03/08/2018 - 21:03

COMPARTILHE

‘Conhecer o passado é condição para construir

03/08/2018 - 21:03

‘Conhecer o passado é condição para construir

Posição unânime no painel Memória e Verdade

O debate sobre Memória e Verdade, reunindo a ministra Maria do Rosário, titular da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; Paulo Abrão, presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça e secretário nacional de Justiça; e o ex-presidente da OAB Federal Cezar Britto trouxe à tona diferentes abordagens, mas os palestrantes concordaram num ponto: o conhecimento do passado é condição para a construção de um futuro democrático para o país.

O presidente da OAB/RJ, Wadih Damous, abriu o painel e lembrou a Campanha pela Memória e pela Verdade, criada pela Seccional em 2010, como estando na origem de um movimento da sociedade que desembocou na aprovação da Comissão da Verdade pelo Congresso. Em seguida, o presidente da OAB/Espírito Santo, Homero Junger Mafra, que conduziu a mesa, agradeceu à OAB/RJ por ter trazido à pauta a questão, “que deveria ser adotada por todas as seccionais e, em particular, pela OAB Federal”.

Cezar Britto abordou a chamada justiça de transição, necessária para a passagem de um período autoritário para a democracia. Ele apontou três de suas características. A primeira, a reparação às pessoas que resistiram ao autoritarismo. “Nesse aspecto, o Brasil está relativamente bem”, disse, elogiando o trabalho de Paulo Abrão à frente da Comissão de Anistia. A segunda seria a punição dos que cometeram crimes contra a humanidade no regime ditatorial, lembrando que a OAB Federal, no tempo que ele esteve à frente da entidade, levou ação ao Supremo Tribunal Federal (STF)no sentido de que os torturadores e assassinos de presos políticos não teriam sido beneficiados pela Lei da Anistia. “Infelizmente o Supremo impôs a amnésia ao Brasil”, lamentou.

O terceiro ponto, segundo Britto, refere-se ao direito à memória e à verdade. Ele recordou o debate travado na Alemanha, após a Segunda Guerra Mundial, sobre se seria melhor não lembrar os crimes praticados pelos nazistas. “Felizmente essa posição não prevaleceu, pois falar a verdade é prevenir-se para que as coisas não se repitam”. E disse que, no Brasil, quem financiava e defendia a tortura continuou no poder. “A transição foi uma reacomodação”.

Paulo Abrão manifestou otimismo em relação à Comissão da Verdade, que considera um passo estrutural na consolidação democrática. “Há quatro anos a questão não estava na ordem do dia. Quem a trouxe à tona foi a sociedade, por meio de entidades como a OAB/RJ”. Para Abrão, o fato de a comissão ter sido aprovada com os votos de todas as forças políticas no Congresso lhe concede maior legitimidade. “Pela primeira vez haverá um órgão que vai apurar a violação dos direitos humanos e sua autoria, rompendo com a tradição de se camuflarem os conflitos”. Além disso, acrescentou, a comissão tem como uma de suas tarefas propor reformas no aparelho de Estado, visando a impedir que as violações se repitam. Ele sugeriu que seccionais da OAB, universidades e outras entidades da sociedade criem suas comissões da verdade, coletando dados a serem repassados para a comissão oficial.

Maria do Rosário lembrou o painel sobre desaparecidos políticos, instalado na fachada da OAB/RJ, classificando-o como “um ato de coragem”. Ressaltou, também, a participação da presidente da Comissão de Direitos Humanos da Secional, Margarida Pressburger, que representa o Brasil no Subcomitê para Prevenção da Tortura da ONU. Segundo a ministra, projeto elaborado pela Secretaria de Direitos Humanos criando o Sistema Nacional de Prevenção à Tortura foi encaminhado à presidente Dilma Rousseff. Ressaltando a importância de se apurarem as violações ocorridas no passado, ela argumentou que esse esforço teria efeito positivo para se evitarem torturas de presos comuns, que continuam acontecendo em delegacias e presídios brasileiros.

Por fim, rechaçou a ideia de que a Comissão da Verdade seja a busca de um ponto de neutralidade: “Ela vai apurar as graves violações dos direitos humanos ocorridas na ditadura e praticadas por agentes do Estado. É o Estado ditatorial que está em questão. São 475 mortos e desaparecidos. Enquanto não se souberem as circunstâncias das mortes e onde estão os restos mortais, essa questão estará em aberto”, disse.


Abrir WhatsApp