25/09/2019 - 16:37 | última atualização em 25/09/2019 - 17:05

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Em clube judaico, comissões da OABRJ debatem convergências entre a escravidão negra e o Holocausto

Clara Passi

A Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil (Cevenb) da OABRJ e a da Intolerância Religiosa promoveram, na terça-feira, dia 24, no clube Hebraica, em Laranjeiras, uma análise comparativa entre duas das maiores tragédias que a humanidade já produziu: o Holocausto e a escravidão negra. A provocação se dirigiu sobretudo à forma como o Estado reparou os descendentes e construiu espaços de memória. O jornalista Ronaldo Golemvsky foi anfitrião do encontro, que começou com a exibição do documentário de sua autoria “Os judeus da Nigéria” (2019). Resultado de dez dias de pesquisa, o filme dedica atenção especial aos Igbo, uma comunidade de judeus negros.

O presidente da Cevenb e do grupo análogo no Conselho Federal, Humberto Adami, conduziu os trabalhos. O painel também foi composto pela vice-presidente da Seccional, Ana Tereza Basílio, pela diretora de Igualdade Racial da OABRJ, Ivone Caetano, pelo desembargador e ex-presidente do TRF-2 André Fontes e pela vice-presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa da OABRJ, Suely Beatriz, que representou a presidente, Guiomar Mairovitch. A presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Rita Cortez, também esteve presente. 

Caetano ressaltou o fato de o Brasil abrigar um museu do Holocausto (em Curitiba), mas fazer pouco dos espaços de memória da escravidão

“A reparação do Holocausto já houve. A nossa ainda é devida. As chagas ainda tão aí, basta ver a morte de Ágatha (Félix). Os negros se acaixotaram e só agora começaram a se empoderar. Já o judeu o fez imediatamente”. 

Adami ressaltou a importância de os grupos de advogados levarem as pautas que os animam para além dos muros da Seccional. "A reparação é algo mais profundo do que ações afirmativas. Trata-se da fundação de um outro Estado".   

Basílio citou a Lei Feijó, de 1831, o primeiro diploma a proibir a importação de escravos no país acabou sendo conhecida como “lei para inglês ver”.

“Judeus foram perseguidos ao longo da História. É preciso trocar experiências que foram bem-sucedidas. Em alguns países, é mais grave a acusação de antissemitismo do que a de racismo”, disse.

Gomlevsky, cujo trabalho tem jogado luz sobre expressões pouco exploradas do judaísmo mundo afora, insurgiu-se contra o estereótipo do “judeu branco e rico”, que ele julga ser tão nocivo quanto os que atingem os negros, e frisou a importância de o movimento negro aglutinar-se em torno de lideranças políticas únicas, em âmbito federal, para que os pleitos consigam ser levados a cabo.   

Na visão de Fontes, não haveria espaço para uma analogia da escravidão com o Holocausto, já que o objetivo do primeiro era o extermínio e não só a exploração do trabalho. Ponderou que a comparação com o que aconteceu com outros povos não deveria pautar as diretrizes da militância negra, que não precisaria dessas “amarras”, defendeu cotas para negros no Supremo Tribunal Federal (STF) e ações como bolsas de estudos com recorte de gênero e crédito habitacional. 

A Cevenb planeja voltar ao tema em março, num evento na sede da Seccional. 

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