03/08/2018 - 21:02

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O acidente do trabalho no Brasil Uma tragédia diária

03/08/2018 - 21:02

O acidente do trabalho no Brasil Uma tragédia diária

O acidente do trabalho no Brasil Uma tragédia diária


Carlos Henrique de Carvalho e José Carlos Nunes *

Um homem se humilha Se castram seu sonhos Seu sonho é sua vida E vida é trabalho. E sem o seu trabalho O homem não tem honra E sem a sua honra Se morre, se mata.” Um homem também chora (Gonzaguinha)

Disse o poeta que “vida é trabalho”. Falava, com seu talento, da importância do trabalho na vida das pessoas, pois ali defendem sua honra e depositam a esperança de dias melhores. Com o trabalho, garantem sua subsistência e a de suas famílias, mas, também, lucro a seus empregadores e crescimento ao país.

Ocorre, porém, que, na busca desse sonho, um número impressionante de trabalhadores não completa sua jornada de trabalho, por conta de mutilações ou morte. Outros tantos são inviabilizados para a vida profissional por agressões paulatinas, mas contínuas, que, de forma insidiosa, causarão lesões graves a sua saúde. É preciso chamar a atenção da sociedade brasileira para essa tragédia.

O ano de 2011 começou com a notícia da morte de trabalhador da Rioluz, pela queda da grua que o sustentava. Mais recentemente, a mídia noticiou mortes nas obras do PAC e de operário de estaleiro em Angra dos Reis. Esses três eventos, malgrado tenham ganho as primeiras páginas dos jornais, não chegaram a causar indignação na sociedade brasileira. Explica-se: já se tornou corriqueiro, no Brasil, o acidente do trabalho com morte.

As estatísticas do acidente do trabalho no Brasil têm feições de guerra civil. Em 2009, segundo o Anuário Estatístico da Previdência Social, houve 2.496 mortes, ou uma morte a cada 3,5 horas. Obtiveram incapacidade permanente 13.047 trabalhadores. Conclui-se, portanto, que o país perdeu, em média, 43 trabalhadores por dia. Ainda de acordo com o Anuário, em 2009, 320.378 trabalhadores foram afastados de suas atividades por mais de 15 dias, percebendo auxílio-doença, o que representa a incrível média de 878 por dia.

Registre-se, porém, que, sendo tais dados oficiais, não estão contidos neles os acidentes com trabalhadores autônomos e domésticos. Além disso, há que se levar em conta a subnotificação, eis que diversas empresas resistem a reconhecer o acidente do trabalho para evitar arcar com os benefícios relativos à estabilidade provisória prevista no art. 118, da Lei nº 8.213/91, ou com o pagamento de indenizações pelos danos moral e patrimonial causados ao empregado, nos termos do inciso XXVIII, do art. 7.º, da Constituição Federal.

Se é fato que, por óbvio, a morte é a consequência mais grave do acidente do trabalho, seguida do acidente com ferimentos e mutilações, impõe-se chamar a atenção para outro mal que destrói o indivíduo, matando-o por dentro, inviabilizando-o para o trabalho e, por fim, para as atividades mais comezinhas, que são as doenças ocupacionais, equiparadas ao acidente do trabalho. Pode-se dizer, sem exagero, que temos, hoje, uma epidemia de LER (Lesões por Esforço Repetitivo). Bancários e digitadores, em geral, são as maiores vítimas deste mal, principalmente as mulheres.

A via crucis experimentada especialmente pelo trabalhador bancário, por exemplo, é dolorosa. Além de sofrer por excesso de jornada e do assédio moral de cobranças abusivas por metas, que o levam a problemas psíquicos, por conta de sua digitação constante, não raro adquire LER. O bancário dificilmente fica por muito tempo no emprego, sendo demitido assim que começam a aparecer os primeiros sintomas das doenças.

Jornadas extenuantes e poucos investimentos em treinamento e segurança, ligados à urgência no término das obras, levam metalúrgicos e trabalhadores da construção civil a índices astronômicos de acidente. O capitalismo, aqui, mostra uma de suas faces mais sangrentas. Em nome do lucro máximo, explora-se o trabalhador ao limite de sua força, ao passo que não se garante a segurança necessária a que complete sua jornada incólume.

Somente com pagamento de benefícios por acidentes e aposentadorias decorrentes das más condições do trabalho, em 2009, o INSS gastou R$14,2 bilhões. Se somarmos as despesas com o custo operacional do INSS com as da área da saúde o custo-Brasil com o acidente do trabalho chega a R$56,8 bilhões.

Todos perdem com o acidente do trabalho. O empregado acidentado e sua família; a empresa, que perde produtividade; o Estado, que paga benefícios e pensões; enfim, toda a sociedade.

O Brasil tem experimentado período de grande crescimento econômico. Isso, porém, não pode ser conseguido à custa do sacrifício daquele que produz tal crescimento. É preciso que toda a sociedade acorde para o problema e, assim, sejam tomadas medidas efetivas para dar fim a esta verdadeira tragédia!


* Carlos Henrique de Carvalho e José Carlos Nunes são advogados trabalhistas e membros da Comissão da Justiça do Trabalho da OAB/RJ. O primeiro é, também, conselheiro da Seccional


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