26/09/2007 - 16:06

COMPARTILHE

Governo vai publicar lista de devedores. Advogados se preparam para disputa

Governo vai publicar lista de devedores. Advogados se preparam para disputas

 

 

Da Gazeta Mercantil

 

26/09/2007 - Medida começa a valer em outubro; advogados já se preparam para disputas judiciais. O Ministério da Fazenda vai tornar pública, a partir do mês que vem, por meio de cadastros de inadimplentes como o Serasa e o SPC, a lista que inclui os devedores inscritos na dívida ativa, com débito junto ao Fisco ou Tesouro Nacional, ou seja, aqueles que já tiveram o recurso negado na última instância administrativa federal, o Conselho de Contribuintes. A Fazenda calcula que serão inscritos três milhões devedores, entre pessoas físicas e jurídicas, que somam dívidas de R$ 630 milhões.

 

Mesmo os que questionam os débitos na Justiça vão parar nos cadastros de proteção ao crédito do País e provavelmente não vão conseguir empréstimos ou fazer compras a prazo. De acordo com a Fazenda, o Serasa, o SPC e a Equifax já procuraram o governo interessados nas informações. Os dados vão ficar disponíveis em duas semanas, quando a Receita vai publicar uma portaria no Diário Oficial da União.

 

O governo já começou a receber críticas de advogados que acusam a iniciativa de inconstitucional. O Ministério da Fazenda, porém, está preparado para contestações, mas não concorda com a interpretação dos juristas. O procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Adams, informou ontem que só serão poupados aqueles que obtiverem liminares dos juízes para que o processo seja suspenso, aqueles que parcelarem a dívida ou derem alguma garantia, como depositar o valor em Juízo.

 

Uma das preocupações na elaboração da lei foi não atropelar a Lei de Sigilo Fiscal, que impede a Receita de divulgar qualquer informação que leve ao cálculo do tamanho do patrimônio do cidadão ou empresa. Também estão proibidas de virem a público as dívidas que ainda não passaram pelo Conselho de Contribuintes.

 

O vice-presidente da OAB Nacional (Ordem do Advogados do Brasil), Vladimir Rossi Lourenço, disse que a iniciativa do governo é coercitiva e viola o princípio da defesa, garantido pela Constituição Federal. Na sua interpretação, o governo só poderia adotar iniciativa semelhante depois de concluídos os trâmites legais na Justiça. "Há uma diferença entre ter o nome incluído em um cadastro de inadimplentes porque o consumidor não pagou uma compra que fez obedecendo o princípio da vontade. Nesse caso, ele deixou de cumprir um contrato", disse. "As pessoas não pagam impostos por vontade, mas porque eles são impostos a elas, portanto, têm o direito de não pagar e contestar a legalidade da cobrança. Só o Judiciário pode decidir", disse.

 

Para Adams, a decisão do governo serve para incentivar o pagamento das dívidas e prestar serviço ao setor financeiro, ao divulgar as informações. "Vamos disponibilizar a informação para quem nos procurar", disse. "Sabemos que esses cadastros são um negócio e não queremos alavancar o negócio de ninguém", disse.

 

"Os bancos querem saber quem deve ao Fisco. Por que colocar o nome de quem deve a uma loja no Serasa é legítimo e ao governo não?", questionou. "Nosso objetivo é sim coagir a cobrança. Se a gente quer tratar a dívida tributária como algo que não deve ser pago, temos que rediscutir as leis".

 

Do total de dívidas, 10% são não-tributáveis, como dívidas trabalhistas, que também vão para os cadastros de inadimplentes. O restante, 90%, são impostos não pagos. Adams calcula que em um ano todos os inadimplentes estarão com o nome sujo na praça. A União não vai enviar de uma vez só todos os nomes. Serão divididos em lotes, por valor a ser pago, data em que a dívida foi contraída e tipo de imposto. A princípio, os primeiros serão os devedores mais recentes porque, na avaliação de Adams, são os com maior probabilidade de quitar o débito.

 

 

Advogados

 

O tributarista Raul Haidar afirma que a medida será boa para os advogados. "Já temos todo fundamento jurídico para sustentar mandados de segurança contra o dispositivo", afirma. Para Haidar, deverá chover ações contra a inscrição de contribuintes supostamente em débito com o Fisco nas listas de inadimplentes das entidades de proteção ao crédito. E as chances de ganhar são altas, segundo o tributarista. "A Súmula 547 do Supremo Tribunal Federal (STF) deixa claro que o contribuinte em débito não pode ser impedido de exercer suas atividades profissionais", diz.

 

Para o tributarista, o procedimento correto de cobrança é a procuradoria entrar com execução fiscal na Justiça contra os contribuintes. "Pequenas e médias empresas terão que fechar as portas porque os bancos não vão mais descontar duplicata e as demais financeiras não vão mais conceder empréstimos para as empresas listadas nesse cadastro", afirma.

 

O jurista e tributarista Ives Gandra da Silva Martins também considera a medida inconstitucional por ser coercitiva. Para ele, com o dispositivo, a Fazenda e as entidades de proteção ao crédito farão com que o sistema financeiro e todo crediário não dêem mais crédito ou financiamento para pessoas com débito fiscal.

  

Gandra lembra ainda que em parecer de sua autoria para o Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) orientou que, no crediário, os consumidores teriam que concordar que o nome fosse levado à lista de inadimplentes, caso ficasse nessa situação. "No caso, de débito fiscal isso nunca acontecerá", explica. O jurista comenta também que se a medida inviabilizar a vida de uma empresa, ela correrá para pagar mesmo achando que tem direito de não pagar o tributo.

  

Já o presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Luigi Nese, acha a medida um absurdo. "Isso porque, muitas vezes, o débito não é real, foi colocado pela Receita por algum cruzamento de dados que, muitas vezes, é decorrente de erro", diz Nese. Para o empresário, é temerário colocar milhões de nomes em uma lista como esta sem comprovação judicial. "E como serão milhões de contribuintes nessas listas, de uma vez, esses cadastros de proteção ao crédito correm o risco de perder a credibilidade", afirma.

Abrir WhatsApp