25/11/2022 - 15:22 | última atualização em 29/11/2022 - 13:23

COMPARTILHE

Sede da OABRJ ganha galeria de baluartes da advocacia preta

'Maior ato de antirracismo que já vi dentro da Seccional', diz a diretora de Igualdade Racial da casa, Ivone Caetano

Felipe Benjamin

Um tributo à advocacia preta do estado reuniu lideranças no Plenário Evandro Lins e Silva, na sede da OABRJ, na noite de quarta-feira, dia 23, e incluiu a inauguração de uma galeria de fotos no 4º andar da sede da Seccional para homenagear baluartes negros do universo jurídico nacional. Os primeiros retratos são do patrono da abolição da escravidão do Brasil, Luis Gama; do fundador do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Francisco Gê Acaiaba de Montezuma; da primeira advogada negra a presidir a OAB Mulher RJ, Zélia Welman; do ex-vice-diretor de Igualdade Racial da OABRJ Nélson Joaquim e da advogada, sindicalista e política Almerinda Farias Gama.

O evento teve a condução dos advogados Márcia Emerentina e Daniel Alves e celebrou a Década Internacional dos Afrodescendentes, instituída pela resolução 68/237 da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, que tem como objetivo promover o reconhecimento, a justiça e o desenvolvimento da população afrodescendente no mundo. 

"Hoje é um dia histórico, no qual esta casa, que é a casa da democracia e da defesa dos direitos sociais, faz uma das mais justas homenagens que este plenário já viu, à advocacia preta e brasileira", afirmou a vice-presidente da OABRJ, Ana Tereza Basilio.

"Estamos aqui inspirados pela resolução da ONU, mas, também, para dar exemplo a todo o país que deve prestigiar sua importantíssima advocacia preta. A primeira defesa tida como atividade advocatícia no Brasil foi feita por Esperança Garcia, uma mulher negra. A galeria está apenas começando hoje, e iremos completar aquela parede inteira, mas já demos o primeiro passo. É um imenso orgulho fazer parte desta gestão e deste evento".

Também estiveram presentes a diretora de Igualdade Racial da Seccional, Ivone Ferreira Caetano; a corregedora do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OABRJ e presidente da Advocacia Preta Carioca (APC), Ângela Borges Kimbangu; o presidente da Comissão Estadual da Verdade da Escravidão Negra no Brasil (Cevenb) da OABRJ, Humberto Adami; a diretora-executiva da APC, Raquel do Carmo; o coordenador de Prerrogativas Pretas da Seccional, Alberto Vasconcellos; o advogado e professor de Direito Leonardo Santos e o cônsul de Angola no Brasil, Sá Miranda.

"Quando um negro tem uma mão que o puxe, ele é capaz de fazer tudo", afirmou Ivone.

"Se os negros se derem as mãos, a vitória é muito mais forte. E é o que nos faltava até pouco tempo, porque antes não havia ninguém mais preconceituoso contra os negros do que o próprio negro. Não é a primeira vez que vejo este auditório cheio de negros, mas sabemos que isso começou há pouco tempo. Somente no século XXI conseguimos acordar, porque, antes, até as condições de estudo haviam sido tiradas de nós. Nossa história só passou a ser contada com sinceridade há pouco tempo, e isso deixou uma enorme quantidade de nomes invisibilizados. Este é o maior ato de antirracismo que já vi dentro da OABRJ".

Presidente da Advocacia Preta Carioca - Umoja (APC), Angela Kimbangu celebrou os feitos da associação em sua breve existência e destacou o sentimento de união entre a população preta. "Quero agradecer à OABRJ por ter entendido a importância deste evento", disse.

"'Umoja' é um princípio adotado pela Associação da Advocacia Preta Carioca. E o que é 'umoja'? É a unidade entre todas pessoas pretas, estando na APC ou não. A parede talvez seja um dos maiores projetos da associação, porém temos outros, como em breve, a habilitação como amicus curiae na ADPF das Favelas. Essa parede exalta não apenas juristas pretos, mas a diáspora africana dentro e fora do Brasil. Todos os pretos do mundo. Os vivos, os mortos e os que vêm. Nós passaremos e a parede permanecerá", afirmou Kimbangu.

Vice-presidente da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil no Conselho Federal da OABRJ, Humberto Adami destacou a importância de levantar incessantemente o tema da escravidão na sociedade.

"Toda a construção da advocacia preta nas seccionais e no Conselho Federal é uma briga que vem desde 1999, quando, pela primeira vez, o assunto discriminação racial entrou na pauta de uma conferência dos advogados. Temos que fazer essa autocrítica. A OAB, que sempre se meteu em todos os temas desde a Constituição de 1988, só em 1999 abordou o tema negro em um de seus eventos", disse Adami.

"Gostaria de homenagear nossa co-irmã, a Associação Nacional da Advocacia Negra (Anan) afirmar que hoje estamos inaugurando uma parede especial para as pessoas pretas, mas precisamos ter pessoas pretas na galeria de fotos de presidentes da Ordem. A Comissão da Verdade trata da pauta mais importante do Brasil: a reparação da escravidão. Não podemos falar desse tema só em novembro ou no 13 de maio. Temos que falar todos os 365 dias do ano".

O evento contou ainda com uma apresentação musical da advogada Rejane Passos do Nascimento, acompanhada por Leo Batuke e integrantes da Escola Atabaque Nosso Ritmo. 

"Esta homenagem resulta da luta iniciada há algum tempo, e aqui está o resultado: o espaço da galeria jamais será o mesmo", afirmou o cônsul Sá Miranda.

"As caras negras expostas na galeria mostram que parte da luta - que sempre vem de fora para dentro - foi bem-sucedida. A luta não termina com esta homenagem. Ela deve continuar com perseverança. Na maioria dos casos, quando o afrobrasileiro precisa de assistência jurídica recorre a um advogado negro. Eu me pergunto se a defesa de um negro por outro negro tem o mesmo resultado que a defesa feita por um branco. Não sei, e talvez a resposta não saia daqui, mas a luta continua e a vitória é certa".

Abrir WhatsApp