03/08/2018 - 21:03

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Concordâncias e divergências sobre as UPPs

03/08/2018 - 21:03

Concordâncias e divergências sobre as UPPs

Mediado por Ivan Vieira, presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB/RJ, o debate sobre as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) foi considerado pelos presentes como um dos melhores da XI Conferência. José Carlos Tórtima, advogado crimi-nalista; Roberto Sá, subsecretário de Segurança Pública; e Marcelo Freixo, deputado estadual (Psol), foram os palestrantes. Se todos concordaram em que as UPPs significaram um avanço, houve diferenças de avaliação sobre outros aspectos.

Tórtima começou fazendo uma pergunta: as UPPs vêm para cobrir um déficit de cidadania nas comunidades carentes — reféns do tráfico, da milícia ou de maus policiais — ou vêm apenas dar a elas segurança pública? Segundo ele, a resposta a essa pergunta vai nortear a avaliação que se faz dessa experiência: “Do ponto de vista da segurança pública nas comunidades em que foram instaladas, as UPPs foram um grande avanço”. O advogado lamentou, porém, a ausência de um morador de uma comunidade com UPP como debatedor à mesa, lembrando que a experiência que poderia ser trazida por ele enriqueceria muito o debate.

Para Tórtima, o desarmamento foi a grande vitória das UPPs. “Quem vivia ameaçado por tiroteios na porta de casa hoje não tem essa preocupação. Além disso, os fuzis tinham um poder de atração de jovens para o crime, coisa que sempre preocupou as famílias dessas comunidades.” Por outro lado, ele apontou um problema na imple-mentação das UPPs: “A Polícia Militar do Rio é muito ruim. Não está preparada para respeitar os cidadãos pobres”, disse, lembrando o caso em que policiais depredaram uma lan house no Jacarezinho por não admitirem que um jovem negro e pobre pudesse ser proprietário dos computadores. Utilizando a projeção de uma imagem em que meninos saídos de uma escola no Complexo do Alemão foram alinhados contra a parede e revistados por soldados do Exército, Tórtima voltou à afirmação de que uma questão vital para o sucesso de um policiamento do tipo comunitário — como o realizado pelas UPPs — será a transformação dessa mentalidade.

Roberto Sá também usou imagens em apoio à sua palestra. Projetou slides que contaram a história das UPPs e apresentaram números mostrando a melhoria dos índices de segurança pública nos locais em que elas foram implantadas. Contou que hoje é delegado da Polícia Federal, mas também tenente-coronel da PM reformado, com experiência no Batalhão de Operações Especiais (Bope). Disse que vivenciou a política anterior da polícia fluminense, que classificou como “bem intencionada, mas de confronto”, e participou desde o início da formulação da política que levou às UPPs, cujos objetivos alinhou: consolidar o controle estatal sobre áreas antes dominadas por criminosos e implantar um policiamento permanente, de cunho comunitário, para permitir a chegada de iniciativas no plano social.

O policial lembrou que, salvo casos de exceção, os PMs que trabalham em UPPs são novos e preparados de forma diferente dos que entraram há mais tempo na corporação. A formação desses novos policiais enfatiza a noção de que devem proteger, e não atemorizar, os moradores, afirmou. “Os soldados tornam-se conhecidos na comunidade e interagem com os moradores, que os conhecem pelos nomes.” Entre as imagens que projetou para ilustrar a exposição, Roberto Sá mostrou a confraternização de PMs com crianças de favelas, além de um conjunto de desenhos de alunos de uma escola pública nas proximidades do Morro do Borel, nos quais policiais são retratados de forma positiva.

Por fim, Marcelo Freixo reconheceu que a introdução das UPPs trouxe melhoria inegável para a situação dos moradores das comunidades carentes, particularmente se comparada com a política anterior, de confronto. “Em 2007, esse mesmo governo Cabral fez uma operação desastrada que matou 19 pessoas no Complexo do Alemão”, afirmou. Freixo elogiou a atual cúpula da Segurança Pública — o secretário José Mariano Beltrame e o subsecretário Roberto Sá —, em quem vê honestidade de propósitos, ainda que guarde algumas divergências com eles. “Quero, inclusive, registrar que o secretário Beltrame foi a única autoridade do governo estadual que me telefonou quando recentemente veio a público que minha vida estava ameaçada. E sei que não fez isso por razões profissionais, mas pelo seu caráter”.

As principais ressalvas que Freixo fez às UPPs foram duas. A primeira, o fato de, na sua opinião, os locais em que foram instaladas aparentemente responderem menos a exigências de segurança pública e mais a conveniências de organizar a cidade para receber a Copa do Mundo e as Olimpíadas. “Por que Copacabana tem quatro UPPs e a Baixada Fluminense não tem uma sequer? Na verdade, o mapa das UPPs é o mapa da Copa e das Olimpíadas”.

A segunda é que — com a exceção da Favela do Batan, em que jornalistas foram torturados por milicianos — não foram criadas UPPs em áreas dominadas por milícias. “Por quê? Afinal, é nas áreas de milícias que existem os mais altos índices de homicídios. Se é para combater o achaque de moradores, o gatonet, a exploração das vans e o monopólio da venda de botijões de gás, por que não fazer UPPs em Rio das Pedras ou em Gardênia Azul?”, perguntou.


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