28/11/2012 - 15:02

OAB/RJ aciona Corregedoria do TJ contra juízes em Campo Grande

Após receber um abaixo-assinado de advogados de Campo Grande, com denúncias contra a juíza Luciana Santos Teixeira, do XXVI Juizado Especial Cível Regional, e o juiz auxiliar da serventia Cláudio Rodrigues, o presidente da subseção, Mauro Pereira, levou o caso à Seccional, que, baseada nos indícios de irregularidades, decidiu ingressar com representação contra os magistrados na Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

A indignação dos advogados tem relação com uma ação de Luciana iniciada em julho contra a TAM Linhas Aéreas, devido a um atraso em um voo. Segundo Pereira, a suspeita é que a juíza teria se valido do cargo que ocupa para obter supostos privilégios no processo particular em questão. "Apesar de ela residir na Zona Sul e o escritório da empresa ficar no Centro, os autos foram distribuídos no XXVI JEC", afirma ele, apoiado pelo presidente da OAB/RJ, Wadih Damous: "Evidentemente não é recomendável que um juiz se valha de sua condição para distribuir ações em que é parte para um juizado em que é o titular".

Protocolado em 9 de julho, o processo ficou a cargo do juiz-auxiliar porque a juíza declarou-se impedida de julgá-lo. A audiência, designada automaticamente para o dia 21 de novembro, foi antecipada para 31 de julho e, ao fim, o juiz-auxiliar concedeu indenização no valor de R$ 10 mil para a magistrada. A quantia, segundo o presidente da subseção, supera muito a que costuma ser paga em casos semelhantes na comarca, isto é, cerca de R$ 2 mil. Além disso, existe a suspeita de que prazos do processo tenham sido antecipados sem justificativa válida.

O caso chamou a atenção por apresentar indícios de irregularidades no julgamento e nas fases anteriores do processo. Como explica o subprocurador-geral da Seccional, Guilherme Peres, os funcionários do Protocolo Geral são orientados a informar a competência de determinada serventia quando da entrada de uma ação. O exemplo de Campo Grande contraria esta lógica, segundo ele. "A magistrada se disse impedida de julgar o pleito, já que ela própria era a autora do processo. Mas a ação permaneceu no JEC em vez de ser enviado para o XVIII Juizado Regional, também em Campo Grande", ressalta.

Outra característica incomum é a realização do julgamento num curto espaço de tempo. "Com a antecipação da audiência pelo juiz-auxiliar, a distribuição automática — que estabelece fila eletrônica para os processos — não foi respeitada", diz Peres.

A leitura da sentença um dia após a audiência também chamou a atenção: "Em geral, os JECs marcam a leitura para um mês depois. É o prazo para a elaboração do texto pelo juiz leigo e sua homologação pelo juiz togado. Nesse processo, a leitura foi feita no dia seguinte à audiência, com condenação em tempo recorde", avalia o subprocurador-geral.

Para Wadih, a conduta dos magistrados parece ter sido inapropriada. "Como Luciana ajuizou em nome próprio uma ação na serventia em que exerce funções como magistrada, mesmo residindo em outra região, e o seu colega de trabalho não reconheceu a incompatibilidade, solicitamos que a Corregedoria investigue e adote as providências que o fato requer", disse.

Como manda o bom jornalismo, a TRIBUNA DO ADVOGADO REGIONAL procurou os dois juízes para ouvir sua versão do acontecido. Elas estão publicadas abaixo.

 
Luciana Santos Teixeira
 
“Em 09/07/2012, distribuí a demanda junto ao NADAC, núcleo que cuida da distribuição dos processos nos Juizados Especiais Cíveis de Campo Grande, em razão de meu domicílio profissional ser em Campo Grande.  Como sou servidora pública, o juízo é competente, nos termos do art. 76 do Código Civil e do Enunciado 2.2.3 do Aviso 23/2008 (Consolidação de Enunciados Jurídicos de Juizados).
 
Como a demanda foi distribuída para o Juizado onde atuo, prontamente declarei-me impedida para atuar no feito, o que implicou na necessária retirada de pauta da audiência designada no ato da distribuição, que seria presidida por juiz leigo diretamente por mim supervisionado.
 
 O Dr. Cláudio Ferreira Rodrigues auxilia o XXVI Juizado, realizando audiências em caráter de mutirão.  Desta forma, o Dr. Cláudio incluiu minha demanda na pauta de mutirão do dia 30/07/2012, que consistia em 82 Audiências de Conciliação, Instrução e Julgamento, todas em caráter antecipado.  No dia 30/07/2012, o Dr. Cláudio julgou apenas demandas que haviam sido distribuídas entre maio e julho de 2012, sendo que cinco outros processos possuíam a exata mesma data de distribuição da demanda em que figuro como autora.
 
