08/04/2015 - 09:34

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Aborto: consciência de Estado laico é fundamental para garantia de direitos

08/04/2015 - 09:34

Aborto: consciência de Estado laico é fundamental para garantia de direitos

Mesmo espelhando-se, sob diversos aspectos, nas democracias desenvolvidas, os países latino-americanos deixam a desejar no que diz respeito à laicidade do Estado e à garantia dos direitos fundamentais do indivíduo, observou a senadora uruguaia Constanza Moreira, ao participar, dia 25 de abril, do seminário Direito ao abordo tegal - Contrastes entre o Uruguai e o Brasil, promovido pela Comissão de Bioética da OAB/RJ. 

Segundo os participantes do evento, a exceção nesse cenário tem sido justamente o Uruguai, que assumiu uma posição de vanguarda em questões ainda delicadas para os coirmãos, como a legalização da maconha e a descriminalização do aborto. Para Constanza, só foi possível avançar nestes pontos porque desde a metade do Século 20,  seu país apresenta no perfil político uma característica anticlerical. “Foi esta visão laica que permitiu a separação precoce da Igreja e do Estado. Para nós, latino-americanos que tanto falamos das democracias desenvolvidas, falta atenção ao que esses países pensam em relação ao aborto e a tantos outros direitos individuais. Os impedimentos filosóficos, éticos e religiosos são parte da moral privada. O Estado não tem religião. Não quer dizer que, com isso, passamos a recomendar o aborto às mulheres; nós estamos apenas prestando um serviço sanitário para aquelas que decidem interromper sua gravidez”, pontuou a senadora.

Trazer esse polêmico assunto para a Ordem é a forma democrática de abordá-lo sem censuras, defendeu a presidente do Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro e integrante da comissão OAB Mulher, Maíra Fernandes. “É muito significativo participar deste debate estando grávida. As mulheres devem escolher quando e como querem ser mães. Minha gravidez foi desejada, mas isso nada tem a ver com as gestações de mulheres que, por algum motivo em determinado momento, não podem ou não querem seguir adiante. Quando condenamos uma mulher a recorrer à clandestinidade estamos condenando também toda uma família”, lamentou Maíra.

O aborto e a clandestinidade das clínicas são, hoje, as principais causas da mortalidade materna, apontou a vice-presidente da Comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ, Fernanda Bianco. De acordo com ela, a Organização das Nações Unidas já recomendou a revisão da lei criminalizadora do aborto no Brasil e em outros países da América Latina, assim como o Conselho Federal de Medicina, que delimita apenas a interrupção em gestações de até 12 semanas: “Mesmo assim este é um tema que não consegue espaço democrático de debate, sem hipocrisias e preconceitos. A Ordem não poderia declinar do papel de impulsionar mais discussões sobre o assunto”.

Na lei uruguaia, aprovada em 2012, concessões e adaptações foram necessárias, explicou a senadora Constanza Moreira. “Tínhamos a laicidade a nosso favor, mas desenvolvemos uma verdadeira batalha para esta conquista. Primeiro, contamos com apoio do partido Frente Ampla. A descriminalização era uma das agendas do programa de governo José Mujica. Conseguimos o apoio de juízes, médicos e da Universidade Pública. Mesmo assim, tivemos que alterar trechos para garantir o apoio de alguns políticos”, contou.

A expressão “direito ao aborto” teve que ser substituída por interrupção voluntária da gravidez, contou a senadora. E outras medidas foram incluídas no pacote, como a restrição da interrupção em gestações de até 12 semanas.

As dificuldades históricas para a descriminalização do aborto no Brasil foram apresentadas pela integrante do coletivo Iniciativa Duas Gerações em Luta pelo Aborto Sônia Correia. De acordo com Sônia, diferentemente do que aconteceu no Uruguai, aqui a pauta não é abraçada por nenhum partido. O seminário contou, também, com a participação do diretor da Anistia Internacional (Brasil), Átila Roque; da juíza federal Jana Reis; do presidente da Comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ, Bernardo Campinho, entre outros.

O presidente da Caarj, Marcello Oliveira; o coordenador das comissões especiais da Ordem, Fábio Nogueira; e a coordenadora da Iniciativa Duas Gerações em Luta pelo Aborto no Brasil, Leila Linhares, compuseram a mesa de abertura.
 

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