03/08/2018 - 21:04

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A lei de compras coletivas do Estado do Rio de Janeiro

03/08/2018 - 21:04

A lei de compras coletivas do Estado do Rio de Janeiro

Walter Capanema*
 
O Estado do Rio de Janeiro é o primeiro do país a regular o sistema de compras coletivas pela internet. A Lei nº 6.161, de 9 de janeiro de 2012, estabelece requisitos e parâmetros para os contratos realizados no território fluminense.
Embora a lei não defina um conceito, pode-se dizer que esse sistema de compras é aquele em que há a interação de três partes: uma empresa (de compras coletivas) disponibiliza em seu site ofertas de produtos e serviços de terceiros (fornecedores) a consumidores que estejam previamente cadastrados.
A grande vantagem desse sistema reside no fato de que haja uma oferta a um número abrangente de consumidores permitindo que o valor final seja, em muitos casos, extremamente inferior àqueles praticados comumente no mercado, o que pode, contudo, mascarar uma violação à livre concorrência, pela prática de dumping.
   O sistema exige, como condição para a efetivação do contrato, que essa oferta seja aceita por um número mínimo de outros consumidores. Caso não haja a ocorrência desse fato, a lei exige que os valores eventualmente pagos sejam ressarcidos em até 72 horas (art. 4º).
E, caso essa condição seja adimplida, o consumidor poderá se valer de um voucher, fornecido pelo site de compras coletivas, para adquirir o produto ou serviço segundo as condições do contrato, que normalmente versam sobre a utilização em dias e horários específicos.
    A lei traz dúvida quanto a sua constitucionalidade formal, pois, ao definir parâmetros e requisitos para um contrato de comércio eletrônico, estaria, em princípio, tratando de matéria de Direito Comercial, que é de competência privativa da União (art. 22, I, CFRB). Ainda que se entenda que a lei trate de Direito do Consumidor, de competência concorrente entre União, os estados e Distrito Federal (art. 24, V, CFRB), falta aqui a norma geral sobre o tema, que deveria ser criada pela União Federal.
    O art. 3º traz os requisitos para a validade da oferta, que são algumas informações, como, por exemplo, a quantidade mínima de compradores para a efetivação do contrato (a que a lei utiliza, impropriamente, data venia, da expressão “liberação da oferta”); prazo mínimo de três meses para a utilização da oferta; e a informação com o endereço e o telefone da empresa responsável pela oferta.
Uma das questões mais tormentosas nesse tipo de contrato é que o consumidor não possui formas de averiguar se foi realmente atingido o número mínimo de compradores. A sua única informação, normalmente, é a que consta do site de compras coletivas, e não há como atestar a sua veracidade. Logo, se uma empresa de má-fé resolver cancelar uma oferta, alegando que esse número não foi alcançado, o consumidor não terá meios para verificar essa informação.
    Infelizmente, a lei não tratou de um tema que tem uma grande repercussão na prática: em muitos casos, os fornecedores tratam de forma desigual e preconceituosa aqueles consumidores que adquiriram o produto ou serviço por meio de um site de compras coletivos. São comuns os casos de humilhação, desprezo e de recebimento de um objeto aquém das expectativas.
    O art. 1º exige que as empresas de comércio coletivo mantenham, de forma gratuita, um serviço de atendimento telefônico. Logo, não basta apenas a comunicação via chat, normalmente oferecida dentro dos sites.
    Apesar de a lei definir os requisitos do contrato, não estabeleceu a sanção em caso de sua inobservância. Será caso de nulidade ou anulabilidade? A administração pública, por meio de seus órgãos fiscalizadores, poderá aplicar alguma sanção?
Em descumprimento do contrato pela falta de entrega do produto ou serviço, o art. 7º estabelece que será responsável a empresa de compras coletivas ou aquela que fez a oferta. A melhor interpretação para esse artigo, de acordo com as normas de proteção ao consumidor (arts. 18 e 19 da Lei nº 8.078/90), bem como a jurisprudência, é que se trata de uma responsabilidade solidária entre todas as empresas que participam desse contrato, não se tratando, assim, de uma alternância de responsabilidade.
     Por fim, embora seja salutar a existência de uma lei que regule uma relação jurídica de ampla aplicação prática na vida moderna, não estão previstos instrumentos para coibir e evitar abusos, que se repetem cotidianamente.

* Secretário-geral da Comissão de Direito e Tecnologia da OAB/RJ, coordenador da Comissão dos Crimes de Alta Tecnologia da OAB/SP e professor dos cursos de pós-graduação da Emerj, da Estácio de Sá e da Uerj
 

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