19/11/2014 - 12:01

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‘Justiça é dura com os pobres e mansa com os ricos’

19/11/2014 - 12:01

‘Justiça é dura com os pobres e mansa com os ricos’

Na palestra de abertura, Barroso sugeriu que papel do STF seja redefinido

Responsável pela palestra Constituição democrática e a efetivação de direitos, tema central da 22ª Conferência, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luis Roberto Barroso fez breve diagnóstico da conjuntura política e social e também do Judiciário no Brasil, e propôs medidas que, em sua opinião, poderiam ajudar o país a avançar. Barroso também apontou modificações que julga necessárias na sociedade brasileira, incluindo a eliminação de disfunções como o oficialismo, o patrimonialismo e a desigualdade. “É muito mais fácil prender um menino com 100 gramas de maconha do que alguém que tenha cometido uma fraude de um milhão de reais. Temos uma Justiça dura com os pobres e mansa com os ricos”, apontou.

O Direito brasileiro e seu exercício receberam a atenção de Barroso. Entre as questões que defendeu como primordiais, ele mencionou o excesso de litigiosidade e a demora no julgamento dos processos. Segundo o ministro, há atualmente cem milhões de ações tramitando no Brasil, das quais um terço são casos novos, ajuizados em 2013. Estatisticamente, a cada dois brasileiros, um tem uma ação na Justiça, e estas ações são apreciadas por um quantitativo de 16 mil juízes.

Ao mesmo tempo em que essa demanda demonstra, além de confiança e credibilidade no Judiciário, maior consciência por parte da população sobre seus direitos, é preciso que se dê atenção – observou o ministro – ao processo de abarrotamento pelo qual passam os tribunais, incluindo o STF. Para ele, diante do quadro, é importante redefinir o papel do Supremo.

“O STF não deve funcionar como terceira ou quarta instância. Eu havia julgado, até setembro deste ano, mais de quatro mil processos. Não tenho orgulho, tenho constrangimento. Isso é o oposto do que deve ser uma jurisdição funcional. Como qualquer pessoa inteligente pode intuir, estamos repetindo decisões, pois ninguém tem tempo para julgar isso tudo. O sistema está errado”, sustentou. Como sugestão, ele propôs que o STF não assuma, por exemplo, recursos que não seja capaz de julgar em um ano.

A reforma política recebeu atenção especial na palestra. Apesar de ser objeto de consenso, a necessidade de realizá-la também sofre de uma enorme inércia, avaliou. “Nós não conseguimos sair do lugar, giramos em círculos”. Barroso defendeu como alternativas para a política “recuperar sua dignidade” o barateamento do custo das eleições, a criação de maiorias que evitem o fisiologismo nas votações importantes e um sistema que garanta a autenticidade partidária. “O descolamento entre a classe política e a sociedade civil é um perigo democrático. Uma democracia política é gênero de primeira necessidade. Portanto, quem quer que ganhe as eleições deve ter o compromisso patriótico de dedicar o primeiro semestre de seu governo para mudar as instituições políticas que transformaram a política em um negócio”, afirmou.

Outra alteração no cenário jurídico indicada pelo ministro foi a restrição do foro privilegiado, considerado por ele como “uma reminiscência aristocrática que perpetuamos no Brasil”. O sistema “é feito para não funcionar, para fomentar a impunidade, para que se chegue à prescrição. Tem vícios insuperáveis. Em primeiro lugar, não é republicano e faz parecer que uns são mais iguais que outros. Em segundo lugar, nem o STF nem o Superior Tribunal de Justiça estão aparelhados para fazer o papel de juízo de primeiro grau nos processos”, criticou.

Para Barroso, o fortalecimento da sociedade civil é outro ponto fundamental para assegurar avanços. “[Precisamos de] uma sociedade civil mais independente, criativa, solidária e com verdadeiros empreendedores sociais. Temos, no Brasil, ricos em número suficiente para incluirmos a filantropia na agenda do país. A doação de tempo, dinheiro e ideias precisa entrar nos compromissos da elite brasileira, das pessoas bem sucedidas, que ganharam dinheiro graças ao país, e têm o dever de deixar legados que não sejam só para seus herdeiros diretos”, disse.

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