23/08/2008 - 16:06

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Prática do Quinto Constitucional vira argumento para nepotismo

Prática do Quinto Constitucional vira argumento para nepotismo


Do Jornal do Brasil

23/08/2008 - Uma corrente de magistrados considera que a raiz do tráfico de influência política e de nepotismo no Judiciário, característica das operações do advogado Marlan de Moraes Marino Júnior, no Rio de Janeiro, é legitimada pelo Artigo 94 da Constituição (que determina o chamado Quinto Constitucional).

A família Moraes Marinho, com dois desembargadores, Marlan e Lindolpho, um juiz, Marcelo, e um advogado, Marlan Jr., é um exemplo de cenário criticado. O desembargador aposentado Marlan de Moraes Marinho foi lembrado em recente entrevista ao JB, publicada dia 27 de julho, pelo deputado estadual e candidato a prefeito do Rio, Paulo Ramos (PDT).

Na última eleição municipal, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) anulou a eleição em Campos, absolveu o ex-governador Anthony Garotinho e Rosinha (de um processo por compra de votos que os tornariam inelegíveis), num voto de minerva (desempate, decidido pelo ministro Marlan de Moraes Marinho, então presidente do TRE). Em seguida, o irmão dele, Lindolpho de Morais Marinho (com a diferença do i no Morais), foi nomeado desembargador do TJ-RJ, escolhido por Rosinha Garotinho, conforme a legislação do Quinto Constitucional.

Diz a lei que "um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do Ministério Público, com mais de 10 anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes. Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos 20 dias subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação".

A determinação contaminaria o Poder Judiciário com indicações subjetivas, incluindo membros de famílias tradicionais de advogados.

Um projeto de emenda constitucional de autoria do deputado Neilton Mulim (PR-RJ), que prevê o fim do Quinto está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, aguardando o parecer do relator Marcelo Itagiba (PMDB-RJ).


Um quinto dos lugares dos Tribunais é composto por membros do MP

Mulim utiliza a argumentação de Arthur Pinheiro Chaves, juiz federal substituto da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará e delegado da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), que publicou artigo sobre o assunto no jornal O Liberal.

No artigo, está que "os critérios de escolha estabelecidos pelo texto Constitucional, consistentes 'no notório saber e na reputação ilibada', podem redundar em personalismo indesejável". O magistrado considera o processo de indicação e nomeação uma "verdadeira via crúcis política, exercício que se mostra, no mínimo, desconfortável, ante a necessária postura independente da futura função".

Ele acrescenta ainda que "o 'quinto constitucional' ou 'acesso lateral' ao Poder Judiciário é sistema que remonta ao Estado Novo da década de 30, estabelecido por Getúlio Vargas, mantido até a Constituição atual no art. 94. A existência do quinto pode enfraquecer a atuação profícua dos membros do Ministério Público e da advocacia, na medida em que a perspectiva próxima de acesso a um tribunal pode vir a arrefecer um espírito mais combativo no exercício independente daquelas funções, postura essencial ao ideal funcionamento da Justiça".

O juiz federal Arthur Pinheiro Chaves escreve ainda que, como qualquer trabalho humano, o exercício da magistratura não prescinde de especialização. "O exercício da judicatura resulta da prática cotidiana, diuturna e permanente do árduo ato de decidir, da realização de audiências, do recebimento de partes e procuradores, disso resultando o amoldamento do espírito de imparcialidade, essencial ao magistrado. O juiz oriundo do quinto, ao contrário, teve, no mínimo, em face de exigência constitucional, 10 anos de necessária militância parcial, seja no Ministério Público, seja na advocacia, não estando habituado às vicissitudes do ato de decidir, não se vislumbrando como, de uma ora para outra, pelo simples fato de passar a vestir uma toga, irá se despir da postura parcial de postulante para compreender, com a profundidade necessária, a postura imparcial do magistrado".

O quinto serve, ainda, como fator de desestímulo aos magistrados de carreira, segundo Pinheiro Chaves. "O argumento corrente de que a figura do quinto serve para o arejamento da carreira e seu controle externo é vazio de conteúdo. O referido arejamento se dá com a exigência constitucional, trazida com a reforma do Judiciário, de que o candidato ao cargo de juiz possua, no mínimo, três anos de atividade jurídica, tendo o magistrado, portanto, necessariamente a visão do advogado militante ao ingressar na carreira. O controle externo, após a Emenda Constitucional nº 45, passou a ser realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, órgão em cuja composição se incluem advogados e membros do Ministério Público", argumenta o juiz federal substituto da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará e delegado da Ajufe, Arthur Pinheiro Chaves.

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