09/02/2015 - 15:16

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Novo CPC incorpora conquistas para advocacia

09/02/2015 - 15:16

Novo CPC incorpora conquistas para advocacia

Código aguarda sanção presidencial e valerá um ano após publicação

RENATA LOBACK

Após cinco anos de tramitação, o Plenário do Senado aprovou, no dia 17 de dezembro, o novo Código de Processo Civil (CPC). Elaborado com o objetivo de tornar os processos mais ágeis, o código aguarda a sanção da presidente Dilma Rousseff e só começará a valer depois de um ano, contado a partir da publicação no Diário Oficial. Em defesa da aprovação integral do CPC, processualistas elaboraram manifesto encaminhado à Presidência da República. O vice-presidente da OAB/RJ, Ronaldo Cramer – que também integrou a comissão sobre o novo CPC no Conselho Federal da Ordem –, está entre os signatários do documento.

“Infelizmente, somente a aprovação no Senado não traz a certeza da aceitação do código no formato atual”, explica Cramer. ”Como as críticas surgiram imediatamente ao fim da sessão no Congresso, inclusive com pedidos de veto de alguns de seus dispositivos, tememos algum tipo de modificação”, comenta.

“Pensei que depois de tantos anos de intensa discussão, na qual todos tiveram oportunidade de propor e defender suas posições, a disputa havia terminado. Não conheço projeto de lei que tenha tido uma gestação mais participativa do que o novo CPC. Desde a Comissão do Anteprojeto até a votação final no Senado, foram realizadas várias audiências públicas e reuniões. O texto pode conter algumas escolhas questionáveis, o que, a meu ver, é a demonstração de que a nova lei provém do bom debate democrático, do qual puderam participar diferentes correntes de pensamento. Se atendesse apenas a um tipo de interesse, o Código de Processo Civil não seria uma lei plural, como convém à democracia”, observa o vice-presidente.
 
Para ele, um novo código se faz necessário por três razões principais: consolidar todas as reformas feitas no CPC revogado, harmonizar as normas processuais com a Constituição Federal e representar o novo pensamento processual, valorizando a consequência prática das soluções, que dão certo na praxe forense.
 
Incluídas no novo Código de Processo Civil, as férias para os advogados representam uma das principais conquistas propostas pela Ordem. Os prazos passarão a ser contados apenas em dias úteis e ficarão automaticamente suspensos entre os dias 20 de dezembro e 20 de janeiro de cada ano. A alteração não estende o recesso do Judiciário, que continua sendo de 18 dias, entre 20 de dezembro e 6 de janeiro.
 
Segundo o presidente da Seccional Fluminense, Felipe Santa Cruz, é bom frisar que a Ordem não quer o fechamento da Justiça com esta medida: “A suspensão dos prazos não tem como objetivo paralisar os serviços forenses, apenas garantir que os advogados possam usufruir do seu direito a férias”, completa.
 
Para Felipe, a instauração das férias atende em especial aos advogados autônomos, que não contam com uma banca para protegê-los. “Há colegas que, na prática, não têm recesso e acabam desenvolvendo doenças recorrentes de trabalho excessivo. O descanso de 30 dias, ao qual todo trabalhador tem direito, é fundamental para a recuperação dos advogados e estávamos atrasados quanto a isso”, diz. Para o presidente da OAB/RJ, “o novo CPC veio para consagrar reivindicações antigas da advocacia”.
 
Uma boa notícia para os profissionais fluminenses é que não será necessário aguardar a validação de um ano após a sanção do novo CPC para a garantia das férias ao final de 2015. Isto porque foi aprovado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), também em dezembro passado, o Projeto de Lei nº 3156/2014, que dispõe sobre a organização e a divisão do Judiciário e contém emenda do deputado estadual Comte Bittencourt (PPS) garantindo férias de 30 dias aos advogados.  

Com a aprovação, a Justiça do Rio ficará um mês sem realizar julgamentos ou audiências (20 de dezembro a 20 de janeiro), salvo em casos de urgência. Também ficam suspensos os prazos para os advogados recorrerem de decisões judiciais ou cumprirem determinações processuais. A partir da aprovação da emenda, o estado se antecipa e se torna o segundo do país a assegurar esse direito. O primeiro foi São Paulo, que o garantiu por ato administrativo do Judiciário.

De acordo com o novo presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, o TJ já estava pronto para regulamentar as férias dos advogados. O projeto foi freado após notícias de que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) regulamentaria as férias em todo o país.  “Decidimos parar nossas conversas sobre as férias, porque percebemos diferentes movimentos nesse sentido, que já iriam regulamentar este direito. Só que antes mesmo da portaria do CNJ veio a aprovação do projeto da Alerj”, conta o desembargador. 

“Somos do entendimento de que os advogados, como qualquer outro segmento profissional, têm direito a férias. Medida que melhora a qualidade de vida, principalmente, dos profissionais que trabalham em escritórios pequenos e nunca param de advogar por causa dos prazos a cumprir. O descanso de 30 dias é um direito fundamental”, defende Luiz Fernando Carvalho. 

No entanto, o desembargador faz uma sugestão: férias facultativas. “Acho que deve ser levado em consideração o advogado que não deseja ter seus prazos suspensos, até por uma questão de honorários. A esses deve ser aberto o precedente de peticionar solicitando tramitação normal. Os interessados em gozar as férias não precisariam fazer nada, já que essa é a regra geral a partir de agora”.
 
Reuniões internas das comissões da OAB/RJ, como a de Estudos em Processo Civil (Ceproc), presidida por Bruno Garcia Redondo, e a de Arbitragem, comandada por Joaquim Muniz, e a participação em audiências públicas foram os mecanismos usados pela Seccional para a elaboração das inovações sugeridas para o novo código. Cabe ressaltar que a maioria das propostas apresentadas pela Ordem do Rio foi incluída no texto aprovado pelo Senado. 

Com documentos entregues à Câmara e ao Congresso, a Ceproc conseguiu incluir itens como a contagem de prazos apenas em dias úteis; o fim da compensação de honorários em caso de sucumbência recíproca, confirmando que os honorários são direitos dos advogados e não das partes; a previsão de sucumbência em grau recursal, desestimulando os recursos protelatórios; o acréscimo nas multas por litigância de má-fé; a regulamentação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, permitindo o contraditório prévio pelo sócio; o detalhamento de princípios constitucionais, como os da fundamentação adequada das decisões, do contraditório efetivo e da cooperação; a ampliação dos poderes das partes (negócios jurídicos processuais), para alterar o procedimento e dispor sobre seus direitos, deveres, faculdades e ônus; e a necessidade de observância dos precedentes judiciais, possibilitando uma maior segurança jurídica.
 
O aprimoramento do regime da primeira audiência para conciliação e mediação, antes da apresentação da defesa, também foi destacado por Bruno Garcia Redondo. “Hoje, quando há audiência já é necessário apresentar a defesa. Sugerimos que, com o novo código, antes da defesa tente-se uma solução alternativa. O objetivo é fazer com que os conflitos que possam ter resolução mais fácil nem cheguem a ser julgados, para evitar a sobrecarga da Justiça”, explica ele, que também atuou como assessor do professor Arruda Alvim, da Comissão de Juristas da Câmara dos Deputados, para a elaboração do texto, e esteve presente no Congresso Nacional no dia da aprovação.
 
Na opinião de Joaquim Muniz, o novo CPC poderá contribuir para a redução do número de processos com esse apoio ao uso de mecanismos de composição amigável e resoluções alternativas de conflitos.  “Tal imposição, aliada ao respeito aos precedentes judiciais, certamente demandará análise mais detalhada do custo benefício da manutenção de um litígio, já que este pode ser extinto sumariamente”, defende o presidente da Comissão de Arbitragem da OAB/RJ.

Para evitar um arbitramento em valor irrisório, em casos que a Fazenda Pública é sucumbente, a Seccional sugeriu, e conseguiu incluir, a majoração dos percentuais de honorários de sucumbência. Pela prática atual, conta o presidente da Ceproc, quando o Poder Público perde, os juízes têm o costume de determinar honorários baixos para os advogados. “Agora há um mínimo legal a ser respeitado”, diz Garcia Redondo. 
De acordo com Ronaldo Cramer, “a valorização dos precedentes judiciais é um mecanismo importantíssimo para garantir maior isonomia entre as partes e conferir previsibilidade às decisões. O fim da discricionariedade judicial na fixação dos honorários de sucumbência é um sinal de respeito à advocacia”, acredita.

Outros três itens conquistados pela Ordem do Rio foram destacados por Joaquim Muniz: a inclusão de artigos da Carta Arbitral, que regulamentará a comunicação entre advogados e árbitros; a possibilidade de as ações judiciais arbitrais correrem em segredo de Justiça, desde que a confidencialidade prevista na arbitragem seja comprovada perante juízo; e a permissão de agravo de instrumento nos processos de arbitragem. 

Entre as sugestões da Seccional que não foram acolhidas estão a possibilidade de penhora de parte de salários elevados e de imóveis de alto valor e a inclusão de cláusulas contratuais que já prevejam a arbitragem. 

Segundo Garcia Redondo, o novo CPC fortalece garantias constitucionais, racionaliza os procedimentos e aprimora o sistema. “Juízes e partes passam a ter, ao seu alcance, instrumentos mais modernos e adequados, capazes de imprimir uma tramitação mais célere do processo e proporcionar uma tutela mais efetiva do direito”, acredita. 

Entre essas melhorias está o combate à jurisprudência defensiva, que, de acordo com o presidente da Ceproc, é a tendência dos tribunais de criar requisitos excessivos para o conhecimento de recursos, e a imposição de julgamentos respeitando a ordem cronológica dos processos, o que evita que ações demorem mais que outras. 

“Hoje, cada juiz estabelece o seu critério de julgamento de qual processo será julgado primeiro. Com o novo CPC a ordem em que os processos chegam à conclusão deve ser respeitada na hora da sentença, considerando, é claro, os casos de urgência. É a forma que o código encontrou de garantir uma maior igualdade aos julgamentos dos processos. O novo CPC foi elaborado à luz da Constituição de 1988, diferentemente do código atual, que tem como base texto constitucional de um período de ditadura.
 
Teremos com o novo CPC o que há de mais moderno no panorama doutrinário, um instrumento atual para o Brasil do Século 21”, pondera Garcia Redondo. 

Ronaldo Cramer pondera que o novo CPC não resolverá todos os problemas do Judiciário brasileiro. “O Código de Processo Civil constitui peça muito importante na engrenagem do sistema de Justiça, mas não é a única”, aponta. “Ainda assim, tem aptidão para melhorar o sistema. Alguém duvida que a sucumbência recursal diminuirá o número de recursos protelatórios? Que o incidente de resolução de demandas repetitivas reduzirá a incidência de ações que reproduzem a mesma tese jurídica? Que os precedentes vinculantes inibirão a entrada de ações ou recursos que contrariem a jurisprudência dos tribunais superiores? E por aí vai”, salienta.

O presidente do TJ, por sua vez, explica que o prazo de um ano para a efetivação do código se deve às adaptações que precisarão ser realizadas. “Assim como os advogados, os juízes também terão que estudar o CPC. Neste período faremos simpósios e seminários. Da mesma forma, precisamos de um tempo para a organização judiciária. Há medidas que interferem diretamente no sistema atual do TJ. Caso da transferência de todos os processos de Direito do Consumidor para os juizados especiais cíveis. Nesta fase de adaptação, será fundamental o diálogo respeitoso entre os poderes, com cada um fazendo sua parte e compreendendo a parcela que corresponde ao outro pela Constituição”, comenta Ribeiro de Carvalho.

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