14/04/2008 - 16:06

COMPARTILHE

Projeto que unifica as leis trabalhistas é criticado

Projeto que unifica as leis trabalhistas é criticado

 

 

Do Jornal do Commercio

 

14/04/2008 - Elaborado pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), o projeto de lei que visa à unificação da legislação trabalhista tem encontrado resistência entre advogados e magistrados do Trabalho por ressuscitar normas que foram sepultadas pelos tribunais. A mais acirrada crítica é da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que chegou a sugerir ao autor da proposição a criação de um grupo de assessoramento que pudesse contribuir para o aperfeiçoamento do texto. O parlamentar admitiu falhas e disse que trabalhará para efetuar correções, mas reclamou das críticas. Claro que houve erros no projeto e os estamos corrigindo. Então, essas críticas não procedem, disse.

 

A proposição, que tramita com o número 1.987/2007, foi levada à Câmara dos Deputados em setembro do ano passado. No dia 3 deste mês, voltou a ser debatida durante o Seminário sobre a Consolidação das Leis Materiais Trabalhistas, realizado pelo deputado e do qual participaram representantes do Judiciário, do Ministério Público e da advocacia. O projeto é resultado do trabalho promovido por um grupo, coordenado por Vaccarezza, que foi instituído justamente para promover a consolidação dos diversos conjuntos normativos em vigor no País, ou porque eles conflitam entre si e a Constituição ou porque caíram em desuso.

 

Na avaliação de especialistas, a proposta acerca da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não pode ser aprovada tal como está. O projeto é muito ruim. Ele apenas reúne todas as leis que têm a palavra trabalho na ementa, criticou Gabriel Napoleão Velloso Filho, desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região e coordenador da Comissão Legislativa da Anamatra. Segundo afirmou, a proposição retrocede, porque traz de volta dispositivos incompatíveis com a Constituição de 1988.

 

Segundo o desembargador, as normas contrárias à Carta Magna e que são anteriores à edição dela não podem ser formalmente declaradas inconstitucionais. Nesse caso, elas são declaradas incompatíveis com a Constituição. Assim, os juízes podem rejeitá-las sempre que forem invocadas. Mas se elas forem aprovadas no projeto do deputado, vamos voltar a discuti-las, explicou Velloso Filho, ressaltado as conseqüências nocivas disso. Segundo afirmou, a maior parte dos conjuntos em desuso diz respeito a um período autoritário da história brasileira, portanto não condizem com o Estado Democrático de Direito assegurado na atual Lei Maior.

 

Exemplo disso é a Lei 4.923, de 1965, que autorizava o juiz a reduzir o salário do trabalhador se a conjuntura econômica assim o exigisse, independentemente da posição do sindicato da categoria. Segundo Velloso Filho, a norma, que foi editada pelos militares com o objetivo de enfraquecer os sindicatos, foi ressuscitada no projeto de consolidação da legislação trabalhista. Se o projeto for aprovado, o tema voltará à discussão. E no Judiciário é quase impossível obter-se unanimidade. Então, seguimentos neo-liberais podem entender que os sindicatos têm que ser razoáveis. Vão se passar anos até que essa norma seja declarada inconstitucional, afirmou.

 

Outro ponto criticado pelo desembargador é o que possibilita o Executivo intervir nos sindicatos. Na época da Constituição de 1969, os sindicatos exerciam papel delegado, o Estado podia intervir e até destituir dirigentes. Hoje os sindicatos são livres. O projeto, entretanto, ressuscita aquela norma, explicou.

 

 

Preocupação

 

O ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Lélio Bentes Correia também vê com preocupação a proposta apresentada pelo deputado. De acordo com ele, a idéia de se consolidar a legislação brasileira é boa. Segundo o ministro Gilmar Mendes (do Supremo Tribunal Federal) existem mais de 175 mil leis e atos normativos em vigor. Imagine para o cidadão comum se orientar nesse emaranhado, disse o ministro, destacando que muitos conflitos surgem dessa proliferação de leis. Ele destacou, no entanto, a importância desse trabalho ser desenvolvido com cuidado.

 

Não se trata de um ato de copiar e colar as normas em um documento. É preciso harmonizá-las. No momento que você vai compatibilizar uma lei de 1943 e outra de 1997 surgem áreas cinzentas. Corre-se o risco de ocorrer alterações no conteúdo, o que é vedado pela lei complementar que trata sobre como a legislação brasileira deve ser consolidada, afirmou. Nesse sentido, o ministro vê a proposta apresentada como um primeiro passo. Não encaro esse projeto senão como um esboço inicial do que poderá vir a ser a consolidação da legislação trabalhista, explicou.

 

Por essa razão, o ministro destaca a importância de esse trabalho ser desenvolvido com uma ampla participação da sociedade - desde os operadores do Direito até empregadores e empregados. É que não faltam exemplos de normas incompatíveis que podem voltar à tona se o projeto for aprovado tal como foi apresentado. É o caso do artigo 277 da proposição. O dispositivo permite ao empregado e ao empregador disporem livremente sobre aquilo que não for contrário às leis do Trabalho e às normas coletivas aplicadas à categoria.

 

Não encontro nesse projeto, porém, o mesmo dispositivo da CLT que trata da vedação das alterações contratuais que resultarem em prejuízo ao trabalhador, ainda que estabelecidas de forma consensual. Na CLT hoje o critério é: tudo que estiver assegurado ao trabalhador no contrato pode ser alterado se não trouxer prejuízos a ele. O projeto, então, muda o sentido. A leitura sugere que, se a lei não for expressa, pode se negociar livremente, criticou Lélio Bentes. O deputado e a equipe dele procuraram extrair dos textos legais os dispositivos sobre a mesma matéria, no intuito de fazer uma só lei. Muita coisa, no entanto, ficou desconexa, disse ainda o ministro.

 

O projeto recebeu críticas também da advocacia. O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, chegou a afirmar que as alterações acabam por fragilizar a estrutura sindical, minimizar a importância da negociação coletiva e trazer à atualidade normas que já tinham sido revogadas. Temos que avançar, sim, na reformulação da CLT, porque o Direito muda e é preciso evoluir, mas não para manter as estruturas sindicais arcaicas que amarravam o movimento sindical no Brasil, afirmou o advogado.

 

 

Contestação

 

O deputado Cândido Vaccarezza contesta as críticas. Na CLT não tem como reviver coisas que são passadas, ou colocar direitos novos. Por exemplo, eu sou defensor das 40 horas semanais, mas não posso colocá-las na CLT porque esse é um novo conceito jurídico. Então, não posso nem tirar nem pôr coisas novas. Essa crítica não tem procedência, argumentou. De acordo com o parlamentar, no Brasil 175 mil leis estão em vigor. Em relação ao Trabalho, mais de 200 leis foram aprovadas desde que a CLT foi outorgada, em 1943. Atualmente muitas questões precisam ser sanadas com base nos códigos Penal e Civil.

 

Se um trabalhador ler a CLT, não saberá o que é direito, nem o que é dever. O que vamos fazer? Vamos levantar tudo que o que é legal e simplificar. Existe um grupo que está trabalhando nessa questão, afirmou.

Abrir WhatsApp