16/12/2016 - 13:53

COMPARTILHE

Cláusula de barreira - PEC 36

16/12/2016 - 13:53

Cláusula de barreira - PEC 36

Um passo à frente, mas o caminho é longo

LUIZ CARLOS DOS SANTOS GONÇALVES*
O Brasil tem muitos problemas e muitos partidos. Existem os já criados e outros que pretendem sê-lo, quase sempre com ideologias baças, genéricas, pouco vocacionadas a receber o apoio efetivo de segmentos da população que, nas ruas, buscam alternativas. Outrossim, há partidos que, embora minoritários, fazem a diferença. São fiscais atentos da conduta de seus irmãos maiores e, não raro, conseguem obstar procedimentos questionáveis.

Qualquer reforma no sistema partidário deve, portanto, resolver a tensão entre, de um lado, liberdade de criação partidária, proteção a partidos e pontos de vista minoritários e, de outro, a tarefa de pôr cobro à proliferação de legendas meramente formais, desenraizadas de expectativas sociais.

O caminho da PEC 36 é praticamente isento de controvérsias quando proíbe coligações proporcionais. Elas distorcem o sistema de representação e dão lugar a arranjos exóticos entre partidos de ideologia distinta (ou sem nenhuma ideologia). A ideia de que o voto no partido é decisivo para a eleição de vereadores e deputados cede diante de coligações em que todos cabem. Todavia, o adiamento dos efeitos desta proibição para 2020 não encontra boa justificação. Desde que respeitada a anualidade prevista no artigo 16 da Constituição, por que a medida já não pode valer para as eleições de 2018?

Com relação à cláusula de barreira, a PEC 36 mostra-se adequada. Recusa o direito ao funcionamento parlamentar para greis partidárias que não tenham atingido 3% do total de votos, distribuídos em ao menos 14 estados, com 2% dos votos em cada um destes, restrições que valerão para o pleito de 2022. Para as eleições de 2018, o percentual de votos nacionalmente exigido será de 2%. Cria-se a federação partidária, para partidos que tenham afinidade ideológica e programática, otimismo que, espera-se, a realidade venha a confirmar. Como, nesse caso, a restrição ao funcionamento parlamentar implica que não haverá recursos do fundo partidário ou acesso ao rádio e à televisão, o adiamento dos efeitos da emenda é adequado. Os partidos precisam de tempo para se adequar à nova realidade.

A timidez da PEC 36 se evidencia ao não criar mecanismos que dificultem a criação de partidos novos (maior rigor no apoiamento, por exemplo, ou a exigência de efetiva filiação) e ao não exigir regras de democracia interna para a escolha de suas direções e seus candidatos. Ela poderia também avançar no sentido de proteção da igualdade da mulher na política. A verticalidade das coligações, afastada pela Emenda Constitucional 52, deveria ser repensada: trata-se de favorecer partidos fortes e a governabilidade deles decorrente. Ou não?
Já fomos contrários a estas regras de limitação de novos partidos. Evoluímos para considerá-las uma necessidade.
 
* Procurador regional eleitoral de São Paulo

Proposta contornou problemas de 2006

DAVID FLEISCHER*

 
A PEC 36, que trata de dois temas de reforma eleitoral formulada pelos senadores Aécio Neves (PSDB/MG) e Ricardo Ferraço (PSDB/ES), aborda uma cláusula de barreira e a proibição de coligações em eleições proporcionais (deputado federal, deputado estadual e vereador).

A legislação eleitoral aplicou uma cláusula de barreira de 5% dos votos válidos a nível nacional do pleito de 2006 e apenas sete dos 21 partidos que elegeram pelo menos um deputado naquela eleição ultrapassaram esta barreira – elegendo 395 deputados. Destes, apenas o PMDB e o PT conseguiram 2% dos votos válidos em todas as 27 entidades da federação.

Outros oito partidos sequer conseguiram 1% dos votos válidos e elegeram 24 deputados. Em fins de outubro daquele ano, vários dos outros seis partidos (que haviam eleito 93 deputados) começaram a articular fusões e incorporações na tentativa de alcançar a barreira de 5% ex post facto.  Porém, no início de dezembro, o STF declarou esta barreira inconstitucional.

Por quê? O problema foi que esta medida criou “deputados de primeira classe” e “deputados de segunda classe”. Os deputados cujos partidos alcançaram os 5% tomariam posse normalmente. Mas os outros 118 deputados cujos partidos não alcançaram os 5% tomariam posse, porém estes partidos não teriam uma liderança na Câmara e seus deputados não poderiam ser indicados para comissões permanentes. Com razão, o STF declarou esta regra inconstitucional.

Penso que se esta cláusula de barreira (ou de desempenho) fosse igual à que foi adotada na República Federal da Alemanha em 1949 – os partidos que não alcançassem os 5% não elegeriam ninguém (não entrariam no cálculo da distribuição das vagas) –, o STF teria aprovado o mecanismo como constitucional.

A cláusula de barreira proposta na PEC 36 contornou este “problema” de 2006, pois todos os deputados tomariam posse, mas os partidos que não alcançaram os 2% não teriam mais acesso a propaganda eleitoral gratuita na TV e no rádio e recursos do fundo partidário. Em 2006, nove partidos não alcançaram a barreira dos 2%.  Esta norma “mataria” os minipartidos que sobrevivem com os recursos do fundo partidário e, principalmente, acesso ao horário gratuito. No caso do acesso à televisão, muitos destes partidos nanicos negociam o recurso (via coligações) com partidos maiores. Como o slogan do Sebrae – “Pequenas empresas, grandes negócios” –, neste caso seria “Pequenos partidos, grandes negócios”!

A outra parte da PEC 36 proíbe as coligações nas eleições proporcionais. Esta “barreira” deixaria apenas uns nove ou dez partidos em condições de eleger deputados, pois os outros não têm votos suficientes para cada um, sozinho, alcançar o quociente eleitoral em nenhum estado. Porém, esta PEC abre uma “brecha” na “federação de partidos”. Ao invés de uma coligação, esta federação eventualmente poderia alcançar os 2% e eleger alguns deputados. A regra na PEC é que os partidos em cada aliança teriam que ficar juntos (na respectiva federação) por quatro anos sob pena de seus deputados perderem seus mandatos.

A PEC 36 vai tramitar na Câmara dos Deputados em 2017 e, para valer para as eleições de 2018, teria que ser aprovada e publicada no Diário Oficial da União antes de 3 de outubro de 2017. Se for aprovada como está, o impacto seria de reduzir o número de partidos representados na Câmara dos Deputados para talvez uns 14 a 18, mas não melhoraria a governabilidade a partir de 2019.
 
*Professor emérito de Ciência Política na Universidade de Brasília

Abrir WhatsApp