03/08/2018 - 21:02

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Pontocontraponto

03/08/2018 - 21:02

Pontocontraponto

Situações excepcionais justificam tortura e operações como a realizada pelos EUA para matar Bin Laden?


Nenhum terrorista pode matar 3 mil inocentes e ficar de ‘autos’

Felipe Moura Brasil*

Chame de tortura ou “técnicas incrementadas de interrogatório”, o fato hoje indiscutível é que a simulação de afogamento (“waterboarding”) funciona. Aplicada em Khalid Shaikh Mohammed e outros dois terroristas, em período limitado - os meses posteriores aos atentados de 11 de setembro de 2001 -, ela rendeu “informações de alto valor”, permitindo “uma compreensão mais profunda da Al-Qaeda”, como até Dennis Blair, diretor de Inteligência Nacional do governo Obama, admitiu em 2009, muito antes de a morte de Bin Laden reacender o debate.

Em treinamento, milhares de militares americanos já haviam sido amarrados a uma prancha, com os olhos tapados e um pano enfiado na boca, e sufocados com o despejo de água no rosto. A CIA submeteu Mohammed a isso 183 vezes. Depois de dias, ele dedurou um tal de Hambali, cuja captura permitiu aos EUA desmontar uma célula de 17 membros da Jemmah Islamiyah, que planejava uma “Segunda Onda” de atentados na Costa Oeste. Não se sabe quantas vidas foram salvas. O motivo: Obama prefere omitir os documentos da CIA que nos ajudariam a esclarecer.

Tudo bem. A caça a Bin Laden demonstrou, mais uma vez, a eficácia dos métodos de interrogatório de Bush, dos quais saiu parte das informações sobre o mensageiro do terrorista. Com três diretores da CIA — incluindo o atual — revelando essa origem, só restou à Casa Branca, dessa vez, minimizar sua importância, alegando a multiplicidade de fontes de inteligência que, somente combinadas, conduziram ao sucesso da operação. Um típico desmentido que nada desmente. Mesmo que não tenham sido decisivas – e tudo indica que foram —, o fato de as informações terem sido úteis não pode ser ignorado.

Com o equipamento, o contingente e, claro, as pistas da Era Bush, o governo Obama violou o espaço aéreo do Paquistão, agiu sem o seu consentimento e executou Bin Laden desarmado — como se isto fosse mais humano que simular o afogamento de um preso. Em guerra, porém, contra organizações supranacionais, que não distinguem civis de combatentes e transformam qualquer lugar num campo de batalha com suicidas voluntários, os EUA fizeram o que tinham de fazer. Nenhum terrorista tem o direito de matar três mil inocentes e depois ficar “de autos” — como criança em piquepega — num país que o acoberte. E nem mesmo o “waterboarding” é mais imoral do que permitir novos atentados. Contra o terror, afogar é preciso.

* Jornalista e escritor, colaborador do site Mídia Sem Máscara

 

Ação militar violou Direito Internacional e direitos humanos


Renato de Moraes*

A operação militar, que culminou na execução de Osama Bin Laden em solo paquistanês, logo, fora do Afeganistão, contra o qual os EUA mantêm longa guerra, iniciada após o atentado de 11 de setembro, desnudou-se ilegal, a teor das regras do Direito Internacional e dos direitos humanos.

As circunstâncias da eliminação descaracterizam a hipótese de confronto armado, como, também, o país em que levada a cabo a missão afasta a tese de estado de guerra, que poderia legitimar a ofensiva, a pretexto de autodefesa do povo americano. O recurso à força letal foi desproporcional, apoiando-se os norte-americanos, como de costume, na mera exercitação da força pela força, e não na força do Direito.

De tudo quanto noticiado, evidenciou-se que o governo dos EUA não consultou o Paquistão, tampouco o Conselho de Segurança da ONU, sobre a ação, desrespeitando, assim, a soberania do país do Sul da Ásia.

À luz dos direitos humanos, da mesma maneira, mostrou-se desconforme a ultimação do ataque, privando-se, por exemplo, o alvo humano, quando evitável, do elementar direito a um julgamento, reconhecido em todos os documentos internacionais de que os EUA são signatários.

A execução, às claras, não obedeceu a princípio algum, seja moral, ético e legal, parecendo retroceder-se ao reino da Babilônia, em 1780 a. C., onde vigorava a lex talionis, situação impensável no tempo em que vivemos.

Igual ou maior repúdio merece a revelação de que a pista para encontrar Bin Laden, em Abbottabad, cidade próxima à capital do Paquistão, foi obtida sob técnicas de tortura, na prisão de Guantánamo, em Cuba.

Seria menos difícil digerir tal atrocidade se os ianques estivessem, ainda, sob o guante de George W. Bush, que implementou a ‘Guerra ao Terror’. Porém, tendo como presidente o advogado e prêmio Nobel da Paz, em 2009 – que, em campanha, aliás, prometeu fechar as instalações de Guantánamo –, a notícia do uso de tais injustificáveis práticas apresenta-se de alta gravidade.

Enfim, a cena, que rodou o mundo, de cidadãos estadunidenses celebrando a notícia da morte de Bin Laden, em frente à Casa Branca, fez rememorar a aviltante comemoração, no Oriente, há quase dez anos, da queda das Torres Gêmeas, por incontáveis simpatizantes da rede terrorista Al-Qaeda. Em nenhum dos casos, contudo, há motivo para festejo, mas, sim, de preocupação pelo que poderá vir, em relação à segurança física e jurídica de todos.

* Advogado


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