09/05/2017 - 17:01

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Lista fechada ou voto aberto?

09/05/2017 - 17:01

Lista fechada ou voto aberto?

É hora de renovar

ALESSANDRO MOLON*
O sistema político que conhecemos está falido e esgotado. As delações e informações que vieram à tona expõem as fraturas de forma violenta, como se virássemos a pele da nossa realidade ao avesso, revelando as feridas e necroses que por muitos anos se mantiveram ocultas. Colocada frente a frente com a crueza dos fatos, a sociedade clama por uma investigação profunda e séria, para que, com uma atividade política limpa, possa se sentir verdadeiramente representada. Parlamentares, no entanto, caminham no sentido contrário e encontram na reforma política que é apreciada na Câmara a sua boia de salvação.

A votação em lista fechada entregará aos partidos políticos, cuja credibilidade está no limbo, o poder de escolher a ordem dos candidatos a deputados federais, estaduais e vereadores que concorrerão ao pleito. O eleitor, então, passaria a votar não mais no candidato de sua escolha, mas no partido e na relação de nomes apresentada. As vagas seriam, assim, preenchidas de acordo com a lista pré-determinada e o número de votos recebidos pela legenda. Ora, se a população olha para o Congresso Nacional e as demais casas legislativas e não se vê refletida, delegar esta escolha aos dirigentes partidários certamente não contribuirá para que os cidadãos se sintam melhor representados.

Sob as novas regras, salvo raras exceções, candidatos articularão junto a caciques partidários seu lugar na fila. A disputa que hoje acontece nas urnas será antecipada aos restritos círculos das legendas, com direito a todos os vícios que a população tem condenado. Afinal, qual será o candidato novato, distante da burocracia e acordos de seu partido, que conseguirá ser o primeiro da lista?

Não haverá renovação. E a intenção do Congresso é esta mesma: mudar para deixar tudo como está. Desta forma, a lista fechada garantiria as primeiras posições a parlamentares alvo de investigações que buscam a reeleição para manter o foro privilegiado. Encontrariam, assim, uma blindagem contra a rejeição do voto popular.

A lista fechada é, portanto, o pior cenário para uma reforma política realizada agora, pois congelará o Congresso, assim como está, no momento de sua maior crise de representatividade. Em vez de oferecer uma sobrevida a este sistema corrompido, é urgente aproveitar esta oportunidade para romper e reconstruir. Dos escombros, vemos a esperança de renovação, com espaço para fazer diferente em grande escala, norteados pela ética, pela justiça socioambiental e pela igualdade de oportunidades.

Sigamos até o fim nas investigações, viremos a página e façamos política de uma forma mais verdadeira, radicalizando a democracia para uma representação honesta da sociedade, pois fora da política não há solução para o Brasil.
 
*Deputado federal (Rede/RJ), advogado e professor de Processo Legislativo

Essencial é não levar gato por lebre

RICARDO PENTEADO*
A discussão a respeito de reforma política nos dias de hoje não é nada conveniente, ainda que possa atender a uma evidente ansiedade popular. O ambiente de crise aguda põe sob suspeita qualquer proposta de reforma, porquanto a análise de sua conveniência perde perspectiva histórica e desperta desconfiança de que o oportunismo é o seu grande móvel.

Chego a considerar que para hoje a melhor reforma política seria nenhuma, sendo preferível depurar e resolver nossas crises no contexto da atual ordem jurídica para só depois avaliar projetos com alguma isenção.

Essa cautela, contudo, não resiste à pressão popular ou tampouco à tentação de promover estrépitos sensacionais que rendem proveitosos 15 minutos de fama.

Assim é que peço licença para dizer que o voto proporcional em lista aberta chegou ao seu esgotamento. Nele, muito embora o eleitor não tenha plena consciência disso, o voto é dado para o partido e a escolha nominal de candidato não passa de um segundo efeito do sufrágio que só é considerado para arbitrar uma disputa partidária interna.

Mesmo que o eleitor considere estar votando num candidato individual, fato é que seu voto beneficia diretamente o partido político e reflexamente o candidato mais votado da lista, que não é necessariamente o seu; ou então, se o voto sufraga o mais votado na agremiação, pode beneficiar também outro candidato, ainda que não tenha sido considerado pelo eleitor.

Assim, a primeira qualidade do sistema da lista fechada é a transparência que o eleitor tem sobre quais serão seus possíveis representantes se o partido obtiver um certo número de cadeiras no parlamento.
A segunda qualidade é a importância que ganha o partido como unidade ideológica, já que ele tem o monopólio constitucional da representação política.

Convém lembrar, aliás, que o regime de fidelidade partidária estabeleceu que o mandato dos representantes proporcionais pertence à legenda e não individualmente ao parlamentar.

Coerente com isto, nada mais natural do que se votar numa bancada que lhe seja ideologicamente atrativa e não alimentar a ilusão de que se está elegendo um único representante que seria a voz de tantos quantos nele sufragaram.

Em suma, no sistema atual de lista aberta existe uma disputa partidária interna que é impropriamente arbitrada pelo eleitor, que pensa estar votando em um só representante, quando na verdade vota na sigla. Já no sistema de lista fechada o cidadão sabe que está votando no partido e numa bancada que retrata um projeto coletivo.

Anote-se ainda: o financiamento de campanhas partidárias seria mais racional do que o financiamento de candidaturas individuais. Na primeira, os recursos são direcionados às propostas políticas, ao passo que no sistema de lista aberta os recursos financeiros são desperdiçados numa contenda entre integrantes do mesmo partido que disputam entre si.

Por último, não se diga que o eleitor fica refém do partido, porque ninguém o obriga a votar nele. O essencial é não levar gato por lebre.
 
*Advogado especialista em Direito Eleitoral

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