29/07/2016 - 16:31

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Sílvia Lopes Burmeister - Presidente da Abrat: ‘Justiça do Trabalho sofreu corte por causa de sua efetividade e celeridade’

29/07/2016 - 16:31

Sílvia Lopes Burmeister - Presidente da Abrat: ‘Justiça do Trabalho sofreu corte por causa de sua efetividade e celeridade’

A presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat), Sílvia Lopes Burmeister, é taxativa ao repudiar os pesados cortes orçamentários impostos à Justiça do Trabalho, que puseram sob risco o funcionamento dos tribunais e o recebimento de direitos pelos trabalhadores demitidos no país. Para ela, não há dúvida, os cortes se deram em razão, justamente, da “efetividade e celeridade” dessa área do Judiciário. O assunto, entre outros, será tema de debate na 38ª edição do Congresso Nacional de Advogados Trabalhistas, que se realizará em setembro em Gramado, no Rio Grande do Sul.
 
PATRÍCIA NOLASCO
 
Os profundos cortes orçamentários impostos à Justiça do Trabalho – 30% sobre o custeio e 90 % em investimento –, suavizados por créditos extraordinários que permitirão sua sobrevida até dezembro, põem em situação ainda mais difícil os trabalhadores que, neste momento de crise e demissões, precisam receber direitos. Como estão atuando as entidades que os defendem?

Silvia Burmeister – Não resta dúvida de que, neste momento de crise, com um grande número de demissões e falta de pagamento de direitos trabalhistas, tendo os trabalhadores de recorrerem à Justiça do Trabalho, encontrá-la combalida e desestruturada por falta de recursos mínimos é algo que tem recebido repúdio e luta da classe dos advogados trabalhistas.

A Abrat, assim como as associações trabalhistas de 26 estados do país, vem promovendo atos públicos para denunciar o corte discriminatório sofrido pela Justiça do Trabalho. Recentemente realizamos, juntamente com a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, o Colégio de Presidentes e Corregedores dos Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor) e o Conselho Federal da OAB, ato nacional em defesa da Justiça do Trabalho.

Também participamos, como amicus curiae, da ADI (5468) interposta pela Anamatra junto ao Supremo Tribunal Federal. A chamada medida provisória (MP) da JT, que alcança valores extraordinários, serve como uma sobrevida para aqueles tribunais que possuem convênios com a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, visto que os valores liberados são decorrentes desta rubrica. Vários pequenos tribunais não receberam nenhum valor ou receberam valores ínfimos frente aos seus orçamentos. 

A Justiça do Trabalho sofreu o corte por causa de sua efetividade e celeridade, não temos dúvida, e tal conclusão está no fundamento do deputado Ricardo Barros, relator da Lei do Orçamento. Não podemos esquecer que a Justiça do Trabalho é a que mais recolhe aos cofres da União, considerando os recolhimentos legais ao INSS e à Receita Federal que ocorrem a cada processo.

Em setembro, a Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas terá oportunidade de debater, em seu congresso nacional, uma série de propostas legislativas que implicam mudanças nas relações do trabalho. Uma delas, a expansão da terceirização das atividades, sob forte oposição das entidades sindicais. O que a senhora pensa a respeito?

Silvia – A tercerização é um instituto que vem sendo debatido pela advocacia trabalhista na Abrat há muito tempo, vários foram os congressos em que aprovamos notas e moções de repúdio a esta forma nefasta de precarização da mão de obra trabalhadora.

Em nossos eventos de Direito Sindical, chamamos a atenção para o fato de que a terceirização rebaixa salários na medida em que, além da remuneração direta ao trabalhador, terá que cobrir os encargos sociais e o lucro do atravessador. Mais séria ainda é a questão dos acidentes de trabalho, uma vez que a empresa terceirizada não investe em mudanças estruturais no tomador da mão de obra para resguardar a segurança do trabalho. Grave também é a quebra do conceito de categoria de trabalhadores já que, sabemos, ela é definida pela atividade econômica do empregador. Como faremos para classificar um metalúrgico terceirizado se o empregador é o atravessador?
 
Outros projetos de lei, como o PL 8294/2014, preveem a prevalência do negociado sobre o legislado, isto é, abrem caminho para os acordos extrajudiciais de trabalho. Para as empresas, isso atrairia investimentos internacionais e garantiria maior segurança jurídica. Para muitos que se opõem, trata-se de uma brecha para retirada de direitos. Qual é a sua opinião?

Sílvia – Inicialmente, ressalto que há na legislação atual a possibilidade de prevalecer o negociado sobre o legislado desde que os direitos dos trabalhadores sejam ampliados em relação à lei, ou seja, quando há evidente melhoria nas condições de trabalho.

Os projetos (são quatro) que tratam da mesma matéria hoje se encontram apensados para exame do Legislativo. De forma comum, buscam a flexibilização das garantias de lei, garantias estas que são mínimas, fundamentais. O Brasil possui em relação à classe trabalhadora uma das menores rendas per capita, não há investimentos em tecnologia para baixar o custo do produto, e sim o rebaixamento do salário e dos poucos benefícios adquiridos pelos trabalhadores através de sua luta junto a sindicatos e confederações.

Hoje, a organização sindical não tem garantias legais para ser um efetivo instrumento de pressão no sentido de avançar nas negociações com os empregadores, e a Lei de Greve inibe a paridade na negociação. Os sindicatos encontram-se desgastados e desmobilizados face à interferência excessiva do governo e do Poder Judiciário, bem como do Ministério Público do Trabalho, que reiteradamente vêm retirando dos sindicatos a autonomia de atuação junto aos representados.

Na avaliação dos advogados trabalhistas, o que precisa ser modernizado na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), aos seus 73 anos, e em relação ao novo Código de Processo Civil?
 
Sílvia – A CLT vem sendo atualizada desde sua edição, em 1943, Já sofreu mais de 497 modificações desde então, além das 67 disposições constitucionais de 1988 que se somaram. Portanto, ela não parou no tempo, vem se adequando à realidade das relações laborais. Vários foram os projetos de lei que, sob o discurso da “necessária revisão da CLT “, na verdade buscavam a redução de direitos.

A nossa CLT é um dos instrumentos jurídicos mais avançados, tanto que vários de seus institutos subsidiaram o recente Código Civil. Não sendo diferente com o novo CPC, cujo princípio é a primazia da solução do conflito como forma de resolver a disputa social. Hoje, no código, há uma expressa vocação para a conciliação dos conflitos, o que a CLT prevê desde a sua edição.

Um dos temas a serem discutidos pela advocacia trabalhista no congresso da Abrat é a discriminação por gênero e raça. Este é um problema grave no meio jurídico?

Sílvia – É um tema recorrente nos eventos jurídicos trabalhistas, tendo em vista que ainda há no mundo do trabalho e nas relações de trabalho discriminação racial e de gênero. A mulher recebe salário menor que o homem trabalhador, assim como é muitas vezes preterida quando das promoções. Em relação à questão racial, ainda é muito presente, embora velada. Não vimos os negros ou mulatos, maioria em nosso país, em cargos de chefia e direção de empresas. Hoje também destacamos a discriminação xenofóbica em relação aos trabalhadores imigrantes de outros países, especialmente, negros e muçulmanos.

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