O direito à ampla defesa passa por um significativo momento que impacta diretamente o exercício profissional da advocacia. O extenso - e contínuo - volume nos processos criminais abarrota o Poder Judiciário. Amparar e legitimar a cidadania é o principal dever da advocacia criminalista, que, segundo referências desta área do Direito, empenha-se diuturnamente para manter esta garantia social frente a este cenário cada vez mais difícil de atuação. O painel da área penalista na XII Conferência Estadual da Advocacia - apelidada pelo advogado e professor Felipe Novaes como ‘maxiconferência’-, realizada nesta quarta-feira, dia 23, num repleto pavilhão da Marina da Glória, contou, também, com o advogado e também professor Alexandre Dumans. A discussão potente dos convidados foi mediada pelo presidente da Comissão de Processo Penal da OABRJ, Diogo Tebet. Dumans considera os maxiprocessos “imputações em uma extensa e complexa análise probatória”. O especialista citou os processos com longas jornadas de defesa e grande repercussão, como a Lava-Jato, o Mensalão e as Fake News. “Falar dos mega processos é delicado e atual. A definição mais singela seria processos enormes, mas isso não basta para nomear essa prática. O conceito estabelecido destaca um gigantismo processual, o uso da mídia, e o rompimento com a legalidade penal”, analisou o advogado. O cenário de guerra jurídica, a chamada lawfare, norteou a fala dos palestrantes. Dumans julgou a utilização das normas penais como instrumento usado numa espécie de ‘vale tudo’ do Judiciário. “A norma jurídica é um instrumento pela busca da verdade, e quando se empresta o espírito bélico, ela passa a ser um instrumento de guerra, destruição e aniquilamento do inimigo. Lawfare é uma coisa nefasta que impregna o nosso Judiciário com processos monstruosos e sem fim, cujo único objetivo é perseguir o opositor”. Para Dumans, o artigo 41 do Código de Processo Penal foi “mitigado pela Suprema Corte, que já admitiu os delitos coletivos prejudicando a defesa”. “O STF denominou os maxiprocessos como ‘estado de coisa’ sem solução. Acho que devemos ser reticentes, combativos e buscar as nulidades que existirem nesses mega processos e lutar para que eles não continuem existindo. O direito da ampla defesa é, em todo momento, vilipendiado e sucateado nesses processos, e os advogados se transformam em verdadeiros inimigos da Justiça, e não os protagonistas dessa aventura judiciária. Querer nos tirar desta posição é inaceitável”. A necessária força da comunidade jurídica foi relembrada por Diogo Tebet. Para ele, a conferência une advogados e advogadas em uma procura por conhecimento e qualificação dos temas centrais que moldam a atividade profissional da classe. “Este evento representa a força de toda a advocacia em nosso estado. Os colegas da área criminal precisam da luz para entender e participar desse debate. Somos a última barreira entre o estatal e o cidadão. O exercício da advocacia criminal exige o respeito às garantias constitucionais e o direito à defesa, que visam equilibrar a balança entre o acusador”, disse.O presidente da Comissão de Direito Penal da OABRJ expôs casos em que denúncias nas peças acusatórias contam com mais de 850 páginas em julgamento de 62 acusados. Tebet ressalta que o Brasil enfrenta esse problema em uma sucessiva tentativa de diminuição do exercício advocatício. “Um dos mais perversos efeitos dos maxiprocessos que temos vivido nas últimas décadas é a criminalização da advocacia criminal” declarou o professor Felipe Novaes. “Não podemos admitir que confundam a defesa criminal como uma defesa do crime. Defendemos um processo em que se respeita as garantias para pena justa. A pressão midiática sobre os operadores de Direito nos obriga a ter uma ‘visão de túnel’, que nos revela um determinado objetivo para a atuação no processo”, manifestou Novaes, ao reforçar o papel do Poder Judiciário e do Ministério Público nesse escopo de pressão por posicionamento na mídia. “Se formos pensar em grandes operações, como a mais famosa delas, a Lava Jato, temos a montagem dos elementos, que serviram para convencer o juiz na construção probatória. Nessa inversão de papéis, há uma violação clara do modelo de legalidade penal de fato. Aquele que é réu no processo passa a ser visto como inimigo da própria sociedade”. Os extensos processos não cabem só aos julgamentos dos tribunais brasileiros. Felipe Novaes recorda o andamento processual do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O litígio corre na corte estadunidense com mais de 11 milhões de páginas acusatórias. Os advogados do caso pediram adiamento para 2026, com a justificativa de tempo viável para análise dos documentos. Ao concluir o painel, os palestrantes profiram votos de um futuro promissor para a advocacia, especialmente a criminal. Novaes destaca que “os advogados não devem ceder nem um milímetro da ética que esta atuação exige”. O advogado Alexandre Dumans fortaleceu o pedido, e declarou: “O nosso protagonismo no processo penal não pode ser esquecido ou deixado de lado. Sem a advocacia, essa mágica na distribuição de Justiça não existe. Sem o advogado e a advogada criminalista, o que existe é a barbárie em nosso sistema”.