14/11/2007 - 16:06

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IPTU: alíquotas progressivas geram disputa judicial

IPTU: alíquotas progressivas geram disputa judicial

 

 

Do Jornal O Globo

 

14/11/2007 - De piscinas, agora é a vez das paredes. Proprietários de imóveis recadastrados pela Secretaria municipal de Fazenda estão sendo surpreendidos ao descobrir, através de folhetos da prefeitura, que paredes e pilares, até então não incluídos no cálculo, podem aumentar a área do imóvel entre 15% e 20%, dependendo da espessura. Dirigentes do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Rio (Sinduscon-RJ), no entanto, calculam que as paredes representem de cinco a 10% da área total. O acréscimo é apresentado pela secretaria como um dos prováveis motivos para a elevação do valor do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de imóveis que passam por revisão.

 

O impacto das paredes no peso do IPTU é maior nos imóveis menores e nos mais antigos. Segundo Antônio Carlos Mendes Gomes, diretor-executivo do Sinduscon-Rio, quanto menor a unidade, maior o percentual de parede na área total. No caso das construções antigas, as paredes são mais grossas, ocupando mais espaço.

 

"Há imóveis da década de 40 com paredes de 30 a 40 centímetros de espessura. Da década de 90 para cá, o padrão de construção é de dez a 12 centímetros para paredes", explica.

 

Embora disfarçada, a cobrança do IPTU das paredes é legal: foi incluída no Código Tributário Municipal (Lei 691) em 1988, sendo regulamentada pelo prefeito Cesar Maia, através do Decreto 14.327, em 1994. De tão cifrada, a tributação é desconhecida até pelo prefeito. "Parede? Nunca ouvi falar nisso ", disse ontem o prefeito por e-mail.

 

 

Prefeitura envia guia complementar

 

A antropóloga Regina Prado, moradora de Laranjeiras e dona de duas lojas no bairro, também nunca tinha ouvido falar na tributação das paredes, até receber, em outubro, uma guia complementar de IPTU.

 

Uma de suas lojas, que, antes da revisão, tinha 28 metros quadrados, passou a ter 63 metros quadrados. "Levei um susto quando recebi a cobrança. Fui à Região Administrativa e recebi um folheto que fala na inclusão das paredes. Além disso, os técnicos incluíram na área de meu imóvel um sótão onde só há caixas d"água e compressores. Há ainda outros erros no cálculo do meu imposto e entrei com recurso", conta Regina.

 

O subsecretário municipal de Fazenda, Domingos Travaglia, alega que funcionários do órgão tentaram, por três ou quatro vezes, vistoriar uma das salas de Regina, sem conseguir autorização para isso. Segundo o subsecretário, o recadastramento dos imóveis é feito a partir de vistorias locais, com avisos prévios das visitas e, quando necessário, com agendamento.

 

Depois de várias tentativas, quando o técnico não consegue visitar um imóvel, o procedimento é recadastrá-lo com base em uma estimativa. Ele diz, ainda, que no caso de Regina, embora o processo ainda esteja sendo analisado, as correções de áreas não decorrem de medição de paredes.

 

Uma dona de um apartamento térreo da Rua Pires de Almeida, em Laranjeiras, também recebeu uma nova guia de IPTU, dando conta de que seu imóvel cresceu 33 metros quadrados - passou de 118 para 151 metros quadrados: "Não recebi nenhuma notificação de que meu imóvel seria vistoriado. Só recebi a nova cobrança. Passei uma tarde (ontem) tentando falar com o telefone de informações da Secretaria de Fazenda, mas não consegui", diz a moradora, que prefere não se identificar.

 

O professor de história Nireu Cavalcanti, outro proprietário de Laranjeiras, está desconfiado de que o aumento de 34% na área de seu apartamento foi decorrente da inclusão das paredes no cálculo: "Vou entrar com recurso. Isso é um absurdo", afirmou.

 

Quando soube da possibilidade de cobrança do "IPTU da parede", o comerciante Aníbal Cruz, dono de uma papelaria no mesmo bairro, ficou desconfiado e foi conferir os carnês pagos nos últimos anos: "Descobri que, há três anos, houve um aumento da área de minha loja de cerca de 4 metros. Será que contaram as paredes?".

