03/08/2018 - 21:01

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Ponto contra ponto

03/08/2018 - 21:01

Ponto contra ponto

Ponto contra ponto

 

Protesto extrajudicial de créditos públicos


Acesso do devedor ao Judiciário não é afetado


Sergio Pyrrho*

A possibilidade de que créditos públicos sejam protestados é constantemente criticada. Mas as críticas muitas vezes se prendem a fundamentos que, embora válidos no passado, já não subsistem hoje.

Tradicionalmente o protesto era mesmo uma condição para que pudessem ser executados determinados títulos de crédito. Era então chamado de protesto cambial, sendo obrigatório no caso dos títulos a que a legislação cambial fazia expressa referência.

Mas essa realidade mudou em 1997, quando a Lei nº 9.492, em seu art. 1º, passou a conceituar o protesto como “ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida”.

Há mais de uma década, portanto, o protesto deixou de ser condição para a execução de crédito. E ainda assim credores continuam a protestar seus títulos inadimplidos. Não há espaço para o argumento de que o protesto do crédito público é injustificável por já contar, a administração pública, com o instrumento da execução fiscal.

O protesto de CDAs justifica-se, sim, e por uma razão de fácil compreensão: os credores privados, mesmo tendo em mãos títulos também dotados de força executiva, valem-se do protesto como instrumento eficiente e menos oneroso para a percepção do que lhes é devido. Contribuintes que se dizem receosos dos efeitos do protesto que contra eles venha a fazer o Poder Público por força de tributos inadimplidos não relutam em levar a protesto os seus parceiros comerciais inadimplentes.

O efeito prático dessa conduta que alguns querem ver perpetuada (na qual os credores privados protestam os seus títulos enquanto o Estado não o faz) é conhecida: os devedores comuns do Estado e de um credor privado pagam antes a este último, contrariando o interesse público, que é sistematicamente preterido em relação ao interesse privado.

O protesto de créditos inscritos em dívida ativa em nada afeta o amplo acesso do devedor ao Judiciário. A existência do débito poderá ser questionada pelos mesmos instrumentos que sempre estiveram à disposição do devedor.

Por tantas razões é que a possibilidade de protesto de créditos públicos foi validada por ampla maioria do Órgão Especial do TJ (no julgamento das Representações de Inconstitucionalidade nos 20 e 55, ambas de 2009), pela Corregedoria do TJ (através do Provimento nº 31/2009) e pelo CNJ (no julgamento do Pedido de Providências nº 200910000045376).

*Subprocurador-Geral do Estado

 

Lei Estadual nº 5.351 é inconstitucional


Mauricio Faro*

A Lei Estadual (RJ) nº 5.351, de 15 de dezembro de 2008, ao autorizar o protesto extrajudicial dos débitos inscritos em dívida ativa, transferindo a terceiros a atividade de cobrança da dívida ativa estadual, incorreu em violação ao § 6º do art. 176 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, bem como aos artigos 131 e 132 da Constituição Federal, que estabelecem que “compete, privativamente, à Procuradoria Geral do Estado a cobrança judicial e extrajudicial da dívida ativa do Estado”.

A Associação Nacional dos Procuradores de Estado impetrou ADI (nº 3786-2) contra a resolução do Senado nº 33/2006 que “autoriza a cessão, para cobrança, da dívida ativa dos municípios a instituições financeiras”, pois a referida norma retiraria importantes atribuições das procuradorias, especificamente a que se refere à cobrança da dívida ativa.

É inequívoco que o escopo do protesto da CDA é tão-somente o de servir de coerção indireta ao pagamento de tributos, verdadeira sanção política, medida há muito rechaçada pelo Supremo Tribunal Federal. A administração pública possui meio específico para cobrar seus débitos, disciplinada pela Lei nº 6.830/80, sendo o protesto meio coercitivo, inadequado e desproporcional.

A regra em questão foi criada em razão do transtorno que é causado àqueles que têm contra si títulos protestados e que têm maculado o seu nome no meio empresarial, vendo-se privados da possibilidade de crédito junto a instituições financeiras e impossibilitados de obterem melhores condições negociais junto a fornecedores e prestadores de serviços, o que inviabiliza o seu negócio.

A liquidez e certeza do título executivo decorrem diretamente da lei, sendo desnecessário seu protesto a fim de iniciar-se sua execução forçada. Pelos mesmos motivos, resta evidente a inconstitucionalidade do inciso III do art. 3º da Lei Estadual nº 5.351/2008, que transfere a bancos comerciais atividades privativas da advocacia estatal.

Diante de todas as prerrogativas já conferidas à Fazenda Pública, as medidas instituídas pela Lei nº 5.351/08 revelam-se absolutamente desnecessárias e desproporcionais, produzindo efeitos desastrosos ao patrimônio dos contribuintes.

* Conselheiro da OAB/RJ e membro da Comissão Especial de Assuntos Tributários


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