11/07/2017 - 12:58

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Eleição deve ser direta ou indireta se Temer deixar a presidência?

11/07/2017 - 12:58

Eleição deve ser direta ou indireta se Temer deixar a presidência?

Na instabilidade, poder constituinte derivado deve ser minimalista

LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA*
A mais duradoura crise política da história brasileira, entre outras externalidades negativas, levou o país a discutir o modelo da inusitada sucessão do sucessor. Cogitam a saída do presidente Michel Temer. E dizem que o melhor seria promover eleições diretas. Discordo.

Hoje a Constituição garante que a sucessão se dê por eleições indiretas, pois a eventual saída de Temer aconteceria no biênio final do mandato (artigo 81, §1º). O deputado federal Miro Teixeira apresentou e defende a PEC 227/2016, com o objetivo de instituir eleições diretas para resolver a dupla vacância (à exceção do período final de seis meses de mandato). Como está na justificativa da proposta, o Congresso deveria devolver ao povo o direito de escolher o presidente da República. Reitero a discordância.

Antes de tudo, é necessário advertir que tempos de instabilidade não são apropriados para mudanças constitucionais. Em segundo lugar, a emenda seria inútil para a cogitada saída prematura de Temer. Isso porque o art. 16 da CF impede que leis que alterem o processo eleitoral se apliquem antes do prazo mínimo de um ano. Embora o artigo fale em leis, o Supremo já reconheceu o princípio da anterioridade se aplica também às emendas constitucionais. A segurança jurídica é cláusula pétrea, definiu o STF (ADI 3.685).
 
Assim, a emenda poderia receber o rótulo de casuística sem, contudo, atender ao propósito cogitado.
Uma das preocupações da PEC estava em um suposto conflito de normas entre o Código Eleitoral e a Constituição Federal. A preocupação se relacionava com a perspectiva de cassação da chapa pelo TSE – o que agora não mais se cogita. O Supremo pode resolver com calma o espaço de aplicação de cada uma das normas.

É no mérito também minha discordância. Nem sempre as eleições diretas representam instrumentos de eficiência democrática. Não há sentido em mobilizar a gigante democracia brasileira para eleger um presidente da República para um período inferior a um ano ou, em alguns casos, por poucos meses. Para isso há o Congresso, também eleito. Não se deve esquecer o custo de R$ 500 milhões para organizar uma eleição, sem contar os valores do fundo partidário para as campanhas eleitorais. E o natural compasso de espera da economia no processo eleitoral.

Necessário reconhecer que o argumento das diretas é sedutor. É sempre melhor falar em eleições diretas, mas a diretriz se subordina à eficiência. Não é eficiente realizar múltiplas eleições diretas. Por isso há regras de sucessão pelo vice e eleições indiretas. O pleito direto segue sendo a regra em todas as democracias. Por aqui é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, II). Não obstante, para ‘mandato tampão’, a eleição congressual é mais eficiente. Assim fazem também os americanos (art. 2º, seção 1.5), tal como foi a interinidade de Gerald Ford depois do impeachment de Richard Nixon (e o prévio afastamento do então vice). Também México (art. 84) e Argentina (art. 88), para usar exemplos latino-americanos. Estes países não podem ser considerados menos democráticos.

E se for para mudar, o momento é impróprio. Insisto que o poder constituinte derivado deve ser minimalista em contextos de instabilidade democrática.
 
*Advogado, doutor e mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná, professor e autor de diversos livros

PEC 227: a fim de recuperar os ecos dos comícios de 1984

MIRO TEIXEIRA*
Na leitura atenta de nossa história, sentimos falta de república e democracia. A primeira, porque a apropriação ou o uso de bens públicos pelos altos dirigentes distante fica do zelo pela res publica. A segunda, porque sucessivos golpes e decretações de estado de sítio interromperam, desde a sucessão de Deodoro da Fonseca, a normalidade constitucional.

Chegamos ao golpe de 1964 e, em 9 de abril do mesmo ano, à edição do Ato Institucional 1, em cuja ementa os golpistas se autoproclamam o “Poder Constituinte originário da revolução Vitoriosa”, assim mesmo escrito, revolução com inicial minúscula e Vitoriosa com maiúscula.

Logo no artigo 2º, o AI 1 remete à maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional a eleição do presidente da República e do vice, com mandatos limitados a 31 de janeiro de 1966.

Esse é o momento em que se interrompe o ciclo democrático iniciado em 1946, com a Constituinte e a posse de Eurico Gaspar Dutra, a partir do qual apenas dois outros presidentes eleitos pelo voto universal, direto e secreto completaram o mandato. O terceiro, Jânio Quadros, renunciou e o vice, João Goulart, foi desposto pelo dito golpe, recapitulação que faço em homenagem aos jovens leitores.

Os horrores da ditadura ficaram expostos e a partir de 1970 pequenas manifestações de intelectuais, artistas e da população em geral deram movimento às letras da Proposta de Emenda à Constituição 5, de autoria do deputado Dante de Oliveira.

Os grandes comícios realizados no país pelas Diretas Já não foram suficientes para aprová-la. No dia 25 de abril de 1984 alcançamos 298 votos a favor, número inferior aos 320 necessários à época. Cento e doze deputados faltaram, o que representa em emendas constitucionais o mesmo que votar contra. Outros 65 votaram ostensivamente contra e três se abstiveram.

Avançando a passos ligeiros para 1987, a Assembleia Nacional Constituinte, poder originário da Carta atual, deixou de lado o texto da Emenda Dante de Oliveira, no qual não havia previsão de eleição indireta e optou pelo sistema da Constituição de 1946, no qual se encontra tal previsão se a vacância da Presidência da República ocorrer nos dois últimos anos do mandato.

Já em 2015, o incômodo com decisões de tribunais regionais eleitorais sobre ações de impugnação de mandato eletivo, de ações de investigação judicial eleitoral ou de representações, que retiravam o mandato de governadores e vices, e davam posse aos segundos colocados nas respectivas eleições, resultou em alteração do artigo 224 do Código Eleitoral.

Pela nova redação, naquelas hipóteses de vacância por delito eleitoral, eleições diretas serão realizadas para preenchimento dos cargos, exceto nos seis últimos meses do mandato, quando a substituição se dará pela via indireta.

Em 2016, Dilma Rousseff respondia a processo de impeachment no Senado Federal quando o procurador-geral da República arguiu a inconstitucionalidade do dispositivo, por se chocar com o parágrafo 1º do artigo 81 da Constituição.

Em 1º de junho do mesmo ano, apresentei a PEC que tomou o número 227/2016, a fim de recuperar os ecos dos comícios das Diretas Já. Essa é a História.

*Deputado federal (Rede/RJ), advogado

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