03/08/2018 - 21:01

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Corte Interamericana de Direitos Humanos condena o Brasil a investigar ação do Exército no Araguaia

03/08/2018 - 21:01

Corte Interamericana de Direitos Humanos condena o Brasil a investigar ação do Exército no Araguaia

Corte Interamericana de Direitos Humanos condena o Brasil a investigar ação do Exército no Araguaia


O debate sobre a aplicação da Lei de Anistia para agentes públicos que praticaram tortura durante a ditadura está de volta às pautas jurídica e política do país. A razão é que, no fim do ano passado, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil a realizar a investigação penal da operação empreendida pelo Exército, entre 1972 e 1975, para pôr fim à Guerrilha do Araguaia. A sentença manda que o Estado esclareça, determine as responsabilidades penais e aplique as sanções previstas em lei pela "detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado" de 70 pessoas. A demanda contra o Brasil foi apresentada pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional e pela ONG Human Rights Watch/ Americas, em nome de parentes dos desaparecidos. A OAB/RJ participou como amicus curie.

A deliberação da Corte, embora tratando do caso Araguaia, é clara ao afirmar: "As disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos são incompatíveis com a Convenção Americana, carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, e tampouco podem ter igual ou semelhante impacto a respeito de outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil."

Ocorre que, em abril de 2010, o Supremo Tribunal Federal decidira, ao julgar ação proposta pela OAB, que os torturadores da ditadura também se beneficiaram da lei. A decisão, à qual a Ordem interpôs embargos declaratórios, provocou intensa reação de repúdio de entidades de defesa dos direitos humanos, representantes do Judiciário, do Legislativo e do próprio Executivo. Segundo ministros do Supremo de setores ligados à área militar, o entendimento da Corte acerca do tema não se sobrepõe à deliberação do STF.

Para o secretário nacional de Justiça e presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, o debate sobre a questão é saudável e constitui momento jurídico histórico. "Mesmo se não houvesse a decisão da Corte, o Supremo ainda deve respostas à sociedade brasileira. Parte destes questionamentos já está, inclusive, subscrita pela OAB. Portanto, a questão não está encerrada, do ponto de vista jurídico e regimental do STF, graças à Ordem. O julgamento inicial no STF acabou evadindo-se de importantes debates, como o da impunidade para crimes posteriores a 1979, como o do episódio RioCentro, ou crimes continuados, como o desaparecimento forçado", diz Abrão. "O professor Fábio Comparato tem observado, corretamente, que o STF não está acima do Brasil".

Na opinião do presidente da OAB/RJ, Wadih Damous, a decisão da Corte, no que diz respeito à anistia para torturadores, se sobrepõe à do Supremo. "O Brasil, como signatário da Convenção Americana, se obriga a respeitar e cumprir as decisões da Corte, ainda que haja entendimento contrário do STF. É necessário que essa questão seja retomada pelo Judiciário brasileiro", afirma Wadih.

O advogado Roberto Caldas, que atuou como juiz ad hoc na Corte, avalia que o momento é importante. "O diálogo que se estabelece é franco e fortalece a defesa dos direitos humanos, tema que está em primeiro plano na pauta do país". O Brasil, lembra ele, ratificou a Convenção Americana e reconheceu a jurisdição da Corte, cuja competência é peremptória. "A partir do momento em que o país adere à Convenção, livremente, está se obrigando a acatar suas decisões. É o que a comunidade jurídica internacional espera do Brasil".


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