31/07/2023 - 19:01 | última atualização em 31/07/2023 - 21:57

COMPARTILHE

Julho das pretas: participação da mulher negra na reparação da escravidão é tema de seminário na OABRJ

Encontro majoritariamente feminino, reuniu diversas operadoras do Direito e autoridades do estado

Biah Santiago



Encerrando a agenda de eventos do mês de julho, a Comissão Estadual da Verdade da Escravidão Negra no Brasil (Cevenb) da OABRJ realizou, durante toda a tarde desta segunda-feira, dia 31, o evento ‘Julho das pretas da Cevenb’, que discutiu a participação de mulheres negras em espaços representativos da sociedade, bem como no papel de peça central para a construção do debate sobre a reparação da escravidão. 

Com elenco de palestrantes predominantemente feminino, o seminário reuniu nomes da OABRJ, operadoras do Direito e autoridades do estado para fomentar a pauta. É possível assistir ao encontro na íntegra pelo canal da Ordem no YouTube.

O presidente  e a vice da comissão, Humberto Adami e Alessandra Santos, foram os encarregados pela gestão do evento. Completaram a mesa inicial a  coordenadora-geral da Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), Fernanda Thomaz; a presidente da Associação de Mulheres Empreendedoras do Brasil (Amebras), Célia Domingues; a subsecretária-executiva de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da Secretaria Estadual da Mulher (SPM-Rio), Monalyza Alves; a presidente da OAB/Casimiro de Abreu, Alessandra Batista; e a representante da Secretaria Estadual da Mulher, Karol Mendes. 

Em sua fala de abertura, Humberto Adami relembrou os projetos desenvolvidos pelo grupo, entre eles a parceria com o Tribunal de Justiça (TJRJ) com a iniciativa de resgate de documentos do período escravocrata e o lançamento da Cartilha dos Povos de Terreiro - elaborada pela Mãe Márcia d'Oxum, Ialorixá do terreiro Egbé Ilè Iyá Omidayê Àṣe Obalayó, em junho. 


“Este evento é parte de uma jornada de aprendizado sobre a reparação da escravidão. Precisamos mergulhar no passado do Brasil, e retirar personagens, lendas, prédios e histórias esquecidas e apagadas pela época escravocrata”, considerou Adami.



“Não há nenhum debate mais importante no país do que falar sobre a reparação da escravidão, pois é o que irá diminuir o fosso racial existente na sociedade. A maioria das pessoas pobres, são os cidadãos pretos e pardos. Precisamos reconhecê-los, mostrar de onde vieram, da África. Hoje inauguramos este eixo temático de mulheres negras na reparação da escravidão, dando o molde e o caminho para ser replicado para os outros estados brasileiros”.

Monalyza Alves ressaltou o impacto de tratar deste tema para as novas gerações deterem conhecimento quanto a história da escravidão no país.

“Precisamos criar uma nova geração que tenha consciência da memória. Somos um país que se esquece do ontem com muita facilidade. Acredito que podemos construir e projetar um futuro que ainda olha para o passado. Esse é o papel do serviço público”, ponderou a subsecretária-executiva da SPM-Rio.

Para a representante do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Fabiana Thomaz, as celebrações às mulheres pretas também devem relembrar o passado de lutas travadas por elas no período escravocrata.

“Para celebrarmos as mulheres negras neste país, temos que falar ao que elas foram submetidas em algum momento. Quando falamos de Dandara e Rosa Cabinda, por exemplo, falamos de mulheres que viveram no período escravocrata e de certa forma, nos faz lembrar, também, da luta dessas mulheres em situações de opressão e desumanização”, ponderou Fabiana. 

“Devemos ver a escravidão pelo olhar de quem a sofreu e relembrar da violência perpetrada pelo próprio Estado. Quando pensamos em reconhecimento na sociedade, é reconhecer o passado apagado. Portanto, a reparação é o coração da justiça social, e que requer uma compensação de toda essa violência”.

A segunda mesa do encontro foi integrada pela desembargadora do TJRJ Adriana Ramos de Mello; pela secretária municipal de Políticas e Promoção da Mulher na Prefeitura do Rio de Janeiro, Joyce Trindade; pela presidente da  Academia Carioca de Direito (ACD), Rita Cortez; pela atriz e historiadora, Jana Guinond; pela defensora pública estadual, Lucia Helena Oliveira; pela advogada e integrante da Cevenb da Seccional, Marinete Silva, mãe de Marielle Franco - vereadora assassinada em março de 2018; pelas colaboradoras da Cevenb da Seccional, Lenilda Campos e Shirlene Mendes, além de outras convidadas.


“A Secretaria de Mulheres tem trabalhado no sentido de concretizar a palavra interseccionalidade. Construir políticas públicas para as mulheres é desafiador, pois o Brasil pouco reconheceu nossos corpos ao longo da história, e, quando se trata de mulheres negras, é um processo de reparação”, destacou a secretária municipal da Mulher, Joyce Trindade.



“É preciso reforçar a pauta de que sem as mulheres participando efetivamente, não há futuro. Precisamos colocar raça, gênero e classe na ordem do dia quando fazemos políticas públicas. Sou feliz em poder representar e ser a primeira secretária jovem e mulher negra no município, ”, disse.

A integrante da Comissão Estadual da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da Seccional Marinete Silva frisou que os espaços de poder e decisão "devem ser ocupados por mulheres pretas em todo sistema de Justiça".

“Este julho é um recomeço para repararmos não só a escravidão, mas repararmos as situações de violência no mundo. Há um recorte de mulheres negras que ainda sofrem com o apagamento e preconceito”, declarou a advogada.


“Ninguém gostaria de estar no nosso lugar, como no meu caso, após perder uma filha como a Marielle do jeito que foi. Avançamos, mas ainda temos um longo caminho a percorrer e continuaremos lutando para ocupar os espaços em todo país. Reparação é trazer as mulheres pretas para o centro da discussão, com pluralidade e todo o nosso escopo. O julho acaba com muita honra e com união para demarcarmos o território que é nosso”.



A atuação de mulheres pretas no diálogo sobre a reparação da escravidão, direitos humanos e igualdade racial na sociedade foram os temas contidos nas falas das demais palestrantes, como conselheiras seccionais, colaboradoras e integrantes da Cevenb da OABRJ, de dirigentes femininas das subseções de Belford Roxo, Niterói, Bangu, Madureira-Jacarepaguá, Méier, Duque de Caxias, Queimados, Barra da Tijuca, Pavuna, Ilha do Governador e São João de Meriti, além de outras instituições, como o Movimento Negro Unificado, representado pela coordenadora nacional, dona Leninha.

Veja a transmissão completa do evento no canal da OABRJ no YouTube.

Abrir WhatsApp