03/08/2018 - 21:00

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A Súmula 245 e a incoerência do TST

03/08/2018 - 21:00

A Súmula 245 e a incoerência do TST

A Súmula 245 e a incoerência do TST


BENEDITO CALHEIROS BOMFIM*

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) considera que o princípio da indispensabilidade do advogado, estatuído no art. 133 da Constituição Federal, não se aplica à Justiça do Trabalho, criando, assim, uma exceção que dele não consta. Após a Emenda Constitucional nº 45/04, aprovou a Instrução Normativa nº 27/05, admitindo honorários sucumbenciais nos processos envolvendo relação de trabalho, com o que estabeleceu tratamento desigual e quebra do principio da isonomia.

Em 29 de abril de 2010, o TST aprovou Súmula (nº.425), com o seguinte teor:

"Jus postulandi das partes na Justiça do Trabalho. Alcance. O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às varas do trabalho e aos tribunais regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos da competência do Tribunal Superior do Trabalho."

Ao retirar o direito de as partes atuarem pessoalmente na mais alta corte da Justiça do Trabalho, o TST derrogou o questionado art. 791 da Consolidação Trabalhista, que permite a empregados e empregadores reclamarem pessoalmente e "acompanhar as suas reclamações até o final". E o fez, certamente, por considerar que os processos da competência da mais alta corte trabalhista são de natureza essencialmente técnica, inacessível a leigos. Certamente, pelo mesmo fundamento excluiu a atuação pessoal das partes nos mandados de segurança, ações rescisórias e cautelares, no âmbito das varas e dos TRTs.

Acontece que, desde sua edição, a CLT sofreu mais de mil alterações. Paralelamente, editou-se uma legislação complementar mais numerosa do que o próprio estatuto trabalhista básico. A isso, acresçam-se os inúmeros institutos jurídicos, a maioria de natureza processual, aplicados à Justiça do Trabalho, entre os quais:

Abuso de direito; ações de atentado, anulatória, declaratória e de consignação; agravo regimental; arresto; conflito de competência; depositário infiel; dano moral; embargos à adjudicação; exceção de pré-executividade; exibição de documentos; habeas corpus; litispendência; imunidade de jurisdição; incidente de falsidade; litisconsórcio; prevenção; ação monitória; decadência; interrupção da prescrição; denunciação da lide; preclusão; penhora on line; pré-questionamento; embargos de declaração e de terceiro; desconsideração da pessoa jurídica; nomeação de bens à penhora; bem de família; imunidade de jurisdição; litigância de má-fé; gradação da penhora; aditamento e inépcia da inicial; precatório; incidente de falsidade; reconvenção; lide simulada; recurso adesivo; inovação da lide; julgamento extra e ultra-petita; cerceamento de defesa; multa na execução forçada; prescrição intercorrente; sobrestamento de processo; prazo de validade de procuração; rito sumaríssimo; súmulas; orientação jurisprudencial; liquidação extrajudicial; antecipação de tutela; crédito no rosto dos autos; concurso de credores; préexecutividade da execução; simulação; reintegração de posse; seqüestro de bens; substituição processual; Comissão de Conciliação Prévia.

Cabe, então, indagar se os institutos jurídicos retro enumerados são, porventura, menos técnicos, envolvem menos questões de direito do que o recurso de revista, o mandado de segurança, as ações rescisórias e cautelares? Salvo melhor juízo, a súmula ora analisada, se realmente teve por fundamento o ora apontado e criticado, é inconsequente, reveste-se de flagrante incongruência.

Para ser coerente, teria de extinguir o jus postulandi, como agora propugna o ministro Arnaldo Sussekind, coautor da inserção desse instituto na CLT, e que acaba de, junto com o elaborador do presente ensaio e do conselheiro da OAB/RJ Nicola Piraino, assinar anteprojeto propondo a indispensabilidade de advogado e de verba honorária na justiça especializada. Convertido em projeto de lei, tramita este na Câmara dos Deputados sob o nº 3.592/09.

Se a súmula tornou privativa do advogado a atuação nos processos submetidos ao TST, teria de tornar também obrigatória a condenação na verba honorária, uma vez que o fundamento legal para a inadmissão desta é a faculdade dada à parte de autorepresentar-se na Justiça do Trabalho "até final do processo".

Uma vez que o ministro Arnaldo Sussekind, corresponsável pela criação do questionado instituto, com a honestidade intelectual e científica que o caracteriza, reviu sua posição original, não há mais razão para insistir na manutenção do anacrônico jus postulandi, cuja função histórica se exauriu.


* Ex-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e da Associação Carioca dos Advogados Trabalhistas (Acat). Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho.


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