13/08/2014 - 12:37

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Serviços advocatícios: inexigibilidade de licitação

13/08/2014 - 12:37

Serviços advocatícios: inexigibilidade de licitação

Sergio Mazzillo e Rafael Genuíno *
Tema recorrente nos tribunais pátrios, sobre o qual teceremos algumas breves considerações neste artigo, diz respeito à contratação, por entes da administração pública, de serviços profissionais de advogados estranhos aos quadros das entidades, com dispensa e inexigibilidade de certame licitatório.
 
Inicialmente, a questão deve ser analisada sob os ditames da Lei 8.666, de 21 de julho de 1993, com as alterações promovidas pela Lei 8.883, de 1994, pela Emenda Constitucional 19 e, finalmente, pela Lei 9.648, de 27 de maio de 1998, que regulamenta o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, que dita as normas gerais para licitações e contratos administrativos e obriga a sua observância pela quase totalidade de pessoas físicas e jurídicas que tenham a intenção de contratar com poder público.

Tomamos de propósito o cuidado de mencionar acima a expressão “quase”, vez que a própria Lei de Licitações elenca as exceções à regra geral, dentre as quais aquela que mais nos interesse por ora: a inexigibilidade de licitação “para a contratação dos serviços técnicos enumerados no artigo 13 desta lei, de natureza singular, com profissionais de notória especialização” (artigo 25, inciso II).

Não bastasse a referida lei considerar como “serviços profissionais especializados” o “patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas” (artigo 13, inciso V), o parágrafo primeiro, do citado artigo 25, vai mais além e define, com absoluta clareza, a notória especialização, relacionando alguns predicados da sociedade ou do profissional prestador dos serviços, como o conceito, a experiência, o aparelhamento, a equipe técnica e outros que permitam inferir a qualidade e adequação do seu trabalho ao objeto do contrato.

Nota-se, portanto, que a prestação de serviços de advocacia especializada, mediante contrato intuitu personae (mandato), amolda-se com perfeição aos dispositivos e definições legais aludidos acima, de forma que a dispensa e inexigibilidade de licitação em casos tais é impositiva, como, aliás, tem se firmado a orientação jurisprudencial.

Isso porque não há como se padronizar e comparar numa disputa administrativa a notória especialização do profissional, a qualidade e singularidade dos seus serviços, o seu extenso saber jurídico, a sua larga experiência e/ou a sua produção jurídica, o que demonstra a impropriedade do certame licitatório.

É evidente que o adjetivo “especializados” indica a natureza singular dos serviços referidos. Não tendo natureza singular, perdem, os serviços, a característica de especializados. In casu, a prestação de serviços advocatícios é a última e a mais refinada espécie de serviços profissionais existentes. Pelo elevado grau de especialização que exige do advogado e pela inalienável e necessária característica pessoal do resultado, esse serviço tem o que se denomina natureza singular, ou seja, aquele particular inconfundível de cada prestador.

A “natureza singular”, à evidência, está intimamente ligada ao objeto que se deseja contratar. Porém, não obstante a afirmativa acima, boa parte dos doutrinadores pátrios já admite que o profissional, só ou em equipe, é detentor de natureza singular subjetiva.

Destarte, a singularidade resulta das características pessoais do contratado, que tornam inviável a comparação ou a competição, ficando inexigível a licitação. Ou seja, são as características do advogado ou da sociedade de advogados que tornam o trabalho singular, diante da larga experiência daquele ou desta em determinado campo do Direito.

Os serviços técnicos profissionais especializados, assim considerados aqueles realizados por profissionais detentores de técnicas específicas e próprias, em ramos de atividades diferenciados, exigem conhecimentos técnico-científicos de particular importância.
Ademais, o critério de avaliação na licitação, por mais elaborado que sejam os quesitos, levará, indubitavelmente, a um julgamento impregnado de fatores subjetivos. Isso, sem considerar que, em determinadas atividades, casos específicos da contratação de um advogado, o relacionamento pessoal e a confiança são fatores determinantes.

Há, portanto, uma plena correspondência entre esse tipo de contratação – com licitação inexigível – e os princípios constitucionais da moralidade, finalidade, razoabilidade, economicidade e eficiência, em prol da supremacia do interesse público.

Destaque-se, nessa linha, apenas a título ilustrativo, que a matéria já foi inclusive objeto de um habeas corpus impetrado perante o Supremo Tribunal Federal, cujo acórdão, relatado pelo ministro Carlos Veloso, reafirmou a natureza singular e única do serviço de advocacia (HC 72.830-8-RO). Cabe salientar, ainda, que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, no processo PRO-0034/2002, relatado por Sergio Ferraz, reconheceu, por unanimidade, a singularidade do trabalho do advogado.
Atualmente, com o reconhecimento de sua repercussão geral, a questão em voga está diante do pleno do Supremo Tribunal Federal, em sede de recurso extraordinário (RE 656.669-SP), sob a relatoria do ministro Dias Toffoli, cujo julgamento, espera-se, confirmará a inexigibilidade de licitação para a contratação dos singulares serviços do advogado, como figura indispensável à administração da Justiça (artigo 133 da Constituição Federal).
 
*Advogados

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