O XXVI Juizado tem adotado a prática de antecipar audiências que são julgadas como ACIJ (Audiência de Conciliação, Instrução e Julgamento) em razão do significativo aumento na distribuição de demandas nos Juizados de Campo Grande.  Caso não estivéssemos adotando esta prática, os prazos para a realização de audiências estariam sendo demasiadamente alargados.”
 
Cláudio Rodrigues
 
“Não é razoável, proporcional ou compreensível a preocupação da Procuradoria da OAB-RJ. Inicialmente em razão de a Egrégia Corregedoria Geral de Justiça de nosso Tribunal haver se antecipado e requisitado informações sobre o ocorrido, que já foram prestadas. Depois que a situação alardeada não comportou nenhuma irregularidade.
 
Abstenho-me de lhe explicar o motivo pelo qual o processo judicial foi distribuído ao XXVI Juizado Especial Cível. Para tanto é bastante um exame superficial das normas sobre competência previstas no Código de Processo Civil, no Código Civil, na Lei 8.078/1.990, no Código de Organização e Divisão Judiciária do Estado do Rio de Janeiro e na Consolidação das Normas da Corregedoria Geral de Justiça, quando então seria facilmente possível compreender que nas relações de consumo a escolha do foro é do consumidor e que o Servidor Público possui domicílio necessário no lugar em que permanentemente estiver em exercício.
 
Superada a questão da distribuição eletrônica (...) uma vez que a colega de profissão estava há mais de dois anos em exercício no Fórum Regional de Campo Grande, possuindo aqui seu domicílio necessário.
 
Por outro lado, nenhum cartório é incompetente para processar feito em que o Juiz de Direito nele em exercício for interessado. O que poderia existir seria suspeição de servidores por amizade ou outro motivo em relação ao Magistrado. Como nenhum servidor se disse suspeito e este goza de prerrogativa de atestar fé pública, não houve falar-se em irregularidade, mas em tratamento isonômico em relação a outros feitos.
 
A comparação de valores partiu de uma perspectiva falsa e quase leviana. O estabelecimento do mesmo obedeceu a critério rigoroso de fundamentação. Valores absolutamente iguais foram arbitrados nos seguintes processos, que tramitaram no mesmo órgão judicial ou em outros e foram por mim julgados (neste ponto, o juiz cita a numeração dos processos mencionados).
 
Informo que em alguns não houve recurso, o que denotou justiça na decisão, e em outros o recurso já foi julgado e improvido, com manutenção da Sentença, o que também demonstrou justiça na decisão.
 
Todo e qualquer Juiz de Direito como é sabido pela Ordem dos Advogados possui independência funcional e somente está adstrito à lei e à própria consciência.
 
Na situação jurídica de Juiz de Direito em auxílio por força de diversos “mutirões” realizados pela Comissão Especial dos Juizados Especiais (...) nunca escolhi o que julgar, por não possuir nenhum controle dos processos que ingressam na pauta de julgamentos. Sempre somente indiquei a quantidade de processos que poderiam ser incluídos em pauta, sem determinar a natureza dos conflitos de interesses ou a natureza especial das partes. A escolha ficou livre ao cartório de cada serventia judicial, por meio de seu gestor ou Responsável pelo Expediente. 
 
No caso em tela não foi diferente. Quando estava no exercício das atribuições inerentes ao meu cargo e no órgão judicial em que sou titular fui consultado pelo cartório do XXVI Juizado que desejava saber se havia impedimento ou suspeição para presidir audiência no processo em que foi parte a ilustre Magistrada. Como dela não sou amigo e sequer a conhecia, registrando que tivemos breve contato uma ou duas vezes (...), respondi que não havia nenhum problema (...) desde que houvesse tempo hábil para a expedição dos atos de comunicação judiciais.
O próprio responsável pelo cartório da serventia informou a data (...).
Ninguém foi favorecido, salvo se os outros processos que foram distribuídos na mesma data e foram julgados no dia anterior também o foram. O mesmo se diga em relação ao valor, pois se assim fosse todos os jurisdicionados aqui e alhures também o seriam. Nada mais absurdo.
Respeito sempre todos os operadores da grande família forense, especialmente os Advogados de quem tenho várias homenagens realizadas
em várias subseções da Ordem nas várias Comarcas.”
 

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