09/06/2020 - 18:15 | última atualização em 10/06/2020 - 10:35

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I Encontro virtual da Mulher Advogada do RJ debate desvantagens agravadas pela pandemia

Clara Passi

 A abertura do I Encontro virtual da Mulher Advogada do Estado do Rio de Janeiro, que está sendo transmitido pelo canal da OABRJ no YouTube , na terça-feira, dia 9, e na quarta, dia 10, foi marcada por falas incisivas, que transmitiram a urgência de a Ordem seguir na cruzada em prol da democracia e de mitigar, na esfera institucional, as desvantagens sofridas por mulheres que foram radicalizadas pela pandemia da Covid-19. 

À luz das maiores manifestações antirracismo desde os levantes pelos direitos civis de negros nos Estados Unidos, nos anos 1960, o fio condutor dos debates foi também a necessidade de se discutir as questões do momento sob o prisma racial. 

A forma como isso é abordado no âmbito institucional da Ordem foi corporificada por representantes da Diretoria de Igualdade Racial da OABRJ e da Comissão Estadual da Verdade da Escravidão Negra no Brasil (Cevenb) e do Grupo de Trabalho Mulheres Negras da OAB Mulher RJ. A coordenadora deste GT, Flávia Monteiro, foi responsável pela condução do encontro. 

O presidente da Seccional, Luciano Bandeira, citou com orgulho os diversos grupos da Seccional dedicados aos direitos da mulher advogada e à igualdade racial, falou do extermínio da juventude negra nas comunidades do Estado do Rio -  a taxa de letalidade policial relativa a negros, estopim da revolta americana, é muito maior no Brasil - e a militância da OABRJ junto aos tribunais para que a advocacia tivesse o direito protestativo sobre atuar nos processos eletrônicos nessa retomada dos prazos judiciais.

“A situação da mulher advogada na pandemia foi algo que me angustiou muito. Com escolas, creches fechadas, sabemos da sobrecarga que recai sobre a mulher advogada. Vivemos numa sociedade arcaica, em que homens atuam de forma machista no âmbito doméstico, impondo condições desiguais à mulher no mercado da advocacia”, disse. 

O presidente da OABRJ garantiu que a entidade vai discutir de forma enfática o assunto e “criar instrumentos que as protejam de uma sociedade historicamente racista e machista”. 

A diretora de Mulheres da OABRJ, Marisa Gaudio, contou que o objetivo do evento foi unir as mulheres neste momento de afastamento e sobrecarga e convidar homens para discutir soluções. 

“Conseguimos continuar próximas, mesmo distantes fisicamente. Este evento debate as pautas que não podem ficar esquecidas e serve para que se normalize a presença das mulheres nas mesas e espaços de poder”. 

Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Rita Cortez pregou a defesa da Constituição Federal como um arcabouço de princípios igualitários e valores civilizatórios, criticou o menosprezo do Governo Federal à gravidade da pandemia e repudiou os ataques sofridos pelo IAB nas redes sociais por parte de “robôs e milícias virtuais”.

“As mulheres, sobretudo as negras, são as primeiras a sofrer as consequências das pandemias. Têm responsabilidade familiar, violência doméstica, acúmulo de funções”.

A presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada (CNMA), Daniela Borges, afirmou que a pandemia está convocando para uma encruzilhada.

“Estamos sendo chamados a escolher entre irmos em direção ao melhor ou ao pior de nós. Se não atuarmos, sairemos com mais desigualdade. Precisamos empreender ações, sobretudo na perspectiva institucional, para que tenhamos os mesmos direitos e oportunidades”. 

O presidente do Conselho Federal, Felipe Santa Cruz, disse que este é um momento de ampliação dos espaços femininos na Ordem

“Na próxima eleição (em 2021) teremos também a garantia de 30% de participação das mulheres nas diretorias, também no Conselho Federal. É hora de garantirmos essa diversidade. Esse protagonismo feminino tem que se transformar num verdadeiro movimento de ajuda nessa reconstrução da sociedade”, afirmou. 

O presidente da Ordem citou a explosão dos índices de feminicídio e o acúmulo de tarefas em casa em face da volta dos prazos processuais como temas que desafiam os movimentos de militância feminina. 

“Neste momento, é dada a chance às mulheres de verdadeiramente capitanear os interesses da classe, ao ocupar os espaços de poder na Ordem”. 

Felipe pediu adesão à campanha da qual a OAB participa ao lado de outras  entidades da sociedade civil, como ABI (imprensa), CNBB (igreja) e SBPC (ciência). Em março,  o grupo lançou a campanha 'Em defesa da vida', que reforça o pedido para que a população permaneça em casa durante a crise sanitária e defende a democracia. 

Para o secretário-adjunto da OABRJ, Fabio Nogueira, nunca foi tão importante, em todo o período da pós-democratização, uma concertação de homens e mulheres democratas na reafirmação de valores caros à nossa Constituição. 

“Nesta quadra histórica, em que vicejam o ódio e a intolerância, é preciso reafirmar a luta contra o machismo, o racismo, a homofobia”.  

Uma das organizadoras do evento, a presidente da OAB Mulher RJ, Rebeca Servaes, frisou a presença de mulheres negras em todas as mesas e diversidade de perfil das convidadas.

“Além da pandemia, vê-se violações de direitos das minorias, o genocídio da população negra, aumento da violência doméstica e da virtual contra a mulher”. 

A vice-presidente da OAB Mulher RJ, Flavia Ribeiro, que representou a diretora de Igualdade Racial da Seccional, Ivone Caetano, e o presidente da Cevenb, Humberto Adami, afirmou que a OABRJ “nunca foi tão frequentada pela advocacia negra”. Esta abertura foi acelerada, disse ela, pelas gestões de Felipe Santa Cruz e por esta, de Luciano. 

“Tenho total liberdade para propor ideias, enviamos um ofício sobre o caso de racismo envolvendo estudantes do Colégio Liceu Franco Brasileiro. Proponho que façamos um seminário grande sobre o tema, no qual tenhamos pessoas negras e brancas que possam lançar os dois olhares sobre o tema”. 

Presidente da Caarj, Ricardo Menezes garantiu que a valorização da mulher advogada é prática por lá: a instituição mudou o nome de Caixa de Assistência dos Advogados para ‘da Advocacia’ e tem mulheres como maioria nos quadros. 

Com presença de membros do Conselho Federal e de líderes dos grupos da Seccional e de subseções, os diversos paineis trazem discussões sobre justiça e tecnologia, o acesso à justiça durante a pandemia, a advocacia e a maternidade, direitos trabalhistas da gestante, o direito da mulher à entrega do filho para adoção, as perspectivas sobre a violência contra a mulher em casa, na internet e nas instituições; a saúde no panorama atual, a saúde mental da mulher advogada, o atendimento à mulher no sistema de saúde durante a pandemia e o acesso à saúde da mulher trans. 

O  Fundo Especial de Garantia ao Pagamento de Pensão Alimentícia, o  envelhecer para a mulher negra, a mulher deficiente, o conceito de Mulherismo e a representatividade política (que será tratada pela deputada estadual Renata Souza) também pautaram os paineis. 

Veja aqui a programação completa e acompanhe o encontro ao vivo.

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