09/02/2015 - 15:39

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Terceirização da ativida de-fim

09/02/2015 - 15:39

Terceirização da ativida de-fim

Talvez o grande problema esteja no modelo sindical

PAULO SERGIO JOÃO
A terceirização de serviços é um modelo jurídico que há décadas vem sendo adotado pelas empresas para a gestão do negócio. Atualmente, tal forma de gestão tem sido questionada como se fosse promotora de exclusão social de trabalhadores quanto aos direitos assegurados pela Constituição Federal e pela legislação trabalhista.  O assunto tomou destaque de maior relevância porque se encontra sob julgamento no Supremo Tribunal Federal, em recurso com repercussão geral (que condicionará todas as futuras decisões da Justiça), o confronto da liberdade constitucional das empresas em contratar com a crença disseminada de que se trata de modelo jurídico perverso às garantias sociais e trabalhistas de empregados.

Primeiro, não se pode limitar o objeto da contratação na prestação de serviços terceirizados à atividade meio do tomador, porque não é este o aspecto essencial que deve ser defendido para garantir a eficácia desse modelo de trabalho. No modelo jurídico da terceirização não se discute contratação de pessoas, mas contratação de prestação de serviços especializados em que se analisa o resultado do objeto do contrato estabelecido entre empresa tomadora e prestadora. Fato, aliás, já acolhido pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho na Súmula 331. Terceirizar serviços não deve corresponder à cessão de mão-de-obra, como se observa na Lei 6.019/74. Não se trata da prática de “marchandage”. 

Segundo, a terceirização de serviços não deve ser perseguida como meio de redução de custos trabalhistas para a empresa contratante. Aquele que dela se utiliza deve buscar por meio da terceirização uma prestação de serviços especializada, focando sua força de trabalho subordinada (empregados) no desenvolvimento concentrado do empreendimento. Quem contrata prestação de serviços também assume um compromisso social de valorização do trabalho e de respeito à dignidade de todos que estão envolvidos no negócio.

Terceiro, os empregados que estão vinculados às empresas prestadoras de serviços têm seus direitos assegurados na forma disposta pela lei e pela Constituição Federal.  São trabalhadores assalariados que se vinculam atualmente a um sindicato representativo da respectiva categoria profissional.  Portanto, eles têm garantia de representação legal e o sindicato um papel importante a desempenhar, quanto ao acréscimo de benefícios extralegais. Assim, prestar serviços por meio de empresas especializadas não pode servir de argumentos para exclusão de direitos.

Talvez o grande problema da terceirização de serviços esteja no modelo sindical que agrupa trabalhadores em categorias profissionais, confinados para o custeio do sindicato, fazendo com que as críticas preservem com mais frequência o sindicalismo herdado desde 1943 e que gera conforto financeiro para seus dirigentes.
Finalmente, não cabe mais na nossa sociedade supor que se pretenda impor a exclusão de direitos. Há um consenso de que todos caminham para o mesmo porto cuja linha de chegada deve proporcionar o bem estar de todos, com segurança jurídica nas contratações e respeito às garantias constitucionais.
 
*Advogado, professor da Faculdade de Direito da PUC-SP e da FGV

Debate se dá no estreito limite da judicialização

MARCUS VINICIUS CORDEIRO*
A terceirização não é novidade entre nós. Acompanhando a evolução tecnológica incidente sobre o processo de produção, particularmente a partir dos anos 1980, surge como resposta a necessidade de modernização dos empreendimentos, preparando-os para o mercado competitivo a partir da adoção de técnicas que, assentadas na descentralização, possibilitariam melhor qualidade do serviço, gestão dinâmica, enxugamento estrutural... E tudo isso, sonho do capital, com redução dos custos.
 
Nesse compasso, o direcionamento do empreendedor apenas para aquele segmento constitutivo de sua atividade-fim acalentaria a ideia de especialização, atraindo clientela, gerando confiabilidade e outros ganhos mais. E assim veio à luz no mundo do trabalho o controverso fenômeno, que, passadas décadas, ainda invoca debates acalorados sobre benefícios, malefícios, extensão da utilização, legalidade… E sem que haja, até os nossos dias, uma legislação definidora da forma e do conteúdo de sua aplicação nas relações entre contratantes e trabalhadores.

De fato, ainda hoje não estão bem delineadas o que seriam as atividades meio e fim, ensejando milhares de ações judiciais que buscam desconstituir contratações feitas à guisa de terceirização, mas que, em verdade, acobertariam a inobservância da legislação celetista, notadamente para livrar o tomador das obrigações próprias da relação de emprego. À míngua de regulação apropriada, tantas demandas desaguaram no Supremo Tribunal Federal.

A propósito, caberá à corte fixar os parâmetros do que seria a atividade-fim para haver a terceirização lícita, conforme repercussão geral reconhecida no processo ARE 713.211, no qual uma determinada empresa questiona a proibição de contratar terceiros, ditada por sentença proferida em uma ação civil pública. No cerne da controvérsia, estaria justamente a falta de definição legal, e não somente jurisprudencial, do que significaria o impeditivo atividade-fim, bem como as implicações restritivas à liberdade de contratação assegurada na Constituição. Na esteira do caso, milhares de outros aguardam o resultado, com implicações astronômicas em termos pecuniários.

O quadro que temos circunscreve a terceirização ao estreito limite da judicialização, alheia ao debate que, substancialmente, seria mais pertinente de ser travado, qual seja, aquele que indagasse sobre a importância ou não do modelo – amplamente adotado, inclusive na administração pública, e no próprio Judiciário – para o desenvolvimento econômico do país, a geração de empregos, o aperfeiçoamento das forças produtivas, entre outros aspectos que sobressaem de um olhar focado nas consequências sócio-econômicas do tema. A questão, nesse contexto, assumiria relevância porque aqueles diretamente interessados, empregadores e trabalhadores, por suas representações classistas, estariam no primeiro plano do cenário em que a contenda se desenrola, revelando seus respectivos pontos de vista a partir da experiência vivenciada com contratações dessa natureza, expondo as mazelas, as fraudes, os requisitos para diferenciar o lícito do ilícito.

Tivesse o debate vindo à baila dessa forma seria possível, com seriedade e boa-fé, concluir-se pela validade do modelo como instrumento benéfico nas relações de trabalho e incremento econômico, ou, como vem ocorrendo, ter a certeza de que não passa de biombo para a burla da legislação trabalhista, disseminando precariedade e discriminação no seio da classe trabalhadora.
 
*Secretário-geral da OAB/RJ e presidente de sua Comissão de Justiça do Trabalho

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