18/05/2009 - 16:06

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Segundo AMB, penas alternativas viraram fonte de recursos

Segundo AMB, penas alternativas viraram fonte de recursos

 

 

Do jornal O Globo

 

18/05/2009 - Previstas no Código Penal, mas ainda carecendo de regulamentação por parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ou dos tribunais superiores, as penas alternativas geram distorções que não levam à reeducação do réu preconizada pela lei. A denúncia é do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares.

 

Entre os abusos, cita as prestações pecuniárias, em que os apenados são obrigados a comprar material de expediente para os fóruns, sobretudo em cidades mais pobres no interior.

 

"Realmente, já aconteceu, entre 2000 e 2001, quando apliquei penas que revertiam para a compra de materiais, como papel, cartuchos, tinta, do fórum e de outras instituições", confirma Maria Eliane Cabral, juíza do município de Serra Talhada, a 418 quilômetros de Recife.

 

"Fiz, faço e farei. Não havia material para Justiça" Segundo ela, o assunto foi discutido num encontro de juízes e desembargadores no município sertanejo de Salgueiro: "Aleguei dificuldades e disse: fiz, faço e farei. Não havia material para a Justiça funcionar".

 

A prática não chega a ser vetada no Código Penal. Não é ilegal.

 

Mas Mozart a questiona: "Como juiz, não posso aplicar uma pena e ser o beneficiário. Não se pode admitir que a Justiça necessite de alguém que cometeu um delito para que possa funcionar. Pode não existir impedimento legal para que isso aconteça, mas do ponto de vista ético é muito grave".

 

Na cidade de Bonito, região do Agreste a 137 quilômetros de Recife, o juiz Severino Coutinho da Silva diz que alguns apenados recebem penas pecuniárias quando têm maior poder aquisitivo.

 

Os recursos, afirma, não são revertidos para a Justiça, mas para a comunidade, que está ganhando uma escola de alfabetização para adultos. Ele confirma, porém, que alguns prestam serviços no próprio fórum: "Atuam fazendo capinação, pintura do prédio, atendimento ao público. Há os que colaboram na burocracia, mas não manuseiam os processos".

 

Severino enfatiza que, embora não estabeleça penas pecuniárias em benefício da comarca, nada impede que ele o faça. Para o presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Jones Figueiredo, o tema é polêmico: "O CNJ está tentando uniformizar os procedimentos para aplicação de penas alternativas".

 

Antes havia a cultura de condenar acusados a pagar cestas básicas, mas agora a prioridade é para prestação de serviços comunitários.

 

Pelo menos é o que recomendamos. Mas é claro que não há sentido lógico nem ético aplicar pena pecuniária em favor da própria instituição.

 

Juiz mandou réu ir à missa, ler a Bíblia e lavar a igreja Em Pernambuco já houve casos que viraram chacota. Pioneiro no país no uso das penas alternativas, o então juiz da 2ª Vara de Delitos Contra o Patrimônio, Caubi Arraes, ficou famoso ao obrigar um réu a assistir diariamente à missa, rezar, ler o Evangelho e lavar a igreja.

 

Hoje na 9ª Vara Criminal, o juiz não utiliza mais penas alternativas.

 

Elas são indicadas para crimes de menor potencial ofensivo.

 

Aplicam-se a infrações como pequenos furtos, apropriação indébita, estelionato, acidentes de trânsito, desacato, lesões corporais leves, ou delitos que rendam condenações de até quatro anos, desde que não haja violência ou grave ameaça.

 

Quando isso ocorre, Caubi envia o réu à Vepa (Vara de Execução das Penas Alternativas), criada em 2001 e que funciona nos 14 municípios da região metropolitana.

 

Ali, cerca de 3 mil pessoas acertam as contas com a Justiça sem ficar atrás das grades.

 

Segundo os folhetos da Vepa, "achar que a cadeia é o lugar mais indicado para o pequeno infrator é uma pena".

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