03/08/2018 - 21:00

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O déficit da Previdência Social e a proposta da reforma tributária

03/08/2018 - 21:00

O déficit da Previdência Social e a proposta da reforma tributária

O "déficit da Previdência Social" e a proposta da reforma tributária


Leonardo Branco *

Todos os dias nos deparamos com notícias afirmando que aumentou o déficit da Previdência Social e temos a sensação de que a União retira dinheiro de seu orçamento para custear tal déficit, o que não é verdade.

A Constituição Federal (CF), em seu título VIII, capítulo II , trata da Seguridade Social, conforme determina seu art.194: "A Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social".

O art.194 da Constituição institui a Seguridade Social, na qual se encontra inserida a Previdência Social. Assim, não se pode analisar déficit da Previdência Social de forma isolada, pois esta se encontra incluída na Seguridade Social, com orçamento próprio e desvinculado do orçamento da União.

Prescreve o art. 195 da CF que a SeguridadeSocial será financiada com recursos provenientes de União, estados, municípios e contribuições sociais, e esta receita é desvinculada do orçamento da União.

Por meio de dados provenientes do MPS/STNMF, elaborados pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), será demonstrado que a União não gasta um centavo com a Seguridade Social. Ao contrário, através da DRU (Desvinculação das Receitas da União), retira verba da Seguridade Social.

As receitas realizadas da Seguridade Social em 2008 totalizaram R$ 375,6 bilhões, a maior parte delas corresponde à receita de contribuições sociais, R$ 359,8 bilhões, sendo que nessa soma temos como maiores arrecadações as contribuições previdenciárias, com R$ 163,4 bilhões, a contribuição para o financiamento da Seguridade Social- Cofins, com R$ 120,1 bilhões, a CSLL, com 42,5 bilhões, e o PIS/Pasep, com R$ 30,8 bilhões.

As despesas liquidadas em 2008 da Seguridade Social foram de R$ 310,8 bilhões, sendo que nesse conjunto temos como maiores despesas benefícios previdenciários urbanos, com R$ 158,9 bilhões; rurais, com R$ 39,9 bilhões; benefícios assistenciais (sem contribuições) – Loas –, com R$ 15,6 bilhões; saúde, com R$ 50,3 bilhões; assistência social, com R$ 2,7 bilhões; e benefícios sociais de transferência de renda, com R$ 10,5 bilhões.

Como se demonstra, em 2008, o saldo positivo da Seguridade Social foi de R$ 64,8 bilhões, sendo que, deste valor, através da Desvinculação das Receitas da União (DRU), a União se apropria de R$ 39,3 bilhões.

Em 2009, nos deparamos com o mesmo cenário: as receitas realizadas na Seguridade Social totalizaram R$ 392,3 bilhões, contra uma despesa liquidada de R$ 359,7 bilhões, gerando um saldo positivo de R$ 32,8 bilhões, e ainda através da DRU a União se apropriou de R$ 38,7 bilhões, cabendo ressaltar que os números em 2009 são menores devido à crise que se instalou na economia mundial.

A União não tem nenhum gasto com a Previdência Social, não há o tão propagado déficit, o que há é um cálculo errôneo por parte de alguns economistas, que falam em déficit levando em conta apenas o que se arrecada com as contribuições previdenciárias e o que se gasta com benefícios previdenciários, deixando fora desse cálculo todas as contribuições sociais e o próprio custeio dos entes federativos determinados pelo art.195 da CF.

A proposta de reforma tributária enviada ao Congresso Nacional, se aprovada, acabará com toda a estrutura da Seguridade Social no Brasil, e fará com que esta dependa da boa vontade da União e de seus governantes.

Conforme demonstrado anteriormente, a Seguridade Social no Brasil tem base no art.194 da CF, com contribuições próprias (PIS, Cofins, CSLL...), sendo superavitária e tendo orçamento vinculado.

A proposta de reforma tributária vai extinguir a Cofins, a contribuição para o PIS, a CSLL, entretanto, no lugar deste, será criado o IVA-F, um imposto federal controlado pela União, sem nenhuma vinculação com a Seguridade Social, deixando apenas para tratar, da mesma, as contribuições previdenciárias.

Com a nova reforma tributária, está sendo instituído o déficit da Previdência Social, ou melhor, da Seguridade Social, e a União não mais precisará da DRU, para gerir como bem entender o orçamento da Seguridade Social.

A aprovação desta reforma já nasce eivada de constitucionalidade, pois irá de encontro à cláusula pétrea dos direitos e garantias sociais, e estará desarticulando toda a estrutura da Seguridade Social no Brasil.

* Presidente da Comissão de Previdência Social da OAB/RJ


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