22/09/2008 - 16:06

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Controle de grampos é questionado no STF pelo procurador-geral

Controle de grampos é questionado no STF pelo procurador-geral


Do jornal O Estado de São Paulo

21/09/2008 - Duas semanas após o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ter baixado uma resolução, disciplinando os critérios e procedimentos a serem adotados pelos juízes estaduais e federais no julgamento dos pedidos de quebra de sigilo telefônico de pessoas investigadas pela polícia e pelo Ministério Público, a constitucionalidade da medida foi questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza.

A resolução do CNJ também criou uma central, na cúpula do Poder Judiciário, para registrar todas as escutas telefônicas autorizadas pela magistratura e monitorar sua execução. Pela resolução, as corregedorias judiciais ficam obrigadas a enviar informações sobre o número de autorizações de interceptação concedidas e as varas onde as autorizações de escuta são mais freqüentes.

O que levou o CNJ a impor essa medida foi o procedimento do juiz Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, em relação ao pedido de interceptação telefônica que recebeu do chefe da Operação Satiagraha, delegado federal Protógenes Queiroz. Apesar de a solicitação ter sido encaminhada sem a devida fundamentação, como a lei exige expressamente, o magistrado concedeu a Queiroz carta branca para acessar quase todos os telefones do País.

O principal alvo da Operação Satiagraha era o banqueiro Daniel Dantas, mas hoje se sabe que os "grampos" aplicados pela Polícia Federal acabaram gravando desde simples conversas de vendedor de churrasquinho com fiscais da Prefeitura de São Paulo a conversas do próprio presidente do STF e do CNJ, do chefe de gabinete da Presidência da República, Gilberto de Carvalho, e de líderes da oposição, como os senadores Heráclito Fortes (DEM-PI) e Demóstenes Torres (DEM-GO), além de empresários do setor financeiro. Até mesmo conversas envolvendo a criação do Fundo Soberano, uma proposta do Ministério da Fazenda, foram interceptadas pela Polícia Federal.

Ao justificar tantas interceptações, o juiz e o delegado alegaram estar sintonizados com o "sentimento da sociedade", revelando uma visão messiânica de seus respectivos papéis funcionais. Em artigo publicado na imprensa, De Sanctis justificou sua decisão alegando que a Justiça precisa dar satisfação diretamente ao povo, enquanto em seu blog na internet Queiroz passou a se apresentar como o "guerreiro das sombras e do silêncio".

Diante da confusão institucional armada por servidores públicos que exorbitaram flagrantemente de suas prerrogativas, o presidente do STF passou a fazer uma ampla defesa da necessidade de impor critérios e procedimentos mais rigorosos para a realização de interceptações telefônicas. E, por fim, levou o CNJ a baixar a resolução cuja constitucionalidade acaba de ser questionada pelo procurador-geral da República. "Não se trata de suprimir o uso de um instrumento que se revela extremamente importante no combate à criminalidade, mas de realizar esse trabalho dentro dos moldes necessários de controle e com a devida possibilidade de responsabilização (de quem vazar o conteúdo das escutas)", esclareceu o ministro Gilmar Mendes.

Na ação direta de inconstitucionalidade que impetrou contra as medidas adotadas pelo CNJ, o procurador Antonio Fernando de Souza alega que elas só poderiam ser impostas por meio de lei ordinária, e não por simples resolução. Isso porque o CNJ é um órgão administrativo do Judiciário, não tendo poderes para interferir nas atividades judiciais nem para assumir iniciativas legislativas, que constituem prerrogativa da Câmara e do Senado. "O CNJ foi além da sua competência constitucional", disse Antonio Fernando de Souza. Ele afirmou ainda que as medidas adotadas pelo CNJ irão inibir os juízes criminais, antes de decidir pela quebra de sigilo telefônico, prejudicando o trabalho dos promotores e procuradores, que têm nas escutas um importante mecanismo de investigação contra a corrupção e o crime organizado.

Agora, caberá ao plenário do STF arbitrar esse litígio, cujo desfecho é de vital importância para a manutenção das garantias fundamentais e das liberdades públicas.

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