 

De acordo com o subsecretário Domingo Travaglia, 169.206 imóveis tiveram a área acrescida no período de recadastramento, de 1994 a 2007. Ele, no entanto, não sabe informar em quantos desses casos houve aumento de área por causa da contabilização das paredes. O processo de recadastramento predial começou em 1994, sendo praticamente interrompido em 2000, após terminar o contrato com a empresa que fazia o serviço. Ano passado, depois da contratação de 70 agentes, por concurso, o trabalho recomeçou.

 

Este ano, a prefeitura está recadastrando 10.969 imóveis de dez bairros (Barra, Itanhangá, Lagoa, Jardim Botânico, Laranjeiras, Cosme Velho, Flamengo, Tanque, Freguesia e Pechincha). Alguns contribuintes estão recebendo guias complementares do IPTU de 2007, para que paguem a diferença correspondente à área a mais - de paredes e outros itens - identificada na revisão.

 

O parágrafo único do artigo 64, que permite a cobrança de paredes, diz que a área do imóvel para cálculo do IPTU "é obtida através dos contornos externos das paredes ou pilares, computando-se também a superfície". Ou seja: o cálculo da área é feito pelas paredes externas, não levando em conta a área útil. Em casos de paredes vizinhas, a conta é dividida. "Nossos técnicos cumprem rigorosamente a lei. O artigo 64 do Código Tributário dá tratamento igual a todos os contribuintes. Além disso, o valor venal (base de cálculo do IPTU, sobre o qual incide uma alíquota) está sempre abaixo do preço de mercado", afirma o subsecretário.

 

A presidente da Comissão de Assuntos Tributários da seccional do Rio da Ordem dos Advogados do Brasil, Daniela Gusmão, diz que a prefeitura está embasada na legislação para cobrar "o IPTU da parede".

 

Ela, porém, alerta os contribuintes para checarem todos os itens que servem para calcular o valor venal - idade, posição, tipologia e valor do metro quadrado, entre outros: "Outros fatores, além das paredes, podem impactar o cálculo. Com base num laudo técnico, o contribuinte pode questionar o valor venal".

 

O advogado André Junqueira, especialista em direito imobiliário, afirma que o Código Tributário Municipal permite a cobrança da diferença de área retroativa a cinco anos. A prefeitura, porém, se limita a exigir o pagamento do complemento relativo ao ano do recadastramento. Nos carnês seguintes, o valor venal é calculado levando em conta a nova área.

 

 

Alíquotas progressivas geram disputa judicial

 

Insatisfeitos com os valores de IPTU e com a cobrança de alíquotas progressivas (de 1988 até 1998), muitos contribuintes do Rio entraram na Justiça. Em fevereiro de 2006, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que o IPTU do município Rio não deveria ser cobrado de forma progressiva após 1988. O órgão considerou inconstitucional esse tipo de cobrança, instituído por uma lei de 1984 e abolido pela Constituição federal em 1988. A decisão beneficiou os que questionaram o fato de a alíquota variar de acordo com o valor e a localização do imóvel.

 

Em 1998, a prefeitura resolveu seguir a Constituição e adotar alíquotas únicas: 1,2 para residências, 2,8 para imóveis comerciais e 3,5 para terrenos. Essa foi a última modificação na legislação do IPTU da cidade. Desde então, os aumentos se dão por conta de recadastramentos. Os valores são ainda reajustados pelo IPCA-E anualmente.

 

Mas, segundo o deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ), a cobrança progressiva voltou a ser permitida em setembro de 2000, com a aprovação da Emenda Constitucional 29, que alterou o artigo 156 da Constituição Federal: "A emenda permitiu a progressividade e as alíquotas diferenciadas, em função de localização, valor e uso do imóvel. São Paulo, por exemplo, em 2001 criou o IPTU diferenciado, com cinco faixas para imóveis residenciais e quatro para não residenciais, em função do valor venal. Em Curitiba, há nove faixas para imóveis residenciais e cinco faixas para imóveis comerciais".

 

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