03/08/2018 - 20:59

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Publicização da ficha penal dos candidatos pelo TSE

03/08/2018 - 20:59

Publicização da ficha penal dos candidatos pelo TSE

Publicização da ficha penal dos candidatos pelo TSE

 

Um desserviço à democracia

 

Luiz Paulo Viveiros de Castro*

 

Até recentemente, as resoluções editadas pelo TSE em anos eleitorais serviam como uma espécie de compilação das normas legais com o fim de orientar partidos e candidatos, reproduzindo o que diziam as leis e as interpretando de acordo com a jurisprudência.

 

De um tempo para cá, o TSE e mesmo alguns tribunais regionais passaram a legislar sobre matéria eleitoral, independentemente do que rezam as leis e até mesmo flagrantemente contra legem, como na efêmera decisão do TRE-RJ que, em 2008, desconsiderou a garantia constitucional da presunção da inocência para tornar inelegíveis candidatos que tinham a tão falada "ficha suja", mesmo sem ter sequer condenações em primeiro grau. A decisão não vigorou por muito tempo, tamanho o absurdo, e só serviu para causar confusão no processo eleitoral, pois até pessoas envolvidas em acidentes de trânsito décadas atrás foram consideradas "fichas sujas".

 

Agora, com a proximidade das eleições e a falta de decisão do Congresso sobre o projeto "ficha limpa", o TSE mais uma vez resolveu legislar. Editou a Resolução nº 23.224, que aumenta a quantidade de certidões criminais previstas na Lei nº 9.504/97 e determina que devem ser apresentadas e anexadas ao CANDex. Ou seja, estarão disponíveis no sítio do TSE na internet, permitindo que os eleitores tenham acesso às informações.

 

Quando se fala do acesso aos "eleitores", é só maneira de dizer, já que a maioria da população não tem acesso à internet nem interesse em ficar analisando as informações disponibilizadas no CANDex. O que ocorrerá, na prática, é que os candidatos utilizarão as informações parciais disponibilizadas no sistema, que só informará quem responde a processos criminais, sem dar notícia se houve defesa e qual o seu teor, para difamar os adversários, apresentando-os na campanha eleitoral como "fichas sujas". A imprensa, por sua vez, apresentará lista de candidatos com certidões criminais positivas, juntando no mesmo balaio os envolvidos em acidentes de trânsito, os que respondem a queixas-crime ajuizadas por desafetos e os processados por peculato, corrupção e outros crimes contra o erário.

 

Ou seja, a última novidade do Judiciário como legislador só vai servir para desinformar o eleitor e municiar a imprensa denuncista em suas manchetes irresponsáveis, em mais um desserviço ao aprimoramento do processo democrático.

 

*Advogado

 

 

 

Acesso ao histórico é um direito do eleitor

 

Chico Alencar*

 

Agora já não é normal, o que dá de malandro regular, profissional,

malandro candidato a malandro federal, malandro com

contrato, com gravata e capital, que nunca se dá mal.

Chico Buarque, Homenagem ao Malandro, 1977

 

O direito de votar - reconquistado no Brasil na década de 1980, após muita luta - é indissociável do direito de conhecer os candidatos. A palavra candidato vem de cândido, de candura: quem postula representar grupos e classes precisa ter qualidades para tal.  Não de erudição, muito menos de etiqueta ou pose. Há muitos sempre vestidos a caráter que não têm nenhum caráter...

 

Bem além das aparências, o que conta, além do programa partidário, é a vida pública pregressa, a autoridade moral (no sentido da ética do bem comum) do candidato. Ser candidato - inclusive ao serviço público de carreira - exige preencher certas pré-condições. Daí a Lei das Inelegibilidades, derivada da determinação constitucional que cobra probidade e moralidade pública (art. 14, § 9º).

 

Assim, é muito bem vinda a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de publicizar, na internet, eventuais certidões criminais dos candidatos. O mínimo que se deve permitir ao eleitor é ter ciência do histórico de quem apresenta sua candidatura nas eleições. Embora a reforma política de que o país carece seja bem mais ampla, a iniciativa do Tribunal não deveria gerar resistência, pela transparência óbvia que gera. Mas nenhum líder de grande partido saudou a Resolução, recebida com frieza, estranheza ou mesmo oposição.

 

Isto leva a entender que algumas agremiações, preocupadas em ampliar bancadas, fazem vista grossa ao currículo sujo de seus candidatos, só interessados nos recursos e votos que possam amealhar. Com essa acolhida costumeira às malfeitorias, facilitam a captura das instituições pelo banditismo.

 

Candidaturas do crime são cada vez mais numerosas, como as vinculadas a milícias, as associadas ao tráfico, as voltadas para as fraudes no aparelho de Estado e à corrupção. Publicizar a ficha criminal, para o inteiro exercício da soberania popular, diminuirá as chances dos que querem fazer da imunidade parlamentar impunidade criminal e continuar roubando o erário.

 

Avancemos, tanto na legislação quanto na consciência cidadã!

 

*Professor de História e deputado federal (PSOL/RJ)

 


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