03/10/2013 - 16:04

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PL 4.330: Terceirização do trabalho

03/10/2013 - 16:04

PL 4.330: Terceirização do trabalho

Terceirizados serão os mais bem protegidos do país

SANDRO MABEL*

Há nove anos o Projeto de Lei (PL) 4.330 está sendo discutido na Câmara dos Deputados. O Brasil tem hoje 12 milhões de trabalhadores terceirizados, que, com suas famílias, representam mais de 40 milhões de brasileiros.
 
O projeto dá ao terceirizado o maior pacote de direitos trabalhistas desde a Constituição de 1988 e o transforma no trabalhador mais protegido do Brasil. Ele terá o que o funcionário CLT tem: 13º salário, férias com adicional de um terço, hora extra em dobro, adicional noturno, licença-maternidade e aviso prévio proporcional, entre outros. Também terá FGTS e todos os benefícios previdenciários, incluindo aposentadoria por tempo de serviço.
 
O terceirizado deixará de ser um trabalhador de segunda categoria, tendo acesso a refeitório, serviço médico interno, transporte e condições de segurança que os trabalhadores CLT da empresa que os contrata têm. Mas, além de tudo, o terceirizado terá duas garantias extras. Uma cláusula anticalote, que obriga a prestadora de serviço a ter um seguro, uma fiança bancária ou uma caução para garantir o pagamento da rescisão. O PL também prevê que a empresa contratante fiscalize o cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias, podendo até reter o pagamento da fatura para assegurar que trabalhadores e governos não sejam lesados. E, caso não haja essa fiscalização, a contratante passa imediatamente a responder solidariamente pelos débitos legais. Assim, o terceirizado poderá processar duas empresas: a que o contrata e aquela para quem presta o serviço.
Cabe a questão: se é para garantir tudo isso, para que a lei? A economia mundial hoje precisa de serviços altamente especializados e muitas vezes temporários. Um azulejista da construção civil é um caso mais simples de entender: ele atua apenas na parte final da obra.
 
O PL 4.330, ao contrário do alardeado, não cria uma terceirização irrefreável, mas regulamenta o trabalho especializado e acaba com a zona cinzenta existente hoje, já que é impossível definir com clareza o que vêm a ser atividades fim e meio na economia global. Para as empresas, o projeto garante segurança jurídica, cria um ambiente econômico mais previsível e maduro e assim abre a possibilidade para as empresas investirem mais, modernizarem as atividades e gerarem novos empregos, mas agora com todos os direitos trabalhistas respeitados. É disso que a CUT tem medo?
 
*Deputado federal (PMDB/GO), autor do PL 4.330

A morte da utopia normativa da justiça social

SAYONARA GRILLO*
 
O Direito do Trabalho se singulariza dos demais ramos pela afirmação de que o trabalho não pode ser uma mercadoria. Afinal, o trabalho nada mais é do que o próprio homem laborando. Corolário lógico é a proteção do trabalhador, envolvido diretamente na atividade posta à disposição do empregador.
 
O fim da escravidão permitiu a consagração da ficção mais emancipatória do Direito moderno: aquela que obsta que o homem seja objeto de um contrato. O surgimento da relação de emprego protegida pressupõe ser o homem sujeito de direito, titular do poder de dispor sobre sua força de trabalho. Não por outro motivo, a locação de mão de obra é repudiada em países com democracia social consolidada e a marchandage, uma prática criminalizada. Todavia, tramita no Congresso projeto de lei que pretende tornar válida a ilegal locação indiscriminada de mão de obra que tem ocorrido no mercado e, por vias transversas, acaba por legalizar o comércio de pessoas.
 
A proposta trazida no PL 4.330 institucionaliza certas empresas que pretendem auferir lucros sem empreender, apenas com a locação de mão de obra para atividades finalísticas de outras empresas. A normalidade de uma prática predatória de mercado não pode conduzir à sua juridicidade. Foi recusada, pois, por juristas de expressão, pela ampla maioria dos ministros do TST, pelos presidentes e corregedores dos TRTs, pelo Conselho Superior do MPT, pela Comissão de Direitos Sociais da OAB e pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), que não se eximiram de tecer um juízo valorativo sobre os graves perigos que o projeto representa.  A terceirização gera precarização e pobreza. Deve ser restringida, e não ampliada. A existência de críticas à indeterminação na classificação das atividades em meio e fim não justifica a extinção proposta. 
 
A aprovação do PL 4.330, com a admissão da terceirização em atividades inerentes ao empreendimento, tornará o mercado de trabalho ainda mais desigual, discriminatório e excludente.
Provocará o falecimento de um modelo de Direito do Trabalho fundado na relação entre o empregado e o empregador que, apesar de profundamente desigual, é ainda bilateral e, portanto, suscetível a ajustes, reivindicações e dissensos. Institucionalizará a figura do “gato” – aquele que arregimenta pessoas e as coloca para laborar para outrem, lucrando com a diferença entre o que é pago a quem trabalha e o que recebe do tomador de serviços. A lógica é perversa e reduz os direitos, o valor do salário e desprestigia aquele que trabalha em favor daquele que nada faz. Conduz ao aumento dos acidentes de trabalho e das mortes no labor. Instaura a discriminação, enfraquece os sindicatos, reduz a eficácia das convenções coletivas, concentra renda. O PL 4.330 encarna a antítese da ideia de Direito que permeia nossa ordem constitucional e que busca dignificar o homem, limitar o poder econômico, subordinar a ordem econômica à valorização do trabalho e que exige que a livre iniciativa e a propriedade exerçam uma função social.
 
*Desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região 
 
 

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