03/08/2018 - 21:04

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Bons debates na Cúpula dos Povos, decepção na Rio+20

03/08/2018 - 21:04

Bons debates na Cúpula dos Povos, decepção na Rio+20

Das divergências entre o conceito de economia verde à preservação dos arquivos do Judiciário, passando pelas discussões sobre a Comissão da Verdade e a situação da mulher no trabalho, o seminário Novos direitos e paradigmas, realizado na OAB/RJ nos dias 20 e 21 de junho, foi um dos destaques da Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio+20. Os
resultados da conferência mundial da ONU sobre o meio ambiente, no entanto, geraram decepção quase generalizada. Para o presidente da Seccional, Wadih Damous, o produto final foi “pífio”, opinião que é compartilhada pelo presidente da Comissão de Direito Ambiental da Ordem, Flávio Ahmed.
 
Ressalvando como positiva a ocorrência de centenas de eventos e manifestações democráticas “de todas as raças, credos e crenças” na cidade, Wadih questionou se terá sido válido investir tantos recursos públicos para sediar a Rio+20, tendo em vista a realidade de carências básicas de sobrevivência no Brasil. “Se discutirmos determinados rótulos, conceitos que não estejam ligados à superação da desigualdade e da miséria, estaremos discutindo sobre o vazio”, observou, referindo-se à falta de definições acerca de objetivos, prazos e formas de financiamento de projetos ambientais.
 
Avaliação oposta recebeu a Cúpula dos Povos, por sua multiplicidade de eventos e seu caráter democrático. “Estamos aqui mais uma vez honrando a tradição da OAB para mostrar que não há limitação de assuntos. Tudo o que interessa à sociedade interessa à advocacia”, afirmou Wadih, na abertura do seminário que a Seccional sediou.
 
No mesmo painel, o presidente da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas, Luís Salvador, disse que a sociedade civil “tem condições de fazer contraponto aos interesses contrariados do capitalismo mundial”, organizando-se de forma autônoma e trabalhando “na construção de um mundo de inclusão social”. Para Salvador, “nossos governantes estão deixando de cumprir seus deveres com a sociedade para defender interesses patrimonialistas da economia mundial globalizada”.

Para a vice-presidente da Associação Americana de Juristas, Cléa Carpi, vive-se um grande dilema na questão de direitos. “O quadro hoje é de um capitalismo perverso, temos os exemplos do que está acontecendo na Europa, com reflexos, se não tivermos muito cuidado, na América Latina e na África”. Ela afirmou não crer que “esverdear esse capitalismo seja o caminho correto, mas sim denunciar o que está levando os povos dos países pobres e emergentes à fome e à carência de proteção do Estado, que deveria proteger e reconhecer os direitos dos cidadãos, e não cortá-los”.

O presidente do Sindicato dos Advogados do Estado do Rio de Janeiro, Álvaro Quintão, falou do interesse e da preocupação da advocacia com os novos paradigmas, e alertou para o “esquecimento da importância do meio ambiente de trabalho”. Quintão apontou movimentos “no sentido de flexibilizar direitos do trabalho, esquecendo que cada flexibilização de direitos traz consequências”, e criticou “algumas centrais sindicais” que estariam dispostas a respaldar projetos de lei com esse objetivo.

O seminário foi aberto pelo vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Seccional, Marcelo Chalréo, co-organizador do evento com o presidente da Comissão de Direito Ambiental, Flávio Ahmed. Também participaram da mesa o presidente da Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho, João Pedro Ferraz dos Passos, e os representantes da Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas, Antônio Fabrício Gonçalves, e da Associação de Advogados de São Paulo, Luis Carlos Moro.
 
SUSTENTABILIDADE

A impossibilidade de se pensar em políticas ambientais sem considerar os aspectos econômicos foi a tese que norteou a palestra do advogado e analista ambiental Rogério Rocco no painel sobre desenvolvimento sustentável. “Quem hoje detém os modos e meios de produção não admite abrir mão desses processos em nome de direitos coletivos, da humanidade, da diversidade biológica”, disse ele.
 
MEMÓRIA E VERDADE

A palestra O passado no presente, aspectos autoritários foi proferida pelo chefe do Departamento de Publicações da OAB/RJ, o jornalista e ex-preso político Cid Benjamin, que refletiu sobre uma questão: vale a pena mexer no passado? Cid se disse disposto a esquecê-lo se isso servisse para construir um presente e um futuro melhores. “Mas não é assim. E é direito das famílias saber o que aconteceu com seus entes queridos que foram presos e desapareceram”, afirmou, lembrando que o direito à sepultura é reconhecido desde os primórdios da civilização humana. “O conhecimento do passado evita a repetição dos erros”, salientou.
 
JUSTIÇA AMBIENTAL

Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/RJ, Ronaldo Coutinho participou do painel sobre Justiça Ambiental. Segundo ele, “esse é o momento de discutir a relação do nosso país com o seu povo, e não só com a natureza”. “Qualquer proteção ao ambiente tem que passar pela proteção ao homem. A urbanização que se acelera é a da miséria. Desalojar populações indígenas como quer o agronegócio é contrariar a Constituição pelo interesse do capital”, destacou.
 
TRABALHO DA MULHER

O debate sobre a condição do trabalho feminino contou com a participação da desembargadora do TRT-1 Sayonara Grillo. Segundo ela, desde a Constituição de 88 muitos foram os avanços para as mulheres, mas a situação das trabalhadoras está longe do ideal. Sayonara citou estudo do IBGE sobre porcentagem de homens e mulheres envolvidos nos extremos da relação de trabalho no Brasil: “Os dados mostram que 94% dos trabalhadores domésticos são mulheres. Enquanto na faixa dos empregadores, 69% são homens. Trata-se da expressão numérica da divisão sexual”.
 

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