previstos na lei de crimes hediondos. De outro lado, aumentar a permanência do condenado em regime mais gravoso, por si só, não colabora com a ressocialização do preso. É preciso repensar todo o sistema prisional brasileiro, afirmou o especialista, acrescentando: "O projeto visa a diferenciar os prazos para a progressão do regime de pena nos crimes hediondos daqueles previstos para os crimes comuns. A considerar isso, os prazos sugeridos pelo projeto de lei são adequados".

 

O advogado Rogério Taiar, doutorando em Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da USP e pós-graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha), explicou que o projeto de lei é positivo. A proposta apenas aumenta os requisitos e os prazos temporais necessários para que possa ocorrer a progressão do regime de cumprimento de pena, e isso é perfeitamente razoável diante da gravidade objetiva dos crimes previstos. Não fere o princípio constitucional penal da individualidade do cumprimento da pena, disse o especialista.

 

De acordo com Taiar, o tempo estipulado no projeto para que a progressão ocorra é suficiente, pois representa um meio termo entre a proibição da progressão do regime que vigorava antes da mudança de orientação do STF e o que tem sido adotado atualmente nesse sentido, ele elogiou a decisão da mais alta corte do País. A alteração do regime realmente ficou mais fácil, pois os magistrados das instâncias inferiores tendem a julgar de acordo com a nova orientação jurisprudencial do STF na matéria, afirmou.

 

O advogado David Rechulski, sócio do escritório Rechulski e Ferraro Advogados, a progressão visa à reinserção, gradual do condenado à sociedade. Muito mais do que se tratar de um direito individual do condenado, trata-se de um direito coletivo da sociedade, o qual é ignorado pela mesma. É importante atentar para o fato de que não existe prisão perpétua na legislação brasileira e que todo e qualquer condenado, independentemente de seu crime, um dia, mais cedo ou mais tarde, retornará para o convívio em sociedade. Logo, é sumamente importante que esse condenado possa ser submetido a um processo gradativo de reinserção social, pois será muito mais danoso e perigoso que uma pessoa que ficou 30 anos trancafiada, em regime fechado, seja subitamente posta em liberdade e passe a viver no nosso meio, disse.

 

Para o especialista, o importante seria a existência de políticas de recuperação, educação e profissionalização do condenado, permitindo que, ao menos, tivesse condições de buscar mudar de vida. Qualquer medida diferente é, na verdade, tapar o sol com peneira, postergar o inevitável. Se não formos nós a convivermos com os egressos não ressocializados, serão os nossos descendentes, e isso, segundo entendo, dá na mesma, explicou.

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