27/11/2008 - 16:06

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Venda de sentença faz ministro do STJ virar réu

Venda de sentença faz ministro do STJ virar réu

 

 

Do jornal O Globo

 

27/11/2008 - O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu ontem processo penal contra o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Medina, seu irmão, o advogado Virgílio Medina, o desembargador da segunda região do Tribunal Regional Federal José Eduardo Carreira Alvim, o juiz do Tribunal Regional do Trabalho de Campinas Ernesto Luz Pinto Dória e o procurador regional da República João Sérgio Leal Pereira. A partir de agora, Paulo Medina é réu e responderá a processo por corrupção passiva e prevaricação.

 

Virgílio responderá por corrupção passiva; Carreira Alvim, por corrupção e formação de quadrilha, crime de que também são acusados Dória e Pereira. O grupo é suspeito de participar de um esquema de venda de sentenças para contraventores donos de bingos e caça-níqueis no Rio de Janeiro. A maioria dos ministros do Supremo entendeu que havia indícios suficientes para aceitar a denúncia do Ministério Público Federal.

 

O MP queria ainda que Medina respondesse por formação de quadrilha, acusação rejeitada por cinco dos nove ministros que votaram. Joaquim Barbosa e Carlos Alberto Menezes Direito se declararam impedidos de julgar a denúncia e não participaram da votação.

 

A corte determinou ainda o afastamento dos magistrados acusados até o final do processo, como determina a Lei Orgânica da Magistratura - o procurador não é atingido pela medida. Paulo Medina já estava afastado, segundo seu advogado, desde a deflagração da Operação Hurricane, realizada pela Polícia Federal no ano passado. No entanto, ele continua recebendo salário do STJ.

 

 

Propina de R$ 1 milhão

 

A investigação da Polícia Federal que resultou na operação durou um ano e três meses. Entre escutas telefônicas e ambientais, foram registradas cerca de 40 mil horas de diálogos entre os envolvidos. O relator da denúncia no STF, ministro Cezar Peluso, votou pela aceitação de todas as acusações. Entre os delitos que Medina teria praticado, está a concessão de uma liminar devolvendo máquinas de jogo aos empresários de bingos. Para isso, ele teria recebido parte de uma propina de R$ 1 milhão. O relator lembrou que analisava apenas a validade da denúncia, e não o mérito das provas coletadas pela polícia.

 

"Há uma série de ações simultâneas que referem à ligação do acusado com membros da quadrilha. Há alguma verossimilhança, não prova, nos fatos narrados na denúncia? Eu diria que sim. Para eu não admitir, ignorando os fatos descritos e os elementos que suportam a denúncia, teria que imaginar que houve uma conspiração contra os denunciados para urdir contra eles a imputação de fatos absurdos. Por quê? A que título? O que teriam feito os acusados contra terceiros para que estes imputassem indícios contra eles? Eu não tenho elementos para responder", disse Peluso em seu voto.

 

Os ministros Carlos Ayres Britto, Ellen Gracie e Celso de Mello acompanharam o voto do relator integralmente. Ricardo Lewandowski e Eros Grau votaram por aceitar apenas corrupção passiva e prevaricação. Em seu voto, Lewandowski disse que, para se caracterizar formação de quadrilha, é preciso que o acusado atenda ao critério de permanência na quadrilha e que Medina, se participava do esquema, o fazia apenas de forma pontual.

 

"Salta à vista que, mesmo que Paulo Medina tenha cometido, em tese, o crime, não há como deduzir dos fatos que ele tenha se associado de forma permanente a uma suposta quadrilha de caça-níqueis", argumentou.

 

 

Advogado seria lobista

 

Carmen Lúcia aceitou somente a denúncia de crime de prevaricação, por Medina ter supostamente atrasado em nove meses a análise de um processo de um dos interessados, o delegado Edson Oliveira, com intenção de levar à prescrição do crime. Para o ministro Gilmar Mendes, apenas o crime de corrupção deveria ser julgado. O único a votar contra o julgamento das três acusações foi Marco Aurélio Mello. Ele rechaçou a acusação de prevaricação, lembrando aos colegas que um ministro de tribunal trabalha sob uma imensa carga de processos, o que causa atrasos. Como exemplo, citou que, em seu próprio gabinete, cerca de dez mil processos aguardam avaliação.

 

"Envolve-se ele, Paulo Medina, para atender aos pleitos do grupo, recebendo vantagem indevida? Qual o sinal de recebimento? Onde há indício mínimo dessa participação? Não se tem", disse Marco Aurélio, complementando que o único indício que denota a participação do ministro no caso é o sobrenome em comum com Virgílio Medina.

 

Segundo a denúncia do MP, o advogado era o lobista do grupo e fazia a ligação entre os empresários e os magistrados.

 

O advogado de Paulo Medina, Antônio Carlos Almeida Castro, afirmou, ao final da sessão, que seu cliente está muito doente e dificilmente voltará ao STJ. Mas disse estar certo de que o ministro, ao final do processo, poderá olhar seus acusadores de frente.

 

"Não há uma única gravação que o ligue à quadrilha. Todos foram unânimes em dizer que não há prova de culpabilidade", disse.

 

Paulo Medina escreveu ontem uma carta para o site Consultor Jurídico, na qual diz que é inocente e lembra ter 40 anos de magistratura. "O inquérito nada revela: indícios inexistentes, adminículo (elemento que pode ajudar a provar algo) probatório que nada traduz senão irresponsável ilação de meus acusadores - policiais federais e Ministério Público -, o que não basta como suporte a embasar a ânsia da acusação.

 

Sou inocente. Não se destroem reputações públicas e a privacidade de pessoas pela suspeita das paixões e do furor acusatório de vestais da moralidade, instaurando-se a ação penal", diz.

 

Se condenado, Paulo Medina receberá pena de dois a 12 anos de prisão por corrupção e de três meses a um ano por prevaricação.

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