03/08/2018 - 21:02

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A segurança jurídica no processo administrativo

03/08/2018 - 21:02

A segurança jurídica no processo administrativo

JEANNE MARIA FREIRE SILVA*

O princípio da independência dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, preconizado por Montesquieu, fundamentou-se no nexo que cogitou existente entre o “meio”, consistente na separação dos poderes, e o “fim”, qual seja, a liberdade. Em De L’Esprit des Lois (1748), assevera que “tudo estaria perdido se uma mesma pessoa, ou o mesmo corpo de grandes ou de nobres, ou de povo, exercesse estes três poderes: o de elaborar as leis, o de executar resoluções públicas e o de julgar os litígios dos particulares”.

Origina-se de tais fundamentos, e com escopo no princípio da legalidade, o Direito Administrativo, que, regulamentando o funcionamento da administração pública, engendrou a construção de parâmetros e critérios específicos para a resolução de controvérsias no âmbito administrativo.

Sua relevância, portanto, que aqui se chama à reflexão, exige do operador do Direito um conhecimento específico e atualizado da dinâmica na tramitação processual administrativa, para o alcance de êxitos nas decisões administrativas e garantia da segurança jurídica.

Entre os sistemas administrativos que são paradigmas, o Brasil adotou o inglês, que é o da unicidade de jurisdição, atribuindo-se, dessa forma, a competência única ao Poder Judiciário para a resolução de todas as lides em caráter definitivo, por força de coisa julgada material.

No Direito francês, entretanto, tem-se a dualidade de jurisdição, ou seja, das matérias apreciadas em âmbito administrativo, por seus tribunais próprios, não cabe revisão pelo Poder Judiciário, destacando-se nesse contexto o Conselho de Estado, e, entre as suas atribuições, a de conselheiro do governo e a de juiz administrativo supremo, o julgador em última instância dos atos do Poder Executivo e dos entes que dispõem de prerrogativas de Poder Público.

No Brasil, todavia, as decisões administrativas podem e são frequentemente modificadas pelo Poder Judiciário, assistindo-lhes, todavia divergir em inúmeras teses que afetam interesse inter partes, excetuando-se aquelas que produzam efeito erga omnes, às quais também estão obrigadas a seguir. Logo, havendo divergência no entendimento entre a esfera administrativa e o Judiciário, ao ensejo da garantia dos direitos postulados, sobreleva considerar-se os pré-requisitos formais definidos administrativamente, satisfazendo-lhes às exigências específicas, considerada a insubordinação da administração pública às decisões judiciais em que não figura como parte, mas atentos à sua estrita observância aos princípios que lhes são próprios e previstos na Contituição, notadamente em seu artigo 37 caput. A segurança jurídica no universo das demandas em âmbito administrativo está diretamente ligada à organização política e social dos cidadãos, nas suas reivindicações de forma sistemática e qualificada na prática, e em todas as esferas de poder que deles é emanado.

Assim é o caso dos trabalhadores expostos a fatores de risco, tanto em ambiente rural quanto urbano, para os quais há previsão de direito à aposentadoria especial, muitas das vezes negada, pelo fato de os formulários emitidos por seus empregadores estarem em desacordo com determinadas normas de elaboração dos mesmos. Tal entrave tem sido tratado de modo a conduzir a demanda para a esfera judicial, que considera a exposição devidamente expressa em formulário suficiente ao reconhecimento do direito, tornando tal providência automática pelo interessado.

Ocorre, nesse caso, que medidas negociadas pelas representações das categorias dos trabalhadores poderiam modificar as formas de reconhecimento administrativo dos dados constantes dos formulários, assegurando, assim, maior efetividade ao direito do trabalhador.

Assinale-se que, no contexto da segurança e saúde ocupacional dos referidos trabalhadores, em razão da inobservância de procedimentos técnicos da atribuição de engenheiros de segurança e médicos do trabalho das empresas empregadoras, prejudicados no reconhecimento da exposição a risco para fins previdenciários em sede administrativa, considera-se o desenvolvimento de uma infovia documental específica, e com funcionalidade para aceite somente de informações padronizadas, haja vista o elevado grau de eficácia e eficiência dos sistemas da Dataprev, como uma das sugestões para garantia de direitos que lhes são previstos.

Da mesma forma, outras demandas de diversos segmentos da sociedade organizada poderiam ter resultados mais céleres, por meio de atos administrativos eficazes em preservar o interesse público e o direito adquirido.

Advogada, conselheira do CRPS/MPS, doutora em Ciências em Engenharia da Coppe/UFRJ


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