22/01/2009 - 16:06

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Magistrados fazem lobby contra lei que criminaliza violação de prerrogativas

Magistrados fazem lobby contra lei que criminaliza violação de prerrogativas



Do Jornal do Commercio


22/01/2009 - Entidades representativas da magistratura prometem intensificar o lobby contra o projeto de lei que criminaliza a violação de prerrogativas dos advogados. A proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados em maio de 2008. No Senado, recebeu o número 83/08 e foi submetida à relatoria de Demóstenes Torres (DEM - GO). A expectativa é de que matéria comece a tramitar realmente após o recesso legislativo. O projeto de lei altera o Estatuto da Advocacia para estabelecer pena de seis meses a dois anos para quem desrespeitar as garantias da advocacia.

Pelo projeto, o conselho seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, por intermédio de seus presidentes, poderá solicitar ao delegado de polícia competente a abertura de inquérito policial por violação aos direitos e às prerrogativas do advogado. Também a OAB, por intermédio de seus conselhos seccionais poderá requerer a sua admissão como assistente do Ministério Público nas ações penais instauradas.

O secretário geral da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Jurandi Borges Pinheiro, afirmou que a entidade é contra a proposta. "Entendemos que o projeto limita a independência dos juízes, fazendo com que fique na mão do advogado com o receio de sofrer um processo. Além disso, a contrapartida não existe em relação à violação da prerrogativa do magistrado", disse.

De acordo com Pinheiro, a Ajufe não será a única entidade a comprar briga contra o projeto. Entidades como a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) já manifestaram posição contrária à proposta. O argumento dessas instituições é de que o tipo penal criado pela proposição é muito aberto e pode dar margens a subjetivismo.

"Violação de prerrogativa de advogado é um tipo penal muito aberto. O que é violar prerrogativas? É o que o advogado acha?", argumentou o secretário geral da Ajufe, lembrando que as violações são exceções e que os advogados dispõem hoje de mecanismos para combatê-las. "Se for uma violação no processo, o advogado pode recorrer no processo mesmo. Se, eventualmente, ocorrer fora da ação - por exemplo, o juiz bate boca com o advogado - há as representações que podem ser feitas nas corregedorias de Justiça. Não é criminalizando que vamos resolver o problema. Pelo contrário, isso cria acirramento entre as categorias", disse.

O presidente da Seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Flávio Borges D'Urso, discorda. De acordo com ele, não existe sanção prevista para quem viola as prerrogativas dos advogados. Ele lembrou que apenas a Lei de Abuso de Autoridade poderia contemplar esse tipo de situação. "Mas não há um caso de autoridade processada com base nessa norma", garantiu.

 

Segundo afirmou, as violações mais comuns são as que impedem os advogados de consultarem os autos ou de serem recebidos pelos magistrados. Esse projeto é importante, mas não porque põe a autoridade na cadeia. "É que o simples fato de uma autoridade ser processada por violar uma prerrogativa é extremamente didático. Não estamos falando em privilégio, mas em direitos dos clientes. Ao ter o direito de falar com o juiz, o advogado o faz em nome do cliente. Agora, quando o juiz não recebe o advogado, quando o advogado não tem acesso aos autos do inquérito ou do processo, isso é violação das prerrogativas do advogado no interesse do cliente", ressaltou.

Em relação à crítica de que o projeto de lei cria um tipo penal subjetivo, D'Urso argumentou que as prerrogativas da advocacia estão previstas no estatuto da categoria. "A maioria das autoridades respeitam as prerrogativas e não criam objeção ao projeto. Uma minoria, no entanto, desrespeita. Daí essas resistências. Vejo isso com naturalidade, porque as críticas partem daqueles que poderão ser alvo de imputação criminal. A maioria dos juízes e dos delegados respeita os advogados", afirmou.

Os advogados querem a aprovação do projeto. Para David Rechulski, especialista em Direito Penal Empresarial e sócio do escritório Rechulski e Ferraro Advogados, o projeto é necessário. "De fato, é preciso que a violação das prerrogativas fundamentais inerentes ao exercício ético-profissional dos advogados seja criminalizada. Infelizmente, freios e garantias efetivas só são possíveis de ser alcançados via tipificação de condutas. Embora existam o Estatuto da Advocacia e da OAB, estas são usualmente desconsideradas. Basta constatar a quantidade de atos de desagravo que são procedidos pela OAB em todo o País, decorrentes da violação das prerrogativas profissionais dos advogados", afirmou.

Na avaliação do advogado, o projeto não provocará conflitos entre juízes e advogados ou desequilíbrio entre as diversas categorias do sistema jurídico. Pelo contrário. "A proposta consolida a garantia de equidade, pois é dela que se edificam os pilares que sustentam o Estado Democrático de Direito. A grande verdade é que vínhamos, gradativamente, mergulhando num Estado policial, onde os fins almejados eram suficientes para justificar os meios e atropelar direitos, sejam eles individuais ou profissionais e, após muitos excessos e um despertar que, embora tardio, ainda se operou a tempo de evitar o pior, toda vez que se contempla alguma medida ou lei para fazer cessar os abusos arvorados de defesa oblíqua da sociedade, ocorre ainda um surto oposicionista, pois mudanças sempre trazem natural desconforto", explicou.

Cristiano Zanon Martins, sócio do escritório Teixeira, Martins & Advogados, explicou que a maior parte dos advogados já enfrentou situações de absoluto desrespeito por parte de juízes, promotores, delegados de polícia ou servidores públicos em geral. Atualmente a OAB dispõe inclusive de um ranking de agentes e servidores públicos que não observam as prerrogativas dos advogados. "É crescente, ainda, o número de representações nos órgãos corregedores", disse o advogado, acrescentando: "O problema é que, a despeito do caráter ilegal por parte de agentes e servidores públicos, esse comportamento continua se repetindo. Isso se deve, fundamentalmente, à ausência de punição eficaz".

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