10/03/2008 - 16:06

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Cotas dividem o Judiciário

Cotas dividem o Judiciário

 

 

Do jornal O Globo

 

10/03/2008 - O acirrado debate sobre cotas nas universidades federais foi parar na Justiça. Estudantes que perdem a vaga, apesar de tirarem notas mais altas do que cotistas, entram com mandados de segurança para ter direito à matrícula. O assunto divide juízes, a exemplo do que ocorre entre políticos e acadêmicos. Na guerra de liminares, a tendência dos tribunais tem sido a de validar o sistema de cotas, respeitando a autonomia universitária. No Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, já se fala numa jurisprudência pró-cotas. Mas não faltam decisões que passam por cima da reserva de vagas e determinam a matrícula de quem concorreu pelo sistema universal.

 

Na última segunda-feira, quando começaram as aulas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 13 estudantes estavam lá por força de decisões judiciais que contrariaram o regime de cotas. Dezenas de outros candidatos tentaram o mesmo, mas não tiveram êxito.

 

Em janeiro, o tribunal restabeleceu o sistema de cotas na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que fora suspenso por liminar da Justiça Federal de primeira instância. A UFSC reserva 20% das vagas para alunos de escolas públicas, e 10% para negros. Quem move a ação é o Ministério Público, convencido de que as cotas são inconstitucionais.

 

Ao acolher o recurso da universidade, o desembargador federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz citou um acórdão do tribunal que tem servido de base para liminares favoráveis às cotas: "O interesse particular não pode prevalecer sobre a política pública. (...) Não se poderia sacrificar a busca de um modelo de justiça social apenas para evitar prejuízo particular", escreveu o desembargador Luiz Carlos de Castro Lugon.

 

Nessa decisão, Lugon votou contra uma liminar que ele próprio havia concedido em benefício de uma estudante de odontologia que ficara sem a vaga na Universidade Federal do Paraná.

 

O novo entendimento prevaleceu no acórdão da 3aTurma do TRF-4, em abril do ano passado.

 

Recentemente, o mesmo tribunal reduziu à metade o percentual de vagas reservadas no curso de engenharia mecânica da UFSC - de 20% para 10%, no caso de alunos de escola pública, e de 10% para 5%, no de estudantes negros.

 

 

Juiz diz que maioria dos catarinenses são brancos

 

O juiz convocado Marcelo de Nardi argumentou que apenas 11% da população catarinense negra ou parda, segundo o último censo do IBGE.

 

"Um sistema que, a título de promover ações afirmativas, impõe percentuais elevados de reserva de vagas, flagrantemente distanciados da finalidade a que se propõe, por certo não é razoável e acaba constituindo, em efeito inverso, fator de discriminação", escreveu Nardi.

 

O TRF-4 também rejeitou um pedido de cinco alunos que queriam que as regras especiais das cotas já fossem usadas na primeira fase do vestibular da Universidade Federal de Santa Maria (RS). A universidade adota um mecanismo que só favorece negros que passam para a segunda etapa. Nesse caso, o TRF-4 invocou o princípio da autonomia universitária para garantir o direito da instituição de restringir o benefício. "A concretização das ações afirmativas dentro das universidades está sujeita à autonomia didático científica de que gozam aquelas entidades", escreveu o juiz convocado Loraci Flores de Lima.

 

Em 2007, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no Rio, rejeitou uma ação de 48 alunos de escolas particulares que tentavam evitar a reserva de vagas na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Agora, estudantes reprovados no vestibular vão fazer o mesmo. Desta vez, porém, o objetivo não será acabar com as cotas, mas simplesmente garantir a própria matrícula.

 

A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) também é alvo de ações de candidatos preteridos por causa das cotas. Como se trata de instituição estadual, os casos são julgados no Tribunal de Justiça. O diretor jurídico da Uerj, Maurício Mota, diz que a maioria das decisões favorável à instituição, que segue lei estadual reserva 20% das vagas para alunos de escola pública e 20% para negros, desde que sejam de famílias de baixa renda. Outros 5% são para deficientes físicos e filhos de policiais, bombeiros agentes penitenciários mortos em serviço.

 

Já as universidades federais têm autonomia para decidir se adotam ou não ações afirmativas e qual o seu formato. A desembargadora Maria Lúcia Luz Leiria, do TRF-4, registrou que 20 universidades federais e 19 estaduais já adotam esse tipo de política.

 

Advogados, pais e estudantes apostam que palavra final será dada pelo Supremo Tribunal Federal, à medida em que os recursos chegarem à Corte. Na Câmara, está engavetado o projeto que reserva 50% das vagas das universidades federais para alunos da rede pública. Foi enviado pelo governo Lula em 2004, está pronto para votação em plenário, mas não há consenso. Procurado pelo GLOBO, o ministro da Educação, Fernando Haddad, não quis falar sobre o assunto.

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