11/09/2017 - 14:48

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Uerj: Faculdade de Dire ito deve ir para o TJ?

11/09/2017 - 14:48

Uerj: Faculdade de Dire ito deve ir para o TJ?

Sobretudo na crise, precisamos nos manter unidos

JOSÉ RICARDO CUNHA*
Em meio à pior crise de sua história, a Uerj foi surpreendida por uma proposta de mudança de sede da Faculdade de Direito para o antigo Palácio da Justiça, pertencente ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A proposta foi feita por alguns professores da própria faculdade e, pelo que se sabe dela, seria disponibilizada parte das instalações do prédio histórico do Palácio da Justiça. Até o momento não foram apresentados estudos detalhados de viabilidade física.

A proposta pode ser avaliada dentro ou fora do contexto de crise da Universidade. Se formos pensá-la dentro do contexto de crise, não há absolutamente nada que efetivamente assegure que a mudança traria algum benefício real para a instituição, a ponto de ajudá-la na superação da crise. Ao contrário, sugeriria grave falta de coesão – o Direito estaria buscando solucionar os seus problemas à revelia dos acontecimentos da Uerj. Imaginemos uma situação na qual os campi da Universidade tivessem aulas suspensas por falta de recursos para limpeza ou segurança. A Faculdade de Direito instalada dentro do Tribunal de Justiça não seria atingida por esse problema e poderia dar sequência normal às suas aulas, como se nada estivesse acontecendo com a Uerj. O que justificaria esse tratamento preferencial ao aluno do Direito em detrimento de todos os demais?
Se o TJ pode dividir os seus recursos com a universidade, por que não oferecê-los ao Hospital Universitário Pedro Ernesto ou a outros setores da instituição? Sobretudo na crise, precisamos nos manter unidos. Uma separação física inevitavelmente traria impactos administrativos e pedagógicos que gerariam um favorecimento injustificado a apenas uma unidade e a antipatia dos demais membros da comunidade universitária. Se o Direito é Uerj, na crise, mais do que nunca, deve permanecer na Uerj!
 
Para refletir adequadamente sobre uma eventual mudança fora do contexto da crise, seria necessário levar em conta muitos aspectos, o que não seria possível no espaço dessa coluna. Então, falarei apenas de um: a independência acadêmica da faculdade. A grande verdade é que nem aqueles que sustentam a proposta e nem mesmo a presidência atual do TJ podem garantir essa independência. Isso por uma razão muito simples: os órgãos diretivos do tribunal obedecem à regra da rotatividade e, em geral, há disputa de ideias e entre candidatos para aceder a tais órgãos. Por razões que sequer podemos imaginar nesse momento, a instalação da faculdade dentro do tribunal baseada em um favor do Poder Judiciário pode ser revista a qualquer momento, inclusive a despeito de instrumentos jurídicos por meio dos quais se formalize essa mudança. E, no caso de desacordo, quem julgaria a pendência seria o próprio Judiciário. A verdade é que seríamos hóspedes em nossa própria casa, sempre sujeitos ao humor daqueles que nos hospedaram. Além disso, num prédio coabitado vigeriam as regras centralizadas e hierarquizadas do TJ ou as regras plurais típicas de um ambiente acadêmico? A independência da faculdade já estaria comprometida caso fôssemos obrigados a reservar vagas na pós-graduação stricto sensu para magistrados e desembargadores que hoje concorrem em igualdade de condições com os demais candidatos em vagas de acesso universal. Por fim, lembrando Santo Tomás de Aquino, um ato livre, conforme à razão, é aquele que gera mais liberdade para quem o pratica, que o faz dominus sui, senhor de si.
 
*Professor da Faculdade de Direito da Uerj, doutor em Filosofia do Direito

A realidade nos acena com uma solução possível

GUSTAVO BINENBOJM*

Devo à Uerj a minha vida profissional. Ali entrei aos 17 anos e dali, como estudante ou professor, nunca mais saí. Tenho orgulho de fazer parte daquela comunidade acadêmica, dos brilhantes colegas de congregação e dos nossos talentosos alunos, cujo desempenho e engajamento renovam as nossas esperanças. Nada obstante tudo isso, os fatos nos desafiam a enfrentar um cenário de desoladora decadência. Por amor e gratidão à casa em que me formei, e a seus professores e alunos, é preciso tomar os fatos como eles são e buscar as soluções possíveis.

 O fato é que a Uerj se encontra em franco declínio, estrutural e acadêmico. Às razões decorrentes da crise ética, política e econômica do Estado somam-se algumas outras, ligadas à gestão administrativa ineficiente e à falta de incentivos à inovação e ao mérito acadêmico. As consequências são visíveis e palpáveis, não podendo ser ignoradas por qualquer pessoa de boa-fé. A estrutura física do campus do Maracanã é vexaminosa, inóspita, e expõe alunos, professores e servidores a riscos de toda ordem. As nossas salas de aula são antiquadas e nada confortáveis. O entorno não oferece condições mínimas de segurança, sobretudo no turno da noite. O ideal seria uma reforma radical, com recursos fartos, que pudesse dignificar o espaço de atuação da universidade. O problema das soluções ideais é que elas nem sempre combinam com a realidade. E não há qualquer vantagem em ignorar a realidade.

Mas a realidade nos acena agora com uma solução possível, ao menos para a Faculdade de Direito. A visão de estadista do presidente do TJ/RJ, aliada à ação idealista de professores ilustres, como os ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro e Gustavo Tepedino, oferece-nos as excepcionais instalações do antigo prédio do Tribunal de Alçada Criminal, dotado de moderna infraestrutura tecnológica, salas de aula praticamente prontas para uso e situado em local de fácil acesso do Centro do Rio de Janeiro.
 
No bojo de um sólido convênio de cooperação institucional, o tribunal cederá o prédio e custeará as despesas à contrapartida de cursos de pós-graduação a serem oferecidos para magistrados e servidores do Poder Judiciário. A maior proximidade dos órgãos que exercem funções essenciais à Justiça permitirá à faculdade aprimorar o funcionamento de seu escritório modelo e proporcionar aos alunos estágios com órgãos conveniados de reconhecida reputação. Com maior autonomia administrativa e condições de funcionamento adequado garantidas, a faculdade poderá alocar os recursos de que dispuser em cursos, palestras, pesquisas, intercâmbios internacionais e tudo mais que nos reconduza ao caminho da excelência acadêmica.

Não é necessário lembrar que a mudança do casarão do Catete para o campus do Maracanã foi um ato de força do governo estadual colaboracionista do regime militar. Não é necessário lembrar que os cursos de Direito funcionam em prédios próprios nas maiores universidades públicas do país, como USP, UFRJ, UFF, Unirio, UFMG e UFPR, dentre várias outras. Não é necessário lembrar que qualquer projeto de inclusão só produz bons resultados com o acesso dos estudantes a ensino de qualidade. Basta olhar para os fatos como eles são, avaliar com lucidez a oportunidade que se nos apresenta e assumir um compromisso responsável com a mudança.
 
*Professor titular da Faculdade de Direito da  Uerj

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