25/05/2020 - 18:17 | última atualização em 26/05/2020 - 12:00

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Dia Nacional da Adoção em tempos de isolamento: como ficam os processos em meio à pandemia?

Cássia Bittar



Instituído em 2002, o Dia Nacional da Adoção é celebrado nesta segunda-feira, dia 25 de maio, no meio de uma nova realidade: como estão os processos de adoção em meio às restrições de funcionamento da Justiça diante da pandemia do novo coronavírus?

Em um momento de crise, em que as chamadas “adoções necessárias”, ou seja, de crianças maiores de seis anos e adolescentes, de grupos de irmãos e de crianças/adolescentes com problemas de saúde ou com deficiência, precisam de mais celeridade, um entrave atravessa o caminho de futuros pais e mães: com a suspensão temporária da tramitação de processos físicos no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), não está sendo possível durante todo este período dar entrada em um novo pedido nas varas da Infância, da Juventude e do Idoso.

O funcionamento das varas com processos físicos já é motivo de preocupação para a OABRJ há tempos: no último ano, a Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente (CDCA) da Seccional enviou ofícios ao tribunal requerendo a imediata digitalização de todos os processos. Segundo a presidente do grupo, Silvana do Monte Moreira, o fundamento se dá pela interpretação da Constituição Federal: “Criança e adolescente são os únicos sujeitos de direito que têm prioridade absoluta garantida pela Constituição. Logo, era pras essas varas terem sido as primeiras a serem digitalizadas”.

Segundo dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), existem quase 34 mil crianças e adolescentes abrigadas em casas de acolhimento e instituições públicas por todo país. Destas, 5.040 estão totalmente aptas para a adoção. Por outro lado, 36.437 pessoas estão interessadas em adotar.

A paralisação temporária, em sua análise, provocará uma enxurrada de procedimentos assim que o sistema reabrir: “Imagino que logo que acabar a pandemia tudo que está represado virá de uma só vez: todos os estudos que estavam paralisados, os novos estudos, as habilitações que não puderam ser feitas. Eu, pessoalmente, conheço pessoas querendo se habilitar para adoções necessárias e que não podem agora. Enquanto isso, as crianças aguardam por uma família. Nós já não temos uma estrutura que comporte bem a demanda natural, é preciso contratar mais psicólogos e assistentes sociais – e isso deve ser prioridade, seguindo prioridade estabelecida na Constituição. Agora, imagine nessa volta”. 

Silvana do Monte Moreira / Foto: Bruno Marins

Encontros e procedimentos virtuais garantem fluidez para habilitados

Em outra via, uma ação da CDCA da OABRJ diretamente junto às varas da Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capital garantiram que quem já estava habilitado para adotar não tivesse a fluidez de seu processo interrompida neste momento de isolamento social.

Desta forma, decisões judiciais remotas, via WhatsApp e email, estão sendo aplicadas pelos juízes das varas, que, segundo Silvana, estão incansáveis neste período. “Temos que louvar essas atitudes e o diálogo que os magistrados mantém com a Ordem”, elogia, informando que as guardas provisórias também estão sendo renovadas por email.

Já a possibilidade das videoconferências ajudam os habilitados a participar, ainda durante o isolamento, das reuniões presenciais obrigatórias de habilitação dos candidatos a pai e mãe (é necessário ter quatro presenças).

Silvana informa que somente a II Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital não está aplicando ainda os procedimentos virtuais extraordinários pois, no momento do pedido da OABRJ, estava sem processos. “O juiz titular que assumiu a vara agora está analisando nosso pleito e se aprovará a possibilidade de implementação das presenças nos grupos”.

A advogada Aline Vieira é habilitada desde julho de 2018 e é uma das muitas mães à espera de filhos que encontram nos grupos pela internet não só uma forma de fazer andar seu processo, mas também de apoio e crescimento: “A gente vive essa ansiedade de aguardar a chegada do nosso filho, todo um processo de amor que se assemelha ao processo biológico: não sei a cara que meu filho terá, por exemplo. Sendo que minha espera é bem maior do que de nove meses. Por isso, nossa ansiedade está a mil. E mesmo sendo advogada, tendo conhecimento jurídico, trabalhando com Direito de Família, eu aprendo muito com os grupos, com as pessoas que já passaram pela fase que eu estou, que já estão com seus filhos. A gente precisa desse vínculo. Queremos aumentar nossa família e nesse processo todo é de extrema importância que, apesar de estarmos em uma pandemia estejamos participando de eventos de adoção online”.

Aline Vieira e seu marido Carlos Henrique Chaves com a cachorrinha Suzi: família se prepara para a chegada do novo membro

A presidente da CDCA corrobora que o processo é rápido para quem tem a estrutura e pode contar com os meios virtuais, mas frisa que se as varas fossem digitalizadas, os procedimentos seriam ainda mais céleres, além de todos os procedimentos correrem de forma natural.

Aline conta que tinha certeza que queria adotar um filho desde que era muito nova e que teve o apoio de seu marido: “Meus pais me deram uma base de amor muito grande, uma visão muito humana. E eu sei que a adoção impacta no social porque aquelas crianças que estão em abrigo, quando completam 18 anos, não têm pra onde ir. As pessoas precisam ver um significado maior do que representa a adoção e o que representa é amar.”

“Precisamos abrir os olhos para todas as crianças e jovens”, completa Silvana, “pois eles são sujeitos de direitos. Aquela criança que pede dinheiro no sinal e você fecha o vidro porque está com medo, aquela criança que é explorada sexualmente, que é explorada e colocada para trabalhar. Nenhuma delas deve ser invisível. Toda criança tem direito a uma família, seja por via natural ou adotiva”.

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