23/08/2008 - 16:06

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Especialistas apontam falhas em processo contra médico acusado de fraude na fila de transplantes

Especialistas apontam falhas em processo contra médico acusado de fraude na fila de transplantes


Do Jornal O Globo

23/08/2008 - A conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RJ) Márcia Dinis e o jurista Luiz Flávio Gomes acham que a Polícia Federal falhou ao não ouvir o médico Joaquim Ribeiro Filho, ex-coordenador do programa Rio Transplante, durante a fase de inquérito da Operação Fura-Fila. Para Luiz Flávio Gomes, a atitude da PF poderá provocar a nulidade do processo. Acusado de chefiar um esquema para furar a fila de transplantes de fígado no Rio, Joaquim foi denunciado à Justiça sem ter tido direito a dar a sua versão, apesar de ter pedido oficialmente.

Segundo o jurista, qualquer acusado tem direito a falar na fase de inquérito. Ele citou como exemplo as denúncias de corrupção na prefeitura de Santo André, em São Paulo, em 2002. No caso, os acusados não foram ouvidos e, por causa disto, a Justiça anulou o recebimento da denúncia e devolveu o inquérito para a polícia.

Em março deste ano, antes de o Ministério Público federal oferecer a denúncia, os advogados de Joaquim Ribeiro Filho enviaram, em vão, uma petição ao delegado federal Giovani Celso Agnoletto, responsável pelas investigações, para que o médico fosse ouvido. Segundo o advogado Paulo Freitas, que defende o médico, todas as testemunhas e denunciados depuseram, menos Joaquim.

Para a criminalista Márcia Dinis, conselheira da OAB/RJ, a polícia tem descumprido o Código de Processo Penal, que, no artigo 6º diz como a polícia deve conduzir o inquérito. No quinto inciso, está determinado que o indiciado dever ser ouvido.

"Como se vai apurar um crime sem ouvir o principal acusado? Isso é preciso, principalmente, quando se trata de uma questão extremamente técnica, como no caso de transplantes", disse Márcia.


Jurista diz que prisão foi caso típico de exagero

A prisão de Joaquim Ribeiro Filho também é questionada por juristas. Para Luiz Flávio Gomes, foi mais um caso típico de exagero. "Não há necessidade de prisão. Pode-se bloquear os bens, proibir o exercício de cargo público, ambas penas duras. Houve um exagero da Polícia Federal. A polícia acha que a prisão é a única pena que ele sofrerá. É a Justiça imediatizada", disse.

Luiz Flávio Gomes, ao comentar o caso do médico, citou ainda o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), que falou em "espetacularização" da prisão quando o empresário Daniel Dantas foi detido pela PF. Para os advogados do médico, a prisão não se justificava, já que não havia, como a lei determina, ameaça à ordem pública ou a coação de testemunhas. No habeas corpus concedido pela 2ª Turma do Tribunal Regional Federal, foi considerado que houve constrangimento.

"Não era necessário todo aquele aparato, com homens armados com fuzis entrando na minha casa às 6h. Se eu tivesse sido intimado para me apresentar em Bangu 8, eu iria", disse Joaquim Ribeiro Filho. O médico também reclama da truculência policial durante as investigações. Segundo ele, dia antes de médicos serem intimados, policiais iam ao Hospital do Fundão armados com fuzis e causavam constrangimento.

Diante disso, o diretor do hospital, Alexandre Pinto Cardoso, encaminhou um ofício ao procurador-geral da UFRJ comunicando que a presença de policiais no hospital estava provocando constrangimento a pacientes e funcionários.

Acusado de ter caracterizado falsamente um fígado como marginal (em más condições), em 2003, para usá-lo em Jaime Ariston, irmão de Augusto Ariston, então secretário estadual de Transportes, Joaquim nega. O caso originou um processo no Conselho Regional de Medicina e o cirurgião foi absolvido por unanimidade em 2006. O médico também é acusado de ter privilegiado Carlos Augusto de Alencar Arraes (filho do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes e irmão do diretor Guel Arraes, da TV Globo).

Joaquim explicou que o órgão, de um doador de Minas, não tinha como ser captado pelas equipes do Fundão e do Hospital Geral de Bonsucesso porque o caso ocorreu no dia do acidente com o avião da TAM, em São Paulo, e o país enfrentava o caos aéreo. Como o órgão seria descartado, a família de Arraes - que tinha autorização e condições financeiras para captar o órgão - fretou um avião.

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