03/08/2018 - 21:01

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Trajetória social e política da mulher no Brasil

03/08/2018 - 21:01

Trajetória social e política da mulher no Brasil

Trajetória social e política da mulher no Brasil


Benedito Calheiros Bomfim*

A mulher brasileira, até o início do século passado, era escravizada à autoridade do pai e depois, casada, à do marido. Sua honra residia na virginidade. O Brasil foi o único país ocidental a estabelecer na Constituição a indissolubilidade do casamento (constituições de 1937, 1946, 1967 e 1969). Esse preceito foi alterado pela Constituição de 1988 que, incorporando a Lei no 6.5l5/ 77(que instituiu o divórcio), admite a dissolução do casamento por essa via. A infidelidade masculina é vista com complacência, enquanto na mulher é uma mancha na reputação.

A Lei no 21.917/A/32 vedava à mulher o trabalho noturno de qualquer espécie, tendo a CLT, em sua redação original, excetuado-a da proibição algumas atividades, inclusive insalubres e obras de construção, e permitido que o marido se opusesse à contratação da esposa, caso em que esta teria de obter a autorização judicial. Ao fixar o primeiro salário mínimo, o decreto-lei de 31 de agosto de 1940 autorizou a redução de seu valor para a trabalhadora. A CLT estabelece ainda que suas disposições não se aplicam aos empregados domésticos. Os direitos trabalhistas destes, contudo, vêm sendo gradativamente reconhecidos, e já se equiparam aos dos demais trabalhadores, inclusive no tocante aos benefícios previdenciários. Ainda hoje, a lei não lhes garante limitação das horas de trabalho.

A Carta das Nações Unidas, homologada pelo Brasil em 1984, estabelece a igualdade de direitos do homem e da mulher e obriga seus signatários a assegurar “a igualdade de gozo de todos os direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos”. A Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou a Convenção Interamericana Para Erradicar a Violência Contra a Mulher. Apesar disso e das garantias igualitárias de nossa Constituição, a mulher continua a ser discriminada, discriminação que só acabará quando lhe for assegurada de fato, também, a igualdade econômica. Basta lembrar a prostituição de meninas de 12 a 17 anos que, nas regiões mais atrasadas, levadas pela pobreza, oferecem seus corpos em troca de migalhas, postando-se até em logradouros públicos à espera de clientes. Meninas e mulheres, mediante falsa promessa de bons empregos, são obrigadas a se prostituir no exterior. A ONU estima que, em 2001, 785 mil brasileiras, a maioria vinda de Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo, foram obrigados a se prostituir fora do Brasil. Para atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica foram criados os conselhos dos Direitos da Mulher e delegacias especializadas. O Estado do Rio de Janeiro conta com sete juizados de proteção às mulheres vítimas de violência doméstica. À mulher é negado o direito de interromper a gravidez, quando países católicos como Portugal, Espanha e Itália permitem o aborto. Estima-se que no mundo existem anualmente 75 milhões de gestações indesejadas, 70 mil dos quais terminam com a morte das mães. No Brasil é frequente, inclusive em famílias abastadas, a prática de abortos inseguros, clandestinos. Apenas cinco das cem maiores empresas brasileiras em receita têm mulheres na presidência, um avanço se se considerar que, em 2000, só homens ocupavam tal cargo. Embora constituam 51% da população, as mulheres têm somente 31% no quadro funcional, 26,8% na supervisão, 22,15% na gerência, 13,7% no executivo.

Na longa e sofrida trajetória, as mulheres livraramse da servidão doméstica, da submissão ao marido, conquistaram de direito de voto, igualdade conjugal, divórcio, liberdade sexual, controle de sua fertilidade, mercado de trabalho, ascensão social, cidadania. A eleição da primeira mulher a presidente constitui um marco na conquista social e política do Brasil. Com ela, 24 mulheres ocupam a chefia de Estado no mundo. Dos 37 ministros de Dilma Rousseff, nove são mulheres. Nas faculdades de Direito a maioria dos alunos é mulher. Elas representam 50% dos advogados. Quase metade de juízas do Trabalho é constituída de mulheres. A ascensão feminina a cargos executivos, empresariais, magistratura, magistério, ciência, literatura, arte, economia, advocacia, desfaz o mito da fragilidade e da inferioridade da mulher, de sua incapacidade política, de competir com o homem intelectualmente e no mercado de trabalho. Ficou para trás o tempo em que eram privativos de homens atividades ou profissões, tais como advocacia, magistratura, economia, política, jornalismo, literatura, artes, esporte, medicina, chefia de família e administração empresarial.

* Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho, ex-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros e ex-conselheiro federal da OAB